|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"O AMIGO OCULTO"
Apesar de jogo cinematográfico, suspense falha no desenlace
PAULO SANTOS LIMA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
A pergunta que não quer
calar: por que a Fox valoriza
tanto a manutenção do segredo
sobre o final de "O Amigo Oculto" (suspense que estreou na última sexta-feira)? Isso faz aumentar
ainda mais o interesse pelo de-
senlace, que é horrível, meio uma
mordida no próprio rabo que
John Polson faz com as brincadeiras e importações cinematográficas que surgem desde o primeiro
plano do filme. Um grande jogo
que no final prega uma tremenda
peça em cima do espectador.
Temos no prólogo os grandes
olhos da garotinha protagonista,
Emily (Dakota Fanning), assistindo ao céu e às coisas do mundo no
brinquedo de um parque. Imagem-resumo que diz estarmos em
exercício de cinema puro, olhando para uma brincadeira de imagens e sons engendrada pelo diretor. Que é, aliás, ainda maior
quando estamos no gênero do
terror/suspense, onde há um jogo
de esconder evidências e sugerir
outras. Não é por menos que a
grande brincadeira de Emily seja
a de esconde-esconde.
É isso que ela brinca com sua
mãe (Amy Irving) antes desta se
suicidar numa banheira. O pai,
David (Robert De Niro), flagra a
tragédia, assim como a menina,
com seus olhos enormes, azuis e
atônitos, emoldurados por olheiras que parecerão aumentar a cada minuto avançado da história.
O viúvo decide se mudar com a filha para um lugar retirado a fim
de apagar, ou pelo menos superar, o evento. Irão, bem à maneira
do suspense, para uma casa de
campo enorme, cheia de cômodos, escadas e até quarto escondido, meio como um jogo.
Mas o diretor Polson não se encanta em mostrar todos os espaços, nem a vastidão da floresta
que envolve o casarão. A câmera
trabalha em fragmentos, fica atrás
de persianas de portas, segue solenemente pelos espaços, meio procurando coisas e escondendo outras. Ela não entra, por exemplo,
na gruta na qual Emily sairá outra, na verdade acompanhada de
um tal Charlie, alguém que a faz
dizer coisas horrendas para o pai.
Não sabemos quem é Charlie, se
de carne e osso, espírito ou pura
fantasia da garota. David e uma
amiga, ambos psicólogos, crêem
que ele seja um instrumento para
a filha culpar alguém pela tragédia. Na verdade, Emily é quem será instrumento para sabermos algo sobre Charlie, que também
brinca de esconder e que traz novos acontecimentos sinistros à casa, além de verdades à tona.
A bonitinha criança Emily, ponte entre Charlie e o mundo apresentado na tela e fora dela, vai se
tornando enfim uma figura igualmente sinistra, com semblante
quase malévolo, e que parece saber mais coisas que nós e os outros personagens. Ela, como seu
esconde-esconde, é como se fosse
uma narradora-onisciente, que
sabe qual é a regra do jogo dos
acontecimentos.
E John Polson, cineasta-cinéfilo,
tem domínio sobre o filme, explicitando seqüestros cinematográficos, como o carro, que, visto por
cima, percorre a artéria sinuosa
da estrada ("O Iluminado"), um
plano remetendo à janela acesa na
casa de "Psicose", uma trilha que
mimetiza "O Bebê de Rosemary"
e até, a horas tantas, um corpo
boiando em água parada como a
morte epíloga de "A Marca da
Maldade". Uma ótima artimanha
cinematográfica, portanto. E daí,
uma nova pergunta: depois deste
filmar de Polson, precisamos
mesmo de uma baita conclusão
na trama?
O Amigo Oculto
Hide and Seek
Direção: John Polson
Produção: EUA, 2005
Com: Robert de Niro, Dakota Fanning,
Famke Janssen e Elisabeth Shue
Quando: nos cines Bristol, Interlagos,
Lapa e circuito
Texto Anterior: Projeto abriga grandes canções em seleção confusa Próximo Texto: Cinema: Paris se despede de seu templo dos filmes Índice
|