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DISCO/LANÇAMENTO
"COM ELA"
Percussionista acompanhou cantora por oito anos em shows e CDs
Lanlan estréia carreira solo "com" Cássia Eller
DA REPORTAGEM LOCAL
Elaine Silva Moreira começou a
ser notada na MPB como a frenética percussionista baiana na cozinha dos shows de Cássia Eller.
Parceira fiel nos últimos oito anos
de vida da cantora, estava com
Cássia quando ela sofreu a parada
cardiorrespiratória que acabou
por matá-la, no final de 2001.
Num primeiro momento, segurou o tranco da fase policial que se
seguiu e caiu em abatimento. Perdeu "toda a graça de fazer música", por causa da "perda patética". Ninguém supunha que um
dos resultados de tal epopéia fosse
ser a estréia como cantora solo,
que acontece agora. O CD sai pela
gravadora independente baiana
Maianga, e se chama "Com Ela".
Ninguém supunha, exceto a
própria Lanlan, hoje com 34 anos.
No final dos anos 80, quando participou do grupo baiano de rock
Rabo de Saia como baterista e
backing vocal, já se iniciou como
compositora.
"Amor Destrambelhado" foi
seu primeiro rock, que Cássia recuperaria em 1998 e que Lanlan
regrava agora em companhia de
Márcio Mello, ex-companheiro
de Rabo de Saia.
Seguiu compondo e pensando
numa carreira solo nas horas vagas do trabalho como percussionista de Elba Ramalho, Tim Maia,
Carlinhos Brown, Marisa Monte,
Kid Abelha e outros, principalmente Cássia Eller.
"Compunha, mas morria de
vergonha de mostrar. Morria,
não, morro até hoje", diz, lamentando nunca ter tido coragem de
pegar o violão e cantar suas músicas para Cássia Eller.
A tragédia pode ter acelerado
sua história particular ("Só consigo compor quando estou muito
triste, por causa de afeto, perda"),
mas não foi a motivadora principal, ela afirma.
Em 1999, Lanlan fez seu primeiro show como líder da banda Os
Elaines (que a acompanha até hoje, em "Com Ela"), em Salvador.
Cássia não pôde ir, mas assistiu ao
vídeo depois.
Consumada a perda da parceira, diz que se surpreendeu ao se
ver conseguindo voltar à vida devagarinho. Menos de dois anos
depois debuta num disco repleto
de referências explícitas e implícitas a Cássia. Ao menos duas canções, "Com Ela" e "Broto", são assumidamente feitas para Cássia,
após sua morte.
"O meu amor é você/ não passa,
não/ não me conformo com isso",
canta na balada blue inconformada "Broto". Lanlan procura honrar o avanço que Cássia propiciou
ao Brasil com sua postura direta
em relação à sexualidade. Diz que
já se apaixonou por homens e por
mulheres, e que não trata sexualidade como problema.
"Minhas letras são todas com
"ela", "ela", "ela", está na cara. Vamos ser verdadeiros, porque o
mundo está pegando fogo", proclama.
Apesar de acusar distorções no
modo como a mídia tratou o caso,
hoje comemora a serenidade que
se estabeleceu mais adiante, pelo
apoio da população e pelo que ela
chama de uma revolução silenciosa iniciada por Cássia.
"A conquista da guarda do filho
por sua companheira Eugênia me
tranquilizou, isso foi muito importante para o Brasil. Pena que o
preço foi muito alto, a morte dela", comemora/lamenta.
Se há tanta tristeza em volta,
ainda assim Lanlan concebeu o
disco "Com Ela" como um disco
para cima, roqueiro, mas rico em
referências a reggae, ska, percussão baiana, brisa espanhola.
Assimila a cultura de alegria da
axé music, da Bahia de que se
afastou há 14 anos. Celebra a "pioneira" Sara Jane, para ela uma das
maiores intérpretes que a Bahia já
teve. Mas diz que como cantora
quer estar mais para Cássia Eller e
Jussara Silveira que para as intérpretes baianas que "exageram".
Talvez por essa via, diz que tenta
um modo bem humorado de sair
da tristeza, mesmo nas canções
mais tristes e nas feitas sob o impacto da morte de Cássia. "Fazer o
disco foi uma terapia muito boa.
A vida prossegue. Mas era muito
melhor com ela", finaliza.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
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