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Clássico de Faoro completa 50 anos com nova edição
"Os Donos do Poder", obra que analisa o caráter patrimonialista do Estado brasileiro, será tema de debate, hoje à noite, na FGV
Na época em que escreveu uma das mais importantes interpretações do país, Raymundo Faoro era jovem e obscuro advogado no RS
RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL
Do esforço e da erudição individual de um obscuro advogado gaúcho, uma espécie de
"self-made man" da análise sociológica, nasceu, há 50 anos,
uma das mais importantes interpretações sobre o Brasil.
Leitura que dizia, justamente,
que o Estado patrimonialista
sufocava aventuras ou empreendimentos independentes, impedindo o surgimento de
ideário e práticas modernas, liberais no país.
O hoje clássico "Os Donos do
Poder - Formação do Patronato
Político Brasileiro", de Raymundo Faoro (1925-2003), escrito à mão em 1954, só veio a
ser editado em 1958, pela então
gaúcha editora Globo.
Ganhará agora uma nova edição, que chega às livrarias nesta
semana, com comentário crítico do professor de ciência política da USP Gabriel Cohn e reprodução de manuscritos.
Conta Cohn que "o livro talvez não tivesse vencido a muralha da indiferença" se não ocorresse a alguém na editora
-"consta que Erico Verissimo"- sintetizar o argumento
com um título novo, a partir do
próprio texto de Faoro.
E quem são esses celebrizados "donos do poder"? São representantes de um Estado que
confunde coisa pública e privada, um "estamento" burocrático que não tira seu poder da representação de grupos ou interesses econômicos e sociais independentes da máquina estatal, mas, ao contrário, que constitui riquezas privadas e fortalece grupos a partir das posições que ocupam no Estado.
Herança e mudança
Para o autor gaúcho, que viria
a ser figura de frente na luta pela redemocratização do país
durante a ditadura militar
(1964-1985), o Brasil herdou de
Portugal uma organização política pré-moderna, em que o Estado capitaneia os grandes empreendimentos comerciais, sufocando a existência de uma
burguesia autônoma, limitando e canalizando todos os impulsos da sociedade.
É verdade, no entanto, que o país mudou bastante desde a
publicação da primeira edição
do livro. A democracia ganhou
força e representatividade. Como fica o patrimonialismo hoje
no Brasil? Para o advogado e
ex-ministro da Justiça Miguel
Reale Jr., o argumento permanece atual. "O poder ainda
emana daquele que tem a caneta", ele diz. "Segundo Faoro, o
poder não estava no dinheiro,
no empresariado, no poder social, mas na capacidade de nomear pessoas, alocar conhecidos e distribuir benesses. Isso
continua valendo."
Já Gabriel Cohn defende que
a conclusão principal do livro
de Faoro continua válida apenas se considerarmos que essa
forma geral do Estado patrimonialista é extremamente "plástica", adaptando-se sempre a
novas realidades. A leitura é
possível, mas o advogado sugere rigidez maior em sua tese,
como alerta o próprio Cohn.
"O que não dá para sustentar
é a idéia de uma asfixia total sobre a sociedade. Você tem uma
sociedade tolhida na sua capacidade de constituir seus próprios dinamismos, mas a idéia
de uma sociedade asfixiada [pelo Estado] não se mantém."
Cohn e Reale Jr. participam
hoje à noite, na Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas
(r. Rocha, 233), de um debate
sobre Faoro e "Os Donos do Poder". Também participarão da
mesa o advogado e cientista político Oscar Vilhena e o historiador Carlos Guilherme Mota.
O encontro acontece às 19h, e a
entrada é gratuita.
OS DONOS DO PODER
Autor: Raymundo Faoro
Editora: Globo
Quanto: R$ 94 (936 págs.)
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