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Perspectiva lança "Tempo de Clima", que reúne artigos de Ruy Coelho publicados na revista "Clima"
Bons tempos
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
A revista "Clima" (1941-44) volta à pauta com o lançamento de
"Tempo de Clima" (ed. Perspectiva), reunião de artigos do escritor
Ruy Coelho (1920-90). Na entrevista a seguir, o crítico literário
Antonio Candido, 84, que ajudou
a organizar o volume, fala da sua
geração de intelectuais revelada
naquelas páginas.
Folha - Como surgiu "Clima" e
qual foi a colaboração de Coelho?
Antonio Candido - A revista foi
imaginada no fim de 1940 por Alfredo Mesquita e Lourival Gomes
Machado. Alfredo era mais velho
do que nós e não pertencia à faculdade. Lourival era um jovem
assistente de sociologia, inteligente e empreendedor. Eles traçaram
o plano, definiram as seções, escolheram os encarregados e os
principais colaboradores. Ruy, o
caçula da turma, não foi encarregado de nenhuma seção em especial, mas logo se revelou, apresentando para o primeiro número o
ensaio mais importante que a revista publicou, "Marcel Proust e o
Nosso Tempo". A seguir, revelou-se o mais informado e versátil, publicando artigos e notas sobre literatura, teatro, cinema, política.
Creio que "Clima" foi para ele a
oportunidade de revelar e exercer
a sua força intelectual.
Folha - Como foi revisitar os textos de Coelho para o livro?
Candido - A organização não foi
minha, foi da família e dos discípulos. Nasceu do intuito de reunir
tudo o que Ruy publicou na revista. Eu reli os textos, sempre impressionado com a cultura e a
energia mental daquele rapaz distraído de 20 anos. Essa leitura me
pôs de novo em contato com uma
inteligência privilegiada, às vezes
ligada a posições contingentes do
momento, que nele nunca atrapalharam a lucidez.
Folha - Qual era o ambiente político, social e cultural da época?
Candido - São Paulo estava num
momento de certa efervescência
cultural. A Semana de Arte Moderna datava de 20 anos e tinha
aberto a era das inovações e das
revisões, que ocorreram em diversos setores. O movimento armado de 1930 abrira uma fase de
grande interesse pelo Brasil. De
1935 a 1938, Mário de Andrade dirigira com espírito criador o Departamento de Cultura da Prefeitura, abrindo caminhos. Em 1934,
a fundação da Universidade de
São Paulo e da sua inovadora Faculdade de Filosofia criara um tipo desconhecido de ensino e investigação no domínio das Humanidades. Junto ao público, o
que era considerado maluquice
de "futuristas" começava a ser
aceito como solução cabível.
"Clima" faz parte dessa onda e
representa a primeira ponte entre
os setores de estudos humanos da
USP e a cidade. Fomos fruto da Filosofia e representamos um espírito de consolidação e continuação do que fora modificado; não
de inovação ou ruptura.
Folha - No início, "Clima" não era
engajada politicamente, mas depois se assumiu como tal. Como se
deu esse trânsito?
Candido - De fato, um dos nossos intuitos era manter a revista
afastada de preocupação política,
mesmo porque estávamos sob
uma ditadura que arrochava as
manifestações ideológicas e qualquer tipo de oposição. Além disso, éramos pouco interessados no
assunto, embora fôssemos contra
a ditadura e tivéssemos na absoluta maioria simpatia platônica pelo
socialismo. Apenas um de nós,
Paulo Emílio Salles Gomes, tivera
experiência política, fora preso,
fugira. Mas também ele estava no
momento desligado de qualquer
compromisso ou atividade.
Foi a entrada no Brasil na guerra, no fim de 1942, que nos despertou. Paulo liderou algumas
manifestações da revista, e os últimos quatro números saíram no
fim de 1944 demonstrando certa
politização. O nosso projeto se alterou, portanto, passando da abstenção à participação relativa. Em
1945, Décio, Lourival, Paulo Emílio e eu entramos para a Esquerda
Democrática, que em 1947 mudou o nome para Partido Socialista Brasileiro. Ruy estava nos EUA,
ficando no exterior até o começo
dos anos de 1950, mas tinha as
mesmas idéias que nós.
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