São Paulo, sábado, 27 de junho de 2009

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Crítica/DVD/"Retratos da Vida"

Lelouch cria a "obra-prima" da cafonice

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

Uma boa notícia para todos aqueles que cultuaram "Retratos da Vida" e alçaram o diretor francês Claude Lelouch ao patamar de "grande artista": o maior clássico do sentimentalismo dos anos 80 está de volta! Agora em DVD, mas numa cópia sem nenhum brilho.
O filme é daquele tipo cuja sinopse é impraticável. Sua ambição pelo menos é reconstituir os traumas históricos de parte do século 20 e expor a catástrofe das guerras aos olhos das gerações que não as viveram. Na memória do espectador, porém, os 168 minutos de duração são apenas uma longa maturação para o apoteótico final, em que o "Bolero" de Ravel é dançado sob a Torre Eiffel.
Até chegar lá, é fácil se sentir perdido em meio à rede de emoções que o produtor, roteirista e diretor Lelouch (o acúmulo de tarefas nem esconde a autoafirmação como "autor") trança em forma de saga. Em resumo, ele conta as peripécias de quatro núcleos familiares em capitais-chave da história do século: Moscou, Berlim, Paris e Nova York, desde a eclosão da Segunda Guerra.
No caminho, enfrentaremos, claro, o Holocausto, o totalitarismo stalinista, a Guerra da Argélia e, por fim, a fome no mundo. Em meio a sucessivos desastres, o público ainda viverá amores e mortes, separações e acasalamentos, perdas e reencontros, além de duas tentativas de suicídio, um acidente mortal de carro e um sem-número de mortes na guerra.
Ao final, numa demonstração de que a "arte" supera conflitos, Lelouch promove o triunfo da "estética Cruz Vermelha" com a cena que, para muitos, não saiu da memória. A ambição de Lelouch sempre foi maior que seu talento e ela só se realiza plenamente quando o diretor se entrega, como aqui, à desmesura. A vantagem de "Retratos..." sobre o restante da carreira do diretor é que neste trabalho ele não tenta se fantasiar com os simbolismos do "cinema de arte" e se entrega, com toda liberdade, a exercitar seu estilo verdadeiramente pessoal, marcado pela hipérbole dos sentimentos.
Desse modo, os números de canto e dança que invadem a narrativa são assumidamente excessivos e enfatizam o filme como um melodrama desavergonhado. Com tanto despudor à sua frente, só se pede ao espectador que perca também o seu e se entregue ao gozo dessa "obra-prima" da cafonice.


RETRATOS DA VIDA

Direção: Claude Lelouch
Lançamento: Classicline (R$ 14,90; classificação: 14 anos)
Avaliação: bom




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