São Paulo, sexta-feira, 28 de abril de 2000


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CINEMA "A LENDA DO PIANISTA DO MAR"

Tornatore faz grande filme visionário

LEON CAKOFF
da Equipe de Articulistas

O cineasta siciliano Giuseppe Tornatore, 44, tornou-se uma espécie de padroeiro das causas perdidas do cinema, das salas fechadas nos vilarejos do interior e de suas platéias órfãs.
"Cinema Paradiso", seu primeiro longa de ficção, com Philippe Noiret no comovente papel de projecionista de um cinema decadente, ganhou o Oscar de melhor filme estrangeiro e virou símbolo de resistência. O próprio filme chegou a circular pelo país com projeções em praças públicas.
Essa triste obstinação acabou transferida para seus filmes seguintes, como uma marca registrada. Tornatore continua padroeiro de causas perdidas em seu último longa "A Lenda do Pianista do Mar", em versão remontada para distribuição no mercado americano, esta que agora nos chega.
Longe de ser americano, apesar de todo falado em inglês, o novo filme traz a melancolia das massas anônimas de imigrantes que trocaram as misérias da Europa, na última virada do século, pela incerta América que o próprio cinema ajudou a glamourizar.
Ansiedade de imigrantes em ver primeiro a estátua da Liberdade, a divisão de classes do navio de passageiros Virginian, a timidez em sonhar, fazem este belo filme vagar no limbo de Fellini ("E La Nave Va") e Leone ("Era uma Vez na América").
Legítimo produto italiano, portanto, e ainda embalado pela música dominadora de Ennio Morricone.
Os requintes impressionantes da produção, apesar do desgaste do atraso com a remontagem do filme, provam que Tornatore é hoje o cineasta italiano mais prestigiado pelo capital americano.
Parte do filme foi rodado nos ainda míticos estúdios de Cinecittà e outra nos estaleiros de Odessa, com milhares de figurantes. O inglês Tim Roth e o americano Pruitt Taylor Vince fazem a dupla de músicos, no piano e no trompete, e dão os toques precisos de atores refinados sob a batuta de diretores europeus ou europeizados como Mike Leigh, Stephen Frears, Wim Wenders, Robert Altman e Woody Allen.
É fácil ver a que se destina tanto capricho europeu num filme americano: a superprodução em recursos é totalmente revertida para uma epopéia de sentimentos, extraída de um monólogo de teatro de Alessandro Baricco, a fantasia absurda de uma criança abandonada no transatlântico que nunca pisará a terra e que crescerá para ser o mais virtuoso pianista jamais imaginado.
O pianista sem raízes refreia com sua obstinada presença no mar o mítico sonho de "fazer a América", que continua com o mesmo fervor, um século depois. Personagem e cinema visionários, padroeiros de causas perdidas, sem dúvida alguma. E mais um grande filme de Tornatore.


Avaliação:     

Filme: A Lenda do Pianista do Mar (The Legend of 1900)
Diretor: Giuseppe Tornatore
Produção: EUA, 1998
Com: Tim Roth, Pruitt Taylor Vince
Quando: a partir de hoje, nos cines Belas Artes, Jardim Sul 7 e circuito


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