São Paulo, sábado, 27 de maio de 2006 |
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Realismo histérico?!
Zadie Smith radicaliza prosa "maníaca" em segundo livro
Não, ela não parece gostar do
rótulo. Se numa entrevista anterior, acerca de seu primeiro
romance, "Dentes Brancos", a
britânica Zadie Smith, 31, afirmou que o "realismo histérico"
é "um termo dolorosamente
preciso para o tipo de prosa excessiva e maníaca característica de romances como o meu",
ela agora anda mais cautelosa.
Respondendo às perguntas
da Folha, a autora, que depois
lançou "O Caçador de Autógrafos" e "On Beauty" (sobre a beleza), diz que a definição inventada pelo crítico James Wood
é: "desinteressante, mas talvez
correta" e acrescenta que "tal
subgênero não existe" e que os
supostos autores que, como
ela, achariam-se sob essa chave
"já evoluíram".
A culpa talvez seja do próprio
Wood. Professor da Harvard e
editor da "The New Republic",
ele cunhou o conceito para explicar um tipo de romance que
busca a vitalidade a todo custo
e se caracteriza por "tamanho
desmedido, personagens maníacos, ação enfurecida e freqüentes digressões sobre tópicos secundários". "Dentes
Brancos" seguia o padrão, assim como "O Chão que Ela Pisa", de Salman Rushdie, e "Mason & Dixon", de Thomas
Pynchon. Mas Wood torceu o
nariz para "O Caçador de Autógrafos", no qual os exageros do
primeiro livro se radicalizam. A
autora não gostou, claro; e também evita discutir o suposto
"multiculturalismo" de suas
obras: "Isso é assunto para professores de sociologia. Eu apenas escrevo livros nos quais
nem todo mundo é branco".
Veja trechos da entrevista, que
ela respondeu, por e-mail, num
vôo para Chicago.
FOLHA - Como foi enfrentar o público após o sucesso imediato de
"Dentes Brancos"?
FOLHA - Hollywood é um tópico imenso em "O Caçador de Autógrafos". Pensou nele deste o início? ZADIE - O cinema é uma extensão da fotografia, que, em si, é o grande processo instantâneo de mediação que precisamos compreender. E ser mediado, creio, é o desejo de minha geração. Todos querem ser representados por uma imagem, e isso se torna referência de sucesso pessoal e para o auto-conhecimento. É uma fantasia infantil mas bastante poderosa. FOLHA - Acredita que, como diz um dos personagens do romance, vivamos num mundo "quebrado"? ZADIE - Um mundo fraturado naturalmente separa em partes. Você não consegue ter uma relação orgânica, natural, com um país ou uma pessoa, por exemplo, se apenas dispõe de uma imagem na televisão. Trata-se de uma versão contemporânea de um velho problema: o mundo sempre nos pareceu fraturado. Nossa mente não está em sintonia com nosso corpo, nossas vidas não têm nenhum elo óbvio com o divino, a consciência dos outros não nos é acessível. A vida está cheia de descontinuidades. FOLHA - A cabala já era popular quando você começou a escrever seu livro? ZADIE - Notei que o interesse crescia à medida que eu escrevia o romance. Mas a cabala que discuto não tem nenhuma relação com a "cabala das celebridades". Pelo que entendo, esta última é uma combinação fajuta de astrologia, culto à vida eterna e cultura de auto-ajuda. Representa o mais profundo antiintelectualismo. O mentor de Madonna comete equívocos históricos. Há algo de verdadeiramente assustador nesse tipo de amnésia histórica, nessa rejeição ao conhecimento aceito. Gostaria de levar a Madonna (a quem adoro) a uma biblioteca para fazê-la entender a superficialidade do que lhe ensinaram. FOLHA - Você conhece a Madonna? ZADIE - Encontrei-a em Los Angeles durante alguns minutos e quis conversar com ela, mas não me atrevi. FOLHA - Seus romances são sempre muito engraçados.
ZADIE - Nunca li um bom livro
que não tivesse alguma dimensão cômica, com exceção de
Dostoievski, um grande escritor profundamente desprovido
de humor. Nunca o suportei,
confesso, mas é por causa de
sua falta de humor. Tolstói sorri, Nabokov ri, assim como Borges, Kafka ri de chorar. Dostoievski, nunca.
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