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TEATRO
Dario Fo discute humanização
(Re) "Descoberta das Américas" chega a SP
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Pode haver boas intenções num
colonizador? O ator e dramaturgo
italiano Dario Fo responde com
algumas pistas em "A Descoberta
das Américas", texto que veio à
luz em 1992, justamente no quinto centenário do feito (e dito) do
genovês Cristovão Colombo.
A primeira montagem brasileira vem do Rio e estréia hoje no
Sesc Pinheiros. É um solo de Júlio
Adrião (Prêmio Shell 2005 de melhor ator), com direção de Alessandra Vannucci.
O autor -Nobel de Literatura
em 1997- faz com que um certo
malandro Johan drible a Inquisição, que já queimara sua mulher,
embarque de gaiato numa das caravelas de Colombo, sobreviva a
um naufrágio em que toda a tripulação desaparece e, ao cabo,
desperte numa ilha.
Lá, ele é preso, escravizado, mas
escapa de ser engolido pelos nativos antropófagos graças a "milagres", como prever o tempo. O
"zé ninguém" torna-se então o
"filho da lua". Aprende a língua
dos índios, catequiza-os e inverte
a liderança a seu favor.
Chega a organizar um exército
de libertação indígena para caçar
os espanhóis invasores.
Eis apenas a introdução dessa
aventura mirabolante. Há muito
mais peripécias na história que
Júlio Adrião conta aliando o verbo à partitura corporal.
"Johan sofre um processo de
humanização ao longo do espetáculo. Ele mesmo um estrangeiro,
depara com a imposição de quem
chega [os espanhóis], domina pela força, pela covardia, pela falta
de respeito, pela ignorância do
outro", diz Adrião, 45.
Passados cerca de 40 anos, o
náufrago sobrevivente teve chances de voltar à civilização, mas recuou. "Decide permanecer com
aqueles que o respeitavam de fato
e com quem aprendeu a amar
aquela terra", diz o ator.
A ação física é fundamental na
cena. Adrião pretende que o público assimile os códigos gestuais
a ponto de o narrador (ele mesmo) nem precisar falar mais. Basta cruzar os braços numa postura
que já se tem um índio.
Sob a luz suave mantida durante boa parte do espetáculo, sem
apoio de sonoplastia e metido
num figurino esfarrapado,
Adrião multiplica-se em vários
papéis, tempos e espaços. Na hora
da chuva, por exemplo, é o próprio quem "faz" a ventania, os
mastros da caravela, os animais.
O desafio é convencer a platéia a
embarcar por meio de um vocabulário mímico (imagens, gestos
e máscaras) e sonoro (palavras,
ruídos, onomatopéias). A commedia dell'arte e o teatro de rua
são linguagens cômicas basilares
na interpretação.
Ao lado da diretora Alessandra
Vannucci, Adrião protagonizou
vários experimentos cênicos desde 2000, mas a estréia só ocorreu
no ano passado.
"A Alessandra teve humildade
em não impor suas idéias e, sim,
lapidar o projeto no caminho que
tínhamos", diz o ator. Ambos já
cumpriram temporadas de estudos teatrais na Itália, daí a sintonia com o universo de Fo. Ao lado
do produtor Sidnei Cruz, eles
criaram a cia. Leões de Circo em
2002.
Sobre o processo de colonização, quer no Brasil ou alhures,
Dario Fo não deixa pedra sobre
pedra. "Seu texto é extremamente
irônico, ferino. Ele pega pesado
com os colonizadores, leva ao riso
e à reflexão", diz Adrião.
A Descoberta das Américas
Quando: estréia hoje, às 20h; sex., às
20h e sáb., às 19h; até 27/5
Onde: Sesc Pinheiros - auditório (r. Paes
Leme, 195, tel. 3095-9400)
Quanto: R$ 10
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