São Paulo, sábado, 26 de agosto de 2006

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Livros

Calder volta ao Brasil em livro e mostra

Lançamento da Cosacnaif e exposição na Pinacoteca do Estado rastreiam relações do artista norte-americano com o país

Amigo de Niemeyer, Calder planejou escultura de 15 metros para a praça dos Três Poderes, em Brasília; projeto nunca saiu do papel


FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

A obra mais importante da mostra "Calder no Brasil", que a Pinacoteca abre hoje ao público, paralelamente ao lançamento de um livro com o mesmo título pela editora Cosacnaif, é, na verdade, uma não-obra. Há mais de cinco anos pesquisando as relações entre Alexander Calder (1898-1976) e o Brasil, Roberta Saraiva, diretora do Museu Lasar Segall, descobriu que o norte-americano havia projetado uma escultura de 15 metros para a praça dos Três Poderes, em Brasília, quando de sua inauguração.
"O Calder conheceu o Niemeyer, em 1959, e quando voltou aos EUA realizou uma maquete para a praça. A obra, entretanto, nunca foi realizada, e não encontrei justificativa para isso", conta a pesquisadora.
Com isso, Saraiva, também curadora da mostra, apresenta um desenho de Niemeyer da praça, em Brasília, sem, no entanto, o que seria uma importante referência internacional na capital do país.
Mesmo sem tal obra, "Calder no Brasil" revela os profundos vínculos que o artista manteve com o país, que vão além das três vezes em que esteve aqui pessoalmente, a primeira em 1948, para expor no Ministério da Educação, no Rio, e no Museu de Arte de São Paulo.
Por conta dessa constante presença, Calder está bem representado não só no Masp como também no Museu de Arte Contemporânea da USP, além de estar em várias coleções particulares. A exposição apresenta 50 obras, a maior parte de acervos brasileiros, com sete trabalhos da Fundação Calder, de Nova York. Também há um farto material documental de sua presença, com fotos de todas as exposições, além de quatro documentários, que retratam suas visitas.
A primeira vez que uma obra do artista foi vista por aqui, entretanto, foi em 1939, num Salão de Maio, em São Paulo, provavelmente por iniciativa de Flávio de Carvalho, promotor da exposição. O texto que apresentava o artista na mostra, sem assinatura, o apresentava como "um dos maiores arquitetos ianques e que se notabilizou por ter sido o criador da chamada "escultura móvel'". Esse termo, aliás, foi rebatizado como "móbile", por Marcel Duchamp, termo que se tornou sinônimo de Calder.
Em 1943, o crítico brasileiro Mario Pedrosa visita a retrospectiva dedicada ao artista no Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA). Anos depois, os dois se tornam amigos, e, quando Pedrosa cria o Museu da Solidariedade, no Chile, Calder é um dos primeiros artistas a doar obras ao acervo.
"Foi após visitar a mostra no MoMA que Pedrosa escreveu seu primeiro texto em defesa do abstracionismo, que depois seria uma de suas grandes campanhas", conta Saraiva.
Em 1948, Calder vem expor no Brasil a convite do arquiteto Henrique Mindlin. "Por meio do Mindlin, Calder entra em contato com a arquitetura moderna brasileira, com a qual se identifica. Ele elogia muito, por exemplo, o prédio do Ministério da Educação, criado por Oscar Niemeyer, Lúcio Costa e Le Corbusier", conta Saraiva. Calder teve grande visibilidade no país em 1953, por ocasião da 2ª Bienal de São Paulo -aquela que expôs também "Guernica", de Picasso-, onde teve uma sala com 45 obras.
Mas, nessa ocasião, ele não esteve presente pessoalmente -foi Pedrosa quem cuidou da instalação de suas obras.
Sua segunda visita é em 1959, quando ocorre o congresso da Associação Internacional de Críticos de Arte, do qual participou Giulio Argan, entre outros, e é quando conhece Niemeyer e se empolga com o projeto da escultura para a praça dos Três Poderes. Alguns meses depois, em 1960, Calder retorna com a maquete da obra jamais realizada na bagagem.
"Essa última visita ele fez também para ver o Carnaval brasileiro, que ele sempre manifestou vontade de conhecer. O Brasil, de fato, foi muito inspirador em suas obras, ele usou figas como imagem, criou trabalhos com nomes como Jacarandá e Corcovado", diz ainda Saraiva. Lamentável, entretanto, que seu amor pelo país não tenha sido correspondido, ficando vazio o espaço que cabia à sua obra em Brasília.


CALDER NO BRASIL
Onde:
Pinacoteca do Estado (pça. da Luz, 2, SP, tel. 0/xx/11/3229-9844)
Quando: abertura hoje, das 11h às 14h; ter. a dom., das 10h às 18h. Até 15/10
Quanto: R$ 4 (grátis aos sábados)


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