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CARLOS HEITOR CONY
Crônicas, colunas e mosquitos
Quanto ao tamanho das crônicas, um texto com mais de duas laudas era cascata, encher lingüiça
LEITOR JUSTAMENTE indignado
com meus textos publicados
na página 2 da Folha, reclama
da insistência com que os considero "crônicas" e não "colunas", que
seria a classificação correta na opinião dele, na opinião do povo e do
Senado romano. Diz ele que não se
pode considerar como crônicas os
seis ou sete parágrafos que a feição
gráfica daquela página estabelece
para os "colunistas".
Realmente, sempre recusei a
classificação de colunista desde o
remotíssimo ano em que dois editores do "Correio da Manhã" (Moniz Vianna e Fuad Atalla) me abriram espaço na capa do segundo caderno para escrever o que me viesse na cabeça, tronco e membros.
Eles foram claros: queriam crônicas. O jornal tinha vários e brilhantes colunistas, responsáveis por seções fixas, como teatro, cinema,
música, artes plásticas, fofocas, livros, rádio e TV, saúde, turismo
etc. Eu revezaria com um tal de
CDA, este no primeiro caderno,
que além de poeta maior era cronista dos melhores de todos os
tempos.
Mais ou menos naquela época,
fui convidado a fazer o mesmo na
Folha, onde mais uma vez revezava com uma poeta, das maiores de
nossa língua: Cecília Meireles. Éramos cronistas -com a óbvia distinção de qualidade. Nem que nascesse mil vezes chegaria ao nível de
Drummond e Cecília.
Quanto ao tamanho das crônicas,
dos seis ou sete parágrafos que o
leitor reclama, gosto de citar João
Saldanha, que além de fazer "crônicas", tinha uma "coluna" sobre esportes nos vários jornais e emissoras em que atuava. Saldanha dizia
que um texto com mais de duas laudas era cascata, enchimento de lingüiça.
Ao citar CDA, Cecília e Saldanha
não estou me comparando a eles.
Faço mal e porcamente o que eles
faziam com engenho e arte. E enquanto a saúde terminal e os veículos me tolerarem, continuarei fazendo crônicas, ruins, mas minhas.
Mudando de assunto: durante os
oito anos do governo FHC, nunca
tive oportunidade de elogiá-lo. Pelo menos três vezes por semana,
descia-lhe o pau e a editora Boitempo chegou a publicar uma coletânea de crônicas minhas, com
charges do Angeli, "O Presidente
que Sabia Javanês".
Fiquei sabendo que ele escreveu
um prefácio para o livro do Henry
Sobel. Não li nem pretendo ler o livro e o prefácio, mas achei bacana a
atitude de FHC. Num momento
em que o rabino está sendo apedrejado, a solidariedade do ex-presidente revela uma grandeza humana que pessoalmente admiro.
Terceiro assunto desta crônica
(que tem mais de sete parágrafos) é
para destacar o brilho e o trabalho
de Lilia Moritz Schwarcz, uma uspiana que hoje é a maior conhecedora de uma fase da biografia do
Rio de Janeiro.
Em livros, artigos e palestras, ela
é a principal referência para diversos momentos da nossa história.
Modesta, sem alardear o academicismo que no caso dela não seria
postiço, Lilia merece entrar no
panteão dos grandes cariocas, ao
lado de dom Pedro 2º, sobre quem
tanto e tão bem escreveu.
Deveria registrar também o trabalho do poeta e embaixador Alberto da Costa e Silva e do historiador José Murilo de Carvalho, que
formam com Lilia um trio de ouro
no terreno das pesquisas sobre Rio
de Janeiro.
Alberto é piauiense por acaso, Zé
Murilo é mineiro, Lilia é paulista. O
governador Sérgio Cabral bem que
podia mandar mensagem à Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro
propondo a concessão de um título
especial, muito especial, aos três
intelectuais que ultimamente mais
se destacaram no estudo e na pesquisa da história do Rio, que afinal
é o mapa da mina para se entender
a história do Brasil.
Último assunto, mas não o último parágrafo. Nada de novo no
front das mazelas cariocas. Não
bastasse a violência urbana, estamos às voltas com um mosquito
-sem termos no banco dos reservas um Oswaldo Cruz. Até um homem de gênio, como Ruy Barbosa,
reclamou da campanha contra a febre amarela. A mídia da época crucificou o grande sanitarista, dele
disseram o diabo, somente a Academia Brasileira de Letras o homenageou, mesmo não sendo ele um
escritor.
Finalmente, o último parágrafo.
Uma das melhores crônicas que conheço é de Machado de Assis e só
tem uma frase: "No meu tempo já
havia velhos, mas poucos".
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