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CINEMA
Censura a filmes no Brasil vira livro
JOSÉ GERALDO COUTO
da Equipe de Articulistas
O livro "Roteiro da Intolerância - A Censura
Cinematográfica no Brasil",
que será lançado
hoje à noite no
Espaço Unibanco de Cinema, poderia ser apenas
um delicioso besteirol.
Bastaria para isso que seu autor,
o pesquisador e crítico Inimá Simões, se limitasse a transcrever os
pareceres da censura sobre os filmes interditados ou mutilados em
nome da "segurança nacional" ou
dos "valores morais da família brasileira".
Mas o livro vai muito além disso.
Ancorado numa pesquisa cuidadosa nos arquivos da censura e em
entrevistas com cineastas e censores, o autor explicita a gênese e o
mecanismo de funcionamento
dessa máquina de cercear a informação e a imaginação.
Não há em "Roteiro da Intolerância" uma relação extensiva de
todos os filmes censurados -o
que seria útil, mas enfadonho-, e
sim um levantamento, por amostragem, de casos reveladores da
natureza da censura.
Por outro lado, a abordagem não
se restringe ao período do regime
militar (1964-85), embora este seja
o foco principal da pesquisa.
Como mostra Simões -baseado
em livro de Maria Rita Galvão-, a
censura cinematográfica no Brasil
começou praticamente junto com
o próprio cinema -e sobreviveu
ao fim da ditadura militar.
Já na Nova República, por pressões do alto clero católico, o governo Sarney vetou a exibição em território nacional do célebre "Je
Vous Salue Marie", de Jean-Luc
Godard.
Mas é claro que foi durante o período militar que a censura floresceu como uma planta carnívora.
"Elite"
Nada passou incólume pela tesoura: do cinema mais sofisticado
(Antonioni) ao mais popular (Zé
do Caixão), da alegoria política
("Terra em Transe") à comédia de
costumes ("Marcelo Zona Sul"),
todos foram alvo da arbitrariedade
dos censores.
Estes, como mostra Simões,
eram considerados a "elite intelectual" da polícia, mas seus pareceres revelam uma estupidez sem tamanho -e sem a menor noção do
ridículo.
Os exemplos são inúmeros.
Ao recomendar a interdição de
"Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver" (1966), de José Mojica Marins, o censor Manoel Felipe de
Souza Leão escreveu, entre outras
pérolas: "O filme ora examinado
focaliza as facetas de um autêntico
débil mental que não acreditava na
reencarnação (...). Ao ser perseguido, o produtor grita aos quatro
ventos que a vida eterna não existe
simplesmente...".
Além de confundir o realizador
do filme (Mojica) com seu personagem (Zé do Caixão), o "intelectual" da polícia não admitia que
uma "pessoa normal" negasse a
reencarnação e a vida eterna.
Absurdos como esse encontram-se a cada página de "Roteiro de Intolerância", um livro que -para
dizê-lo à maneira dos censores-
diverte e instrui.
Avaliação:
Livro: Roteiro da Intolerância
Autor: Inimá Simões
Editora: Senac/Terceiro Nome
Lançamento: hoje, às 19h, no Espaço
Unibanco de Cinema (r. Augusta, 1.475, tel.
011/288-6780)
O colunista
José Simão está em férias.
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