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São Paulo, domingo, 27 de julho de 2003

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COMENTÁRIO

Seja bem-vinda, Maitena

DANUZA LEÃO
COLUNISTA DA FOLHA

Querida Maitena: vai ser muito bom conviver com você semanalmente, e sua chegada ao Brasil vai mostrar a nós, mulheres, que entre ficar à beira de um ataque de nervos e ter esse ataque, podemos perfeitamente optar pela segunda hipótese -e sem nenhum pudor.
Para quem ainda não te conhece, vou contar como você é -e todas somos um pouco você: queremos cortar os pulsos ao descobrir uma única celulite na coxa, enlouquecemos quando nosso atual chega em casa cansado, nos contorcemos de ciúme só de pensar que ele teve uma mulher antes de nós, e por isso somos chamadas de loucas, veja você. Não somos loucas, apenas alteradas, e essa é a nossa grande riqueza.
Ser alterada é ser normal. Uma mulher normal é aquela que uma semana antes de partir para as férias na praia se olha no espelho sem um pingo de piedade, como se estivesse olhando para uma rival, e a partir do que vê passa a odiar o sol e o mar, e convence o marido e os filhos a mudar o roteiro e a irem todos esquiar. Claro: e a barriga? E os peitos caídos? E a celulite?
Somos normais quando lemos no jornal o nosso horóscopo, o dele e o da pessoa que mais odiamos, quando não falamos no telefone durante o fim de semana inteiro esperando que ele ligue (e tirando do gancho o tempo todo para ver se está funcionando), quando nos recusamos a transar porque esquecemos de fazer depilação.
Vai ser bom ter você por aqui, você que já é tão famosa no exterior, para que nós, brasileiras, aceitemos com naturalidade que somos capazes de tudo: que quando queremos mudar de vida vamos ao cabeleireiro, e que chamar todas as ex de nossos atuais de vacas é muito natural.
Pedimos a opinião dos outros para fazer exatamente o contrário, morremos de vergonha de pedir certos artigos na farmácia, nunca vamos visitar nossos afilhados, passamos a vida fazendo dieta, viramos vegetarianas porque está na moda, nossas geladeiras podem um dia estar cheias e no outro dia vazias, nos esquecemos de tomar a pílula e só percebemos que deixamos o passaporte em casa quando chegamos no aeroporto. Trabalhamos muito e nos aceitamos cada vez mais como somos, mesmo morrendo de culpa em relação a nossos filhos.
Somos fortes e frágeis, podemos querer um namorado quando não temos nenhum e querer estar sós quando temos um, apaixonadas só queremos falar deles, achamos que nossos homens têm mil mulheres, juramos que nunca mais vamos ligar para eles, somos inseguras, adoramos ir às compras, não resistimos a uma liquidação e sempre compramos tudo errado. Usamos sombra, esmalte e batom negros, fazemos tatuagem e quando eles estão doentes tiramos a temperatura a cada 15 minutos e damos comida na boca.
Para você - como para todas nós-, toda mulher bonita é uma piranha, descobrir que seu ex está gordo e horrendo é melhor que um orgasmo, se ele disser que estamos mais cheinhas somos capazes de matar, e quando convidamos para uma festa morremos de medo que não apareça ninguém; além disso, somos sujeitas a depressões, que tentamos curar comendo chocolate ou ouvindo músicas bem tristes, para ficar pior ainda. Você mostra, sobretudo, que temos a capacidade e o direito de mudar, e que podemos ser incoerentes, histéricas, algumas vezes mesquinhas, invejosas, generosas, ilógicas, muitas vezes impossíveis de ser compreendidas e, exatamente por tudo isso, maravilhosas.
Seja muito bem-vinda, Maitena.


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