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DANÇA/CRÍTICA
Balé da Cidade encanta no início, mas cai no lugar-comum
INÊS BOGÉA
CRÍTICA DA FOLHA
No último fim de semana
estreou a "A Linha Curva",
uma co-produção do Teatro Municipal de São Paulo e do Festival
de Dança da Holanda, criada especialmente para o Balé da Cidade pelo israelense Itzik Galili. O
programa trazia ainda "Frágil",
também de Galili, e "Dualidade@br", do iraniano (radicado
em Portugal) Gagik Ismailian.
Em "Dualidade@br" (2001), um
quarteto de homens vem da platéia para dar início a esta peça que
apresenta solos, duos, trios e grupos para evocar encontros e desencontros humanos. Nos infinitos ciclos e travessias dos dançarinos na cena, proximidade e distância se confundem, com mil
ambigüidades. Os fados cantados
por Amália Rodrigues ajudam a
compor o universo da paixão.
A dupla Robson Lourenço e
Melissa Soares fez a estréia local
de "Frágil", um duo criado para a
Galili Dance em 1997. Sozinho na
cena, Lourenço dança de costas e
de lado para o público; Soares
chega do fundo do palco, seus
gestos surgindo por trás do corpo
do outro. Os limites dos corpos se
distinguem e se unem num jogo
de passagens que envolvem todo
o espaço, explorando o avesso e o
direito de cada um.
Os gestos ressoam no ar: como
se o desaparecimento de um movimento deixasse emergir o gesto
seguinte. Um jogo de entrega e resistência que a dupla executou
com suavidade, num tempo suspenso, no limite do devaneio
-mesmo se em alguns pontos os
movimentos ainda parecessem
colocados demais. Assim como a
dança, também a música, "Sub-Rosa", do minimalista inglês Gavin Bryars, é muito suave, com
nuances que deixam emergir seu
próprio passado.
Do universo das entregas amorosas ao mundo da sexualidade,
Galili buscou um rumo abstrato
para a coreografia, mas não conseguiu fugir dos clichês sobre a visão do Brasil no exterior.
Massas de corpos e cores dominam o palco, numa coreografia
que se vale de deslocamentos e
gestos repetidos para construir a
cena. O espaço é demarcado pela
luz, que ecoa nos figurinos
-shorts coloridos e camisas pretas recortadas, com faixas de cor.
Na visão do coreógrafo, os contrastes brasileiros são representados por clichês de sensualidade
nos movimentos e na televisiva
dinâmica de grupo. Há um momento especial: após um grupo de
homens avançar do lado direito
do palco observado por uma mulher, ela começa a dançar e contagia aos poucos os movimentos de
alguns deles. Aqui a dança cria
uma intensidade de relação pouco presente em outros momentos.
A música foi criada por um grupo holandês de percussão, o Percossa, e bem executada ao vivo
pelo conjunto Durum (berimbau,
tambores etc.) Os bailarinos estão
muito bem tecnicamente, tanto
na dança mais ágil do início, com
muitos giros, equilíbrios e saltos,
quanto nas solturas do fim.
Na soma das partes, o programa
se ressente de um imprevisto contraste: se nas duas primeiras peças
o amor é visto de forma intensa e
por muitos ângulos, em "A Linha
Curva" todas as diagonais, linhas,
vértices e furacões não parecem
suficientes para sair do lugar-comum, numa curva que, afinal, só
faz retificar os nossos labirintos.
Balé da Cidade de São Paulo
Quando: de amanhã a sáb., às 21h;
dom., às 17h
Onde: Teatro Municipal (pça. Ramos de
Azevedo, s/nš, SP, tel. 0/xx/11/222-8698)
Quanto: de R$ 10 a R$ 14
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