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Crítica/teatro/"Autopeças"
Cia. dos Atores reforça DNA criativo
Grupo leva ao Festival de Curitiba espetáculos "pessoais", criados por atores a partir de uma mesma estrutura de produção
LUIZ FERNANDO RAMOS
ENVIADO ESPECIAL A CURITIBA
Atores inventivos que se
tornam dramaturgos e
encenadores. Esta é
uma tendência comum a vários
grupos brasileiros contemporâneos, mas em nenhum deles
expressou-se melhor do que na
Cia. dos Atores. Seus integrantes estrearam no Rio a série de
espetáculos "Autopeças", em
que cada um deles desenvolveu
trabalhos pessoais a partir de
uma mesma estrutura de produção. Cinco dessas criações
vieram ao Festival de Curitiba.
A atriz Suzana Ribeiro optou
por visitar "Esta Propriedade
Está Condenada", peça de Tennessee Williams de 1946. A delicada encenação propõe-se o
desafio de apresentar atores
adultos interpretando duas
crianças brincando nos trilhos
de uma estrada. Quando Suzana, como a menina abandonada, prestes a se prostituir, dança para o menino que empinava
pipa, alcança-se momento raro.
É um trabalho que se assume
como inacabado e que tem potencial para se adensar mais.
"Apropriação", primeira encenação da atriz Bel Garcia,
parte de pesquisa com a dramaturgia de Harold Pinter. Em
processo colaborativo com os
atores Leonardo Netto e
Thierry Tremouroux, Bel costura uma dramaturgia à altura
do autor. Com uma estrutura
simples de dois homens que
trabalham em um bar, nomeados A e B, chega-se a uma tensão e a uma intensidade poética
extraordinárias. Além das típicas falas secas de Pinter, de sentido indeterminado, há uma
discussão sobre as circunstâncias que os atores vivem quando interpretam seus textos.
Mais do que uma peça de Pinter
ou sobre ele, é um jogo com as
sombras de seu teatro.
Diálogo provocativo
O ator e figurinista do grupo,
Marcelo Olinto, preferiu convidar Gerald Thomas para escrever, encenar e iluminar o espetáculo "Bate Man". O resultado
o comprova como um intérprete talhado ao estilo de Thomas.
Mais do que nunca um dramaturgo inspirado, o encenador
prossegue seu diálogo provocativo com nossa época e suas mitologias. Olinto aparece como
um homem recém-torturado,
em carne e viva e sangrando de
tanto ser chicoteado. Em volta
dele, caixas repletas de garrafas
de vinho permitem um discurso cheio de ironia e derrisão.
Não há diálogo com a Cia. dos
Atores, mas ocupação e reafirmação de território.
Em "Talvez", o ator César
Augusto colabora com roteiro
criado por Álamo Facó e encena um processo de introspecção obsessiva. Facó, jovem ator
saído das oficinas da companhia, é uma revelação. Neste
solo, ele explora as possibilidades de um computador portátil
como ferramenta de articulação cênica e de interação com o
público. É despretensioso, mas
com alta voltagem performativa e ótimos momentos.
Um vídeo apresentado entre
os espetáculos, criação do diretor Enrique Diaz, revela como
os procedimentos da companhia reverberaram numa oficina que ele realizou com atores
europeus. Confirma-se ali o
DNA do grupo e a impressão de
que juntos poderão mais.
Veja mais fotos no blog Cacilda
cacilda.folha.blog.uol.com.br
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