São Paulo, domingo, 28 de janeiro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Ronaldo Fraga decifra sua coleção chinesa

CAMILA YAHN
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A coleção de Ronaldo Fraga no terceiro dia da São Paulo Fashion Week, na sexta-feira, inspirado na China, entusiasmou por ao menos dois motivos. Primeiro, porque foi apresentada num desfile concebido como uma grande performance, inclusive com a participação de dezenas de figurantes de origem oriental. Segundo, porque tinha uma tal profusão de elementos visuais e conceituais, que necessitam decifração detida.
"Ao usar a China como inspiração, vi que existem dois caminhos: a China da rua 25 de Março, que é a engraçadinha, e a da Chinofobia", diz Ronaldo Fraga. "Resolvi pegar o caminho do meio, que é pensar na China como o mundo em que vivemos. Lá tem exploração, trabalho escravo e falsificação. Será que é que tão diferente daqui e do resto do mundo?", pergunta.
Com forte viés político, Ronaldo usa o desfile por inteiro para mostrar seu descontentamento. A primeira provocação já aparece na cenografia, que inclui um grupo de chineses que representam funcionários de multinacionais. Nos uniformes, logos de empresas como Apple, Motorola e Volkswagen.
"As pessoas ficam loucas querendo comprar tecnologia. Não querem um livro, não querem uma roupa, não querem ir ao cinema. Só estão interessadas nos i-Pods e "xipods". É lamentável", afirma.
Peças com estampas de bambu aparecem em leggings, saias plissadas, jaquetas e calças. "Criei registros gráficos da cultura chinesa", diz ele. Até a pomadinha do tigre aparece estampada em blusas, calças e saias. Ainda tem o desenho de colegiais na porta da escola, que remete ao massacre de estudantes em 1989, na praça da Paz Celestial, em Pequim.
Uma montagem de fotografias de meninas chinesas representa os bebês do sexo feminino que são mortos pelos próprios pais logo quando nascem.
"Penso nessa maldade. São as meninas que poderiam ter morrido."
Mesmo que sua inspiração beba em seu próprio desconforto, Ronaldo constrói uma coleção que também traz humor. Cada um dos botões mostra uma diferente posição do sexo tântrico. As imagens de porco que estampam as bolsas simbolizam o ano do porco no horóscopo chinês.
"Existe o lado político, mas a roupa também precisa provocar desejo", observa.


Texto Anterior: São Paulo Fashion Week/Outono-Inverno 2007: Maria Bonita brinca com ilusões de ótica
Próximo Texto: Fast-fashion
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.