São Paulo, sábado, 28 de abril de 2007

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Crítica/"O Vulto das Torres"

Wright faz ótimo thriller envolvendo CIA, FBI e Al Qaeda

Obra revela como Bin Laden uniu fanáticos e mostra que americanos poderiam ter evitado o 11 de Setembro

CLAUDIA ANTUNES
EDITORA DE MUNDO

Dezenas de livros foram publicados sobre o 11 de Setembro. Poucos são tão valiosos quanto o esforço de reportagem de cinco anos que Lawrence Wright condensou em "O Vulto das Torres". Econômico em opiniões, Wright as torna dispensáveis ao compor um thriller sobre a gênese da guerra santa global de Bin Laden -e a forma desastrada com que o governo americano lidou com ela- que é mais revelador do que mil tratados sobre os momentos finais do século 20.
Se "O Vulto das Torres" cultiva uma idéia, esta é a de que "guerra ao terror", "guerra de civilizações" ou "guerra ao fascismo islâmico", os slogans que nos últimos anos deram forma ao combate aos jihadistas, só podiam fazer sentido na cabeça de ideólogos e estrategistas que nunca puderam ou quiseram escapar à lógica da Guerra Fria -baseada na dicotomia amigos/ inimigos e que implica retaliação maciça.
Pois Wright demonstra que os grupos que viriam a constituir a Al Qaeda nunca formaram um movimento de massas, apesar de terem torrado a fortuna do saudita Osama bin Laden e os milhões de dólares entregues a "combatentes da liberdade" no Afeganistão pelos Estados Unidos, o Paquistão e a Arábia Saudita. Antes do 11 de Setembro e do Iraque, esses grupos não reuniam mais do que poucos milhares de combatentes. Agora, viraram uma rede de franquias difícil de ser quantificada.

O herói americano
Não pode constituir surpresa o fato de que um punhado de homens fanatizados e determinados tenha sido capaz de provocar choque imenso com um ataque ao coração da nação mais poderosa do mundo -sempre foi esta a natureza do terrorismo. O que choca, ao acompanharmos o relato de Wright, é a demonstração de que os atentados às torres gêmeas e ao Pentágono poderiam de fato ter sido evitados.
A CIA sabia, pelo menos um ano e meio antes do 11 de Setembro, que enviados da Al Qaeda, ligados aos atentados contra as embaixadas americanas no Quênia e na Tanzânia, em 1998, estavam em território americano. Nunca passou esses dados ao FBI, a polícia federal.
Que as várias agências de espionagem americanas não conseguissem compartilhar informações é exasperante para o leitor, que a esta altura do livro torce por John O'Neill -o trágico agente do FBI que percebeu cedo a aproximação da Al Qaeda- como por um herói de romance de espionagem. O"Neill é o personagem-chave do lado americano.

Exército em delírio
Do outro lado, Wright começa a história pelo egípcio Sayyid Qutb, líder da Irmandade Muçulmana condenado à morte em 1966. Os escritos de Qutb inspiraram o médico Ayman Al-Zawahiri, que se tornaria o braço direito de Bin Laden. A crença desses homens tinha três pilares: o salafismo (o único islã verdadeiro era o praticado nos tempos de Maomé), o globalismo (só a restauração do califado pode livrar a comunidade islâmica do mal) e a idéia de que o muçulmano que negocia com os cruzados é apóstata, o que justifica sua morte. Juntos, esses pilares seduziam uma minoria mesmo entre grupos islamitas -a maioria com objetivos circunscritos a fronteiras nacionais.
Mas o grupo que os advogava foi potencializado pela experiência afegã. Quando o invasor soviético foi expulso, a vitória levou ao delírio o exército trôpego de Bin Laden, que mirou o mundo e teve a resposta que procurava.


O VULTO DAS TORRES
Autor:
Lawrence Wright
Tradução: Ivo Korytowski
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 56 (504 págs.)
Avaliação: ótimo


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