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CINEMA/ESTREIAS
Crítica/"Anabazys"
Ótimo documentário analisa o último Glauber
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Glauber Rocha (1939-1981) tinha a paixão da
linguagem e a linguagem da paixão. Foi o último dos
cinemanovistas a persistir no
sonho de mudar o cinema e o
mundo.
O documentário "Anabazys",
ao reconstituir a gênese, a feitura e a repercussão do último
filme glauberiano, "A Idade da
Terra" (1978-80), mostra que
tanto a obra quanto o artista,
desmesurados, eram corpos estranhos no establishment cinematográfico, incluindo aqui o
mercado, os festivais e a crítica.
Realizado por Paloma Rocha
(filha do homem) e Joel Pizzini,
"Anabazys" realiza uma dupla
jornada. Por um lado, mergulha
no interior do filme de Glauber,
esmiuçando, com a ajuda de
material de filmagem e depoimentos do elenco e equipe técnica, os métodos incomuns do
diretor.
A par desse movimento para
dentro da obra, há no documentário uma tentativa de
compreensão do contexto que a
cerca. Está tudo em "Anabazys": da incômoda situação
de Glauber junto à intelligentsia brasileira, por ter apoiado a
abertura política de Geisel, à
perplexidade causada pela exibição de "A Idade da Terra" em
Veneza, passando pela complexa engenharia política e cultural que viabilizou a realização
do filme.
Dois depoimentos são iluminadores. Gustavo Dahl, então
diretor da Embrafilme, fala da
dificuldade oficial de lidar com
um longa que era ao mesmo
tempo "uma obra de vanguarda, um filme doméstico, um
épico e um documentário". É,
talvez, a melhor definição de "A
Idade da Terra", essa suma da
obra glauberiana, levada a um
ponto de ruptura radical com o
cinema narrativo e a lógica
aristotélica.
Outro depoimento essencial
é o do montador Ricardo Miranda. Segundo ele, Glauber
queria que os rolos de seu filme
não fossem numerados, para
que cada projecionista, em cada sala de cinema, exibisse o filme numa ordem aleatória. Seria, virtualmente, um filme diferente a cada sessão. Só assim,
talvez, "A Idade da Terra" viesse a caber no mundo.
ANABAZYS
Direção: Paloma Rocha e Joel Pizzini
Produção: Brasil, 2008
Onde: em cartaz no Frei Caneca Unibanco Arteplex 8
Classificação: não indicado a menores
de 14 anos
Avaliação: ótimo
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