São Paulo, quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

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Crítica/show

Coldplay perde força e faz pop banal

Bruno Miranda/Folha Imagem
Chris Martin no primeiro dos três shows do Coldplay em SP


SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL

Há algo de dissonante num concerto de rock em que grande parte das mulheres comparece de salto alto (vários do tipo agulha). Nada contra o calçado. Mas não é difícil deduzir que uma banda que inspira esse visual já perdeu o pulsar de uma vibração musical juvenil. Usa-se salto alto para ir a um show da Maria Rita ou da Marisa Monte, mas não ao do Radiohead ou do U2.
Pois foi assim, assumindo o fato de ter virado "mainstream" e, conseqüentemente, inofensiva, que a banda britânica Coldplay subiu ao palco do Via Funchal, em São Paulo, na noite da última segunda-feira.
Essa transformação poderia ser uma escolha legítima, e não sinal de perda de qualidade, caso o grupo não tivesse caído na tentação de banalizar boas canções pop, como "Yellow" e "In My Place", direcionando-as a um único objetivo: fazer o público cantar junto.
A falta de releituras originais dos hits e a intenção de torná-los mais acessíveis transformam a apresentação em uma sessão arrastada de lamúrias coletivas. Lamúrias estas que, ainda por cima, reforçam a banalidade das letras ("Look at the stars/ Look how they shine for youuuu"...).
Toda delicadeza de faixas como "Clocks" perde-se na execução martelada das melodias. Parece que Chris Martin e sua turma se cansaram do repertório, deram a ele um formato que sabem que vai agradar e andam repetindo-o com má vontade, pois já sabem que dele não dá para extrair mais nada.
O show começou com uma gravação de "Tomorrow Never Knows", dos Beatles, faixa do álbum "Revolver" (1966), que marcou a guinada psicodélica do quarteto de Liverpool. Seria um bom sinal se, com isso, o Coldplay quisesse dizer que vai trilhar novo caminho musical.
Como não é caso, a referência soa apenas como atestado da nacionalidade do grupo. E como sugestão de que foi assistindo ao jeito ingênuo de Paul McCartney cantar ao piano que Martin "criou" seu estilo.

Demagogia roqueira
Competindo com Bono, do U2, na categoria demagogo do rock, Martin falou português ("E aí, beleza?"), foi cantar no meio da platéia ("Til Kingdom Come") e, cedendo a pedidos, cantou "Shiver", que não constava do set list inicial.
A pergunta que fica é o que o Coldplay fará com a porta que abriu ao tornar-se referência para uma determinada geração pop, criando uma leva imensa de seguidores. Alguns deles, como o Keane (que toca aqui em abril), já ameaçam, inclusive, roubar-lhe o posto.
Sobram duas opções: ou o grupo segue na onda de "virar o novo U2" ou aposta em seu potencial agressivo, tomando, por exemplo, o caminho trilhado pelos compatriotas do Muse. Como está, seguirá lotando estádios e levando mocinhas ao transe romântico. Mas será que isso basta?

COLDPLAY  

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