São Paulo, domingo, 27 de março de 2005

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CRÍTICA

Os amores impossíveis do "Big Brother"

BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA

Tempo de dobrar a língua: semanas atrás, disse que ia falar uma única vez sobre o "BBB5", a não ser que algo acontecesse. Pois é, aconteceu. Não no sentido sensacionalista: ninguém matou, ninguém morreu e os beijinhos foram mais castos do que os de qualquer novela.
Mas o programa, no entanto, foi encantador. Não, não se pode esquecer também que há muito pouco de realidade e muito de show num programa como o "Big Brother Brasil". Também não se pode esquecer que, a esta altura, já circula pelo imaginário todo um conjunto de técnicas de construção de personagens. E, sobretudo, não se deve deixar de ter em perspectiva que não há como se aproximar do "reality show" sem duvidar da autenticidade daquilo que se vê, ouve e sente.
OK! O problema é que, mesmo lembrando de tudo isso, esta edição do "BBB" deu tantas voltas metalinguísticas que chegou a um estado de abstração onde algum tipo de realidade pôde ser encenada e, numa outra volta, algum tipo de veracidade emergiu dos disfarces.
No início, o "BBB5" surpreendeu pela velocidade e ferocidade com que se instalou a polarização entre "mal" e "bem". Homens grandes, de aspecto e falas protofascistas, mulheres-objeto para as mais diversas funções contra outros homens e mulheres um tantinho (não muito, mas o suficiente) mais inteligentes formaram um confronto tão claro que as eliminações bateram recordes de adesão do público.
Depois, surpreendeu ainda mais, quando, eliminados os brucutus, se criou uma bolha de bem-estar afetivo entre os participantes do grupo encabeçado por Jean e Pink. Parecia que algo "de verdade" estava se passando ali, que se abriu magicamente a possibilidade de viver várias relações, inspiradas pela intensidade da amizade entre Jean e Pink.
Amizade baseada na condição de exceção de ambos os personagens - Jean por ser gay e articulado, Pink por ser rebelde e abusada -, soube atrair outros participantes meio desgarrados e acabou por gerar uma turma em que os indivíduos agiam de forma independente, mas com sentido coletivo, o que lhes garantiu uma vitória "limpa" e acachapante. Depois, seguiu-se um período quase idílico, onde todo mundo pôde, o mais sinceramente possível, mentir. Em vez de estar numa competição cruel, eles pareciam jovens simpáticos em férias na casa da praia, botando seus hormônios e afetos para desenhar tramas de encontros e desencontros amorosos.
Coube a Pink quebrar esse encanto e fazer o papel daquela que desperta a todos, inclusive o público, da mistificação. Emburrada, ela recordou a falsidade da situação do "reality show" e a verdade nua e crua do fato de todos estarem ali querendo "merecer" uma soma obscena. Saiu da casa para afundar na sua história, não sem antes despedir-se de seu personagem com um toque de picardia, roubando um beijo do apresentador Pedro Bial.


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