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DISCO/LANÇAMENTO
Aos 55 anos, músico inglês lança "Heathen"; primeiro trabalho inédito desde 99 chega às lojas no dia 11 e tem participação de Dave Grohl e Pete Townshend
David Bowie
TETÉ RIBEIRO
FREE-LANCE PARA A FOLHA, EM NOVA YORK
O tempo passa rápido ao lado
de David Bowie. O músico britânico, 55, recebe a reportagem da
Folha numa suíte do hotel
Thompson, no SoHo, em Nova
York, sem frescura nem pose. De
camiseta cinza e calça de veludo
marrom larga, está com o cabelo
curto e loiríssimo, com luzes. Ri
muito e fácil, uma risada grande e
branca.
Os 35 minutos do encontro são
parte dos esforços do lançamento
de seu novo disco, "Heathen", o
primeiro de músicas inéditas desde "Hours...", de 1999, que chega
às lojas do mundo em 11 de junho.
Leia a conversa abaixo:
Folha - "Heathen" é seu disco
mais nova-iorquino, não?
David Bowie - Sim, tem muito da
ansiedade de Nova York, e estou
falando da ansiedade pré-11 de setembro. É a cidade do estresse. Fico pensando: "Que tipo de mundo é este, onde coloquei uma
criança?" [Bowie tem uma filha de
dois anos, Alexandria Zahra Jones, com a modelo Iman". Quando 11 de setembro aconteceu, mudou tudo. Deus, o que foi que fizemos? Estamos prestes a começar a
3ª Guerra Mundial? Como este século começou desapontador...
Folha - Parece as lutas do Mike
Tyson, em que todo o mundo se
prepara para um show e tudo acaba em alguns segundos...
Bowie - É isso! Exatamente a
imagem que eu queria encontrar.
Permite que eu a tome de você e
use daqui para a frente?
Folha - É toda sua...
Bowie - Que soco na cara levamos! Foi horrível, horrível. E as
expectativas eram tão altas nos
anos 90, parecia que tudo poderia
ser feito no novo século, um novo
começo, faríamos tudo certo desta vez, e a primeira coisa que
acontece, nos primeiros segundos, é essa tragédia. Um nocaute!
Folha - Este é o futuro que você
imaginava em 1963, quando gravou a primeira música?
Bowie - Algumas coisas me lembram do que eu imaginava para o
futuro na época de "Diamond
Dogs" (1974). Os prédios caindo,
as gangues de rua tomando conta,
as previsões ruins se cumpriram.
Mas nada de bom aconteceu. Sou
negativo, não?
Folha - Mas tão bem-humorado,
não dá para entender...
Bowie - Eu sei! É que quero ser
agradável, no fundo sou muito tímido e envergonhado (risos).
Mas tendo a escrever com um
ponto de vista sempre negativo.
Escrevo sobre medo, ansiedade,
abandono, mais medo, mais ansiedade, mais abandono (risos).
Folha - Como você escreve?
Bowie - O que eu costumo fazer é
escrever pequenos pedaços de
música e assim que sinto que há
ali um pequeno coração batendo,
umas pequenas pernas chutando,
penso: "Isso promete ser bom".
Então paro de mexer e começo a
trabalhar em outra letra. Não termino as músicas, coloco tudo em
uma mesa de letras recém-nascidas e as levo para o estúdio, onde
algumas serão terminadas e outras abandonadas.
Folha - Como escrever com uma
criança de dois anos em casa?
Bowie - Não tem o menor problema, ela é maravilhosa, não me
atrapalha em nada e ainda me inspira. Claro que às vezes preciso dizer: "Querida, vá brincar em outro lugar" (risos). A maioria das
músicas que escrevi é para ela, por
causa dela. É um álbum ansioso e
de questionamento, mas talvez eu
não tivesse desenvolvido essa ansiedade ou não tivesse me inspirado tanto se ela não estivesse por
perto. "A Better Future" (um futuro melhor) é para ela.
Folha - Por que o álbum se chama
"Heathen" (pagão)?
Bowie - Um budista é um pagão,
por exemplo. Gosto dessa palavra
porque ela é provocadora, é malcompreendida. Gosto da idéia de
que as pessoas vão ouvir o álbum
e tentar entender porque ele se
chama "Heathen" e tirar suas
próprias conclusões.
Folha - Pete Townshend e Dave
Grohl tocam no disco...
Bowie - Já trabalhei com Pete e
foi ótimo, então resolvemos continuar o que tínhamos parado de
fazer. Temos uma conexão muito
forte. Quanto ao Grohl, eu achava
que era o músico ideal para a música. Simples assim. Odeio divas, e
você não tem idéia de como há divas entre os músicos. Não tenho
tempo para elas, sou muito velho
(risos). Não dá para ficar rodeado
de egos enormes.
Folha - O CD tem ainda Pixies.
Bowie - Adoro os Pixies. É a melhor banda norte-americana dos
anos 80. Eu conheço o Charles
(Thompson) ou o Frank (Black),
como você preferir, muito bem.
Escolhi essa música porque ela é
pouco conhecida. E queria gravar
Pixies porque acho inacreditável
como as pessoas não os conhecem aqui. Corta o coração.
Folha - Você conhece bandas da
nova cena rock nova-iorquina, como os Yeah Yeah Yeahs?
Bowie - Não conheço essa banda, mas o Dave Grohl me falou
dela. Gosto de Grand Daddys,
Sparklehorse, acho muito boas. E
as coisas mais comuns, como
White Stripes e Strokes. Reconheço o Velvet [Underground" no
som dos Strokes. Mas sei de uma
coisa que vai diverti-la: uma das
primeiras músicas que o Stripes
gravou foi "Moonage Daydream", do "Ziggy Stardust". Li
na web e estou louco para ouvir!
Folha - Você gosta de ouvir os covers de suas músicas?
Bowie - Alguns, nem todos.
Odeio a versão de "Heroes" do
Oasis, não ficou nada bom. Mas
gosto muito da do Jacob Dylan.
Folha - E você gostou de ver essa
música associada aos policiais e
bombeiros de Nova York depois de
11 de setembro?
Bowie - Achei ótimo! Na minha
idade, você não espera mais ouvir
suas músicas no rádio (risos).
Adoro ver essa nova geração de
artistas gravando minhas músicas, me faz pensar que valeu a pena, que minha obra tem valor.
Folha - O que você lembra de suas
viagens ao Brasil?
Bowie - Os shows são sempre
bons, mas shows são parecidos no
mundo inteiro. Mas tenho um
problema com a América do Sul:
é difícil aceitar a atual distribuição
de renda. Há os muito ricos e os
muito pobres, e eles não encontram um jeito de se ajudar.
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