São Paulo, sábado, 26 de outubro de 2002

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"O NOME DA MARCA"

Obra disseca a comida ligeira do pós-modernismo via fetichismo

GILBERTO FELISBERTO VASCONCELLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA

A pressa é invenção do demônio e comercialmente deu certo com drive-in, fast food, sanduíches, self-service, Coca-Cola, hambúrguer, 400 milhões de consumidores por dia no mundo, batata frita em Moscou, ketchup na China, logomarca tão ou mais conhecida do que a cruz.
Trata-se da marca McDonald's focalizada por uma sociologia de inspiração marxista. A autora aplica o conceito de "fetichismo" de Marx à produção de imagens no capitalismo da self-mais-valia.
O leitor encontra no livro a história do McDonald's e do triunfal sanduíche Big Mac. Sua gênese está lá na Califórnia, EUA, anos 30, cinema falado, civilização do automóvel, tornando-se hoje expressão máxima da cultura descartável, cujo equivalente libidinal do usar e jogar fora é o videoclipeorgasmo, fungível e serelepe.
O que comanda esse aparelho ideológico é a velocidade do serviço, e não a satisfação que o prato de comida deve proporcionar. Ícone da etapa pós-moderna do capitalismo, o McDonald's já engendrou uma ciência do hambúrguer e uma "hamburguerologia".
Na cultura da vitrine tudo é fugaz, passageiro e descartável. É neste contexto que surge a "personalidade da marca": o tipo Nike, Marlboro, McDonald's, Benneton. Eis o núcleo da tese de Isleide Fontenelle: "A descartabilidade da cultura é a própria condição para a reprodução acelerada do capitalismo de imagens".
Se a paz é um fenômeno digestivo (quem come amansa), então é bem provável que foi o McDonald's quem engendrou o bélico mister Bush, consumidor de Big Mac desde menino, o que explica a diferença dele com o nosso filósofo Paulo Arantes, o qual nunca em sua vida traçou um Big Mac, conforme escreveu no prefácio desse livro admirável.
A civilização do automóvel provocou o divórcio do talher, isto é, as mãos livres segurando o sanduíche. De todos os sentidos, o paladar foi o que mais regrediu.
Na cultura mimetizada e macaqueada da colônia eu já vi entre nós vendedor de rua com um carrinho escrito "fast côco". Confesso que prefiro a fórmula antropofágica do sanduíche "x-tudo".

Gilberto Felisberto Vasconcellos é professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) e autor de "Glauber Pátria Rocha Livre" (Senac), entre outros

O Nome da Marca


    
Autor: Isleide Arruda Fontenelle
Editora: Boitempo
Quanto: R$ 38 (364 págs.)




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