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São Paulo, quinta-feira, 27 de novembro de 2003

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GASTRONOMIA

Com flores na ponta da língua

NINA HORTA
COLUNISTA DA FOLHA

Tenho anos e anos de janela e já comprei muito livro de flores comestíveis. Como são eles? Estrangeiros, quase sempre, com belas fotos, os nomes na língua pátria sem o nome científico. Quem tem coragem de comer uma flor porque é parecida com a flor alaranjada no fundo daquela panela de cobre na Provença?
Gil Felippe já nos escreveu um livro de receitas, "O Saber do Sabor", as plantas nossas de cada dia. Gostei. Mas reclamei. Gil Felippe é um senhor botânico e dava mais atenção às receitas de comida, tinha uma certa timidez de nos encher de ciência... Ora Gil, queríamos saber que raio de ingredientes são esses que usamos, como se chamam, quando e onde crescem!
Queremos credibilidade, engolir cogumelos sem medo, trincar caules verdes sem fugir da Parca! Rigor, minúcias, muita referência para consulta! E o nome científico, que coisa mais preciosa, que deveria constar de todos os ingredientes mais comuns, em todos os livros, em todas as listas de peixes, de cortes de carnes!!!
Pois, desta vez, Gil Felippe arrasou. Veio com flores, começou docemente para não assustar. "Entre o Jardim e a Horta".
Às vezes, livros de flores são o maior mico. Fico pensando que se flores fossem coisas muito gostosas, já não existiriam jardins decorativos, e nhoc neles. Tudo bonito, bonito... mas sem jeito de usar. Mas agora tudo se ajeitou. O livro de Gil Felippe ensina, é um livro de botânica, dá o nome aos bois. Você, sabendo o nome científico de alguma coisa, sabe tudo, do mundo inteiro. Com histórias, com receitas, com muita graça.
Teria ele, com sua formação de botânico, esquecido a gastronomia? Não, nem ver. São receitas alicerçadas nos nomes botânicos dos ingredientes. E já começa com flores de alcachofra, de couve-flor, brócolis, flor de abóbora com gorgonzola... é da pesada, as violetinhas confeitadas aparecem, mas não como prato principal.
E você aprende de tudo um pouco. Já fui comprar chá num shopping e pedi chá de roselle. Não tinha, só uma coisa bem parecida que chamavam de hibisco. Mas será que eu queria hibisco? Aí a vendedora se adiantou: "É o sorrel inglês que faz aquela sopinha verde, finíssima". Sorrel? Verde? Mas eu queria o refresco. O rapaz a meu lado não aguentou. "Isso é vinagreira de fazer arroz de cuxá no Maranhão."
O quê?
Bom, todas essas dúvidas você dirime com nosso amigo Gil Felippe.
A vinagreira é também conhecida como caruru amargo, groselheira ou azedinha... O nome egípcio é karkady, e no México é chamada de flor da Jamaica, enquanto nas Índias Ocidentais é chamada de sorrel....
As folhas da vinagreira são usadas na alimentação, como se faz com o espinafre; no Maranhão, as folhas são usadas para o típico prato de arroz de cuxá.... E a receita que vem abaixo é de chutney de vinagreira, e o nome científico dessas coisas todas, que são a mesma coisa, é Hibiscus Sabdariffa L (família malvaceae). E a aquarela da Maria Cecília Tommasi pode pôr no quadro, de tão linda.
Pois, então, Gil Felippe, eu não te disse um dia que você iria estourar quando usasse mais seus conhecimentos de botânica do que de chef para agradar os chefs? A coisa que mais precisamos são desses livros sérios de consulta, precisamos e muito.
E o melhor, o melhor de tudo, é que agora, com a credibilidade toda que angariou, vai poder fazer o livro de afrodisíacos, sabe, aquele ótimo, aquele de sacanagem (com nomes científicos), que tem guardado na gaveta há um tempão? A ele, Felippe com dois p!!!! E obrigada por esse, valeu.


ENTRE O JARDIM E A HORTA - AS FLORES QUE VÃO PARA A MESA.
Autor: Gil Felippe. Editora: Senac - SP. Quanto: R$ 48 (288 págs.).

ninahort@uol.com.br



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