São Paulo, sexta-feira, 27 de agosto de 2010

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CRÍTICA ARQUITETURA

Revista espanhola joga luz sobre Artigas

Número da "2G" dedicado ao autor da FAU/USP ajuda estrangeiro a compreender a escola paulista de arquitetura


O AUTOR CHAMA A ATENÇÃO PARA O "IMPULSO ERÓTICO" DE ARTIGAS EM ABRIR PONTO DE LUZ NO ENCONTRO ENTRE VIGA E PILAR

FERNANDO SERAPIÃO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Uma monografia publicada na Espanha sobre o arquiteto brasileiro Vilanova Artigas (1915-1985) deve amenizar a lacuna entre os pesquisadores estrangeiros a respeito do brutalismo paulista, ou escola paulista, movimento cultural que protagoniza a cena arquitetônica brasileira há 50 anos.
Em linhas gerais, seus adeptos criaram obras introspectivas em concreto aparente e espaços contínuos. A ênfase no coletivo apoiava-se em discurso político progressista. Artigas foi o líder intelectual do movimento e autor do mais emblemático edifício: a FAU/USP, de onde saíram parte dos integrantes.
A escassez de publicações internacionais limita a discussão ao âmbito brasileiro. Quem ilumina o tema é o mais recente número da revista espanhola de arquitetura "2G", de uma importante editora do setor.
Mesclando produções modernas e contemporâneas, a "2G" publica quatro números monográficos anuais. Ela já havia focado dois outros arquitetos brasileiros: Lina Bo Bardi e Paulo Mendes da Rocha. O editor teve a ideia quando esteve em São Paulo para preparar a edição de Mendes da Rocha.
"Eu conhecia a obra de Vilanova Artigas através de livros, mas, ao vê-la de perto, ficou claro que precisava fazer um número sobre ele", conta Moisés Puente.
O artigo de peso é assinado pelo prestigiado crítico inglês Kenneth Frampton. Autor do clássico "História Crítica da Arquitetura Moderna" (Martins Fontes), há pouco mais de uma década atrás, Frampton ignorava parte da produção brasileira.
Na ocasião, escreveu um mea-culpa confessando pouco conhecer a obra de Mendes da Rocha, o mais destacado discípulo de Artigas.

KON E WISNIK
O texto de Frampton na "2G" certamente irá ajudar a difundir as ideias do movimento paulista, mas, para os especialistas locais, ele não abre novas janelas.
Com talento, o autor analisa coberturas e rampas, dois elementos fundamentais na poética do arquiteto. Ele chama a atenção para o "impulso erótico, quase perverso" de Artigas em abrir um ponto de luz no encontro entre a viga e o pilar.
Quem rouba a cena é Nelson Kon (o mais destacado fotógrafo de arquitetura do país, que fez 14 ensaios para a edição) e o texto do crítico brasileiro Guilherme Wisnik, organizador do número.
Em sua análise, o brasileiro descreve com mais propriedade o contexto histórico, político e social. De forma menos óbvia, ele cruza informações biográficas com as diferentes fases da produção do arquiteto e abre janelas interpretativas, como os possíveis pontos de contato entre Artigas e Hélio Oiticica.
Contudo, excluindo citações a Mendes da Rocha, Wisnik (assim como Frampton) não ilumina possíveis contribuições decisivas para o movimento criadas por arquitetos como Pedro Paulo de Melo Saraiva e Joaquim Guedes. Algumas pistas bastariam para deixar claro que não existiu só um mestre e um discípulo talentoso.
Por fim, de maneira corajosa, Wisnik conclui trazendo os preceitos da escola paulista para as gerações mais novas. Para ele, se é difícil atualizar o movimento por meio de seu conteúdo moral, é possível ainda utilizar suas virtudes espaciais.
Fica uma pergunta: mas isso não resulta em maneirismos?


FERNANDO SERAPIÃO é arquiteto e editor-executivo da revista "Projeto Design"

2G - JOÃO VILANOVA ARTIGAS (Nº 54)
AUTORES Guilherme Wisnik (editor convidado), Kenneth Frampton e Vilanova Artigas
EDITORA Gustavo Gili
QUANTO R$ 91,64 (150 págs.)
AVALIAÇÃO bom


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