São Paulo, terça-feira, 26 de julho de 2005

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DANÇA/CRÍTICA

Balé da Cidade encanta no início, mas cai no lugar-comum

INÊS BOGÉA
CRÍTICA DA FOLHA

No último fim de semana estreou a "A Linha Curva", uma co-produção do Teatro Municipal de São Paulo e do Festival de Dança da Holanda, criada especialmente para o Balé da Cidade pelo israelense Itzik Galili. O programa trazia ainda "Frágil", também de Galili, e "Dualidade@br", do iraniano (radicado em Portugal) Gagik Ismailian.
Em "Dualidade@br" (2001), um quarteto de homens vem da platéia para dar início a esta peça que apresenta solos, duos, trios e grupos para evocar encontros e desencontros humanos. Nos infinitos ciclos e travessias dos dançarinos na cena, proximidade e distância se confundem, com mil ambigüidades. Os fados cantados por Amália Rodrigues ajudam a compor o universo da paixão.
A dupla Robson Lourenço e Melissa Soares fez a estréia local de "Frágil", um duo criado para a Galili Dance em 1997. Sozinho na cena, Lourenço dança de costas e de lado para o público; Soares chega do fundo do palco, seus gestos surgindo por trás do corpo do outro. Os limites dos corpos se distinguem e se unem num jogo de passagens que envolvem todo o espaço, explorando o avesso e o direito de cada um.
Os gestos ressoam no ar: como se o desaparecimento de um movimento deixasse emergir o gesto seguinte. Um jogo de entrega e resistência que a dupla executou com suavidade, num tempo suspenso, no limite do devaneio -mesmo se em alguns pontos os movimentos ainda parecessem colocados demais. Assim como a dança, também a música, "Sub-Rosa", do minimalista inglês Gavin Bryars, é muito suave, com nuances que deixam emergir seu próprio passado.
Do universo das entregas amorosas ao mundo da sexualidade, Galili buscou um rumo abstrato para a coreografia, mas não conseguiu fugir dos clichês sobre a visão do Brasil no exterior.
Massas de corpos e cores dominam o palco, numa coreografia que se vale de deslocamentos e gestos repetidos para construir a cena. O espaço é demarcado pela luz, que ecoa nos figurinos -shorts coloridos e camisas pretas recortadas, com faixas de cor.
Na visão do coreógrafo, os contrastes brasileiros são representados por clichês de sensualidade nos movimentos e na televisiva dinâmica de grupo. Há um momento especial: após um grupo de homens avançar do lado direito do palco observado por uma mulher, ela começa a dançar e contagia aos poucos os movimentos de alguns deles. Aqui a dança cria uma intensidade de relação pouco presente em outros momentos.
A música foi criada por um grupo holandês de percussão, o Percossa, e bem executada ao vivo pelo conjunto Durum (berimbau, tambores etc.) Os bailarinos estão muito bem tecnicamente, tanto na dança mais ágil do início, com muitos giros, equilíbrios e saltos, quanto nas solturas do fim.
Na soma das partes, o programa se ressente de um imprevisto contraste: se nas duas primeiras peças o amor é visto de forma intensa e por muitos ângulos, em "A Linha Curva" todas as diagonais, linhas, vértices e furacões não parecem suficientes para sair do lugar-comum, numa curva que, afinal, só faz retificar os nossos labirintos.


Balé da Cidade de São Paulo   
Quando: de amanhã a sáb., às 21h; dom., às 17h
Onde: Teatro Municipal (pça. Ramos de Azevedo, s/nš, SP, tel. 0/xx/11/222-8698)
Quanto: de R$ 10 a R$ 14


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