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Ronaldo Fraga decifra sua coleção chinesa
CAMILA YAHN
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
A coleção de Ronaldo Fraga
no terceiro dia da São Paulo
Fashion Week, na sexta-feira,
inspirado na China, entusiasmou por ao menos dois motivos. Primeiro, porque foi apresentada num desfile concebido
como uma grande performance, inclusive com a participação
de dezenas de figurantes de origem oriental. Segundo, porque
tinha uma tal profusão de elementos visuais e conceituais,
que necessitam decifração detida.
"Ao usar a China como inspiração, vi que existem dois caminhos: a China da rua 25 de Março, que é a engraçadinha, e a da
Chinofobia", diz Ronaldo Fraga. "Resolvi pegar o caminho do
meio, que é pensar na China como o mundo em que vivemos.
Lá tem exploração, trabalho escravo e falsificação. Será que é
que tão diferente daqui e do
resto do mundo?", pergunta.
Com forte viés político, Ronaldo usa o desfile por inteiro
para mostrar seu descontentamento. A primeira provocação
já aparece na cenografia, que
inclui um grupo de chineses
que representam funcionários
de multinacionais. Nos uniformes, logos de empresas como
Apple, Motorola e Volkswagen.
"As pessoas ficam loucas
querendo comprar tecnologia.
Não querem um livro, não querem uma roupa, não querem ir
ao cinema. Só estão interessadas nos i-Pods e "xipods". É lamentável", afirma.
Peças com estampas de bambu aparecem em leggings, saias
plissadas, jaquetas e calças.
"Criei registros gráficos da cultura chinesa", diz ele. Até a pomadinha do tigre aparece estampada em blusas, calças e
saias. Ainda tem o desenho de
colegiais na porta da escola, que
remete ao massacre de estudantes em 1989, na praça da
Paz Celestial, em Pequim.
Uma montagem de fotografias de meninas chinesas representa os bebês do sexo feminino que são mortos pelos próprios pais logo quando nascem.
"Penso nessa maldade. São as
meninas que poderiam ter
morrido."
Mesmo que sua inspiração
beba em seu próprio desconforto, Ronaldo constrói uma
coleção que também traz humor. Cada um dos botões mostra uma diferente posição do sexo tântrico. As imagens de
porco que estampam as bolsas
simbolizam o ano do porco no
horóscopo chinês.
"Existe o lado político, mas a
roupa também precisa provocar desejo", observa.
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