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ROMANCE
Frédéric Beigbeder escreve ficção inspirada no ataque ao WTC
"Windows on the World" acha humor no 11 de Setembro
JOCA REINERS TERRON
ESPECIAL PARA A FOLHA
Um "romance" sobre 11 de setembro de 2001? Será possível ter restado alguma matéria-prima ficcional possível sobre um
evento testemunhado via satélite
por quase todo cidadão do planeta? É o que Frédéric Beigbeder
procura responder em "Windows
on the World", livro premiado
com o Independent Foreign Fiction Prize. "A partir de 11 de setembro de 2001, a realidade não
apenas supera a ficção, como a
destrói. Não se pode escrever sobre o tema, mas tampouco se pode escrever sobre outra coisa", defende-se Beigbeder.
Assim o autor, nascido em
Neully-sur-Seine, intercala, em
movimentos pendulares, registros ensaísticos (onde reflete sobre a histórica relação de amor,
ódio e interdependência entre
França e Estados Unidos) com
narrações feitas por Carthew
Yorston, um corretor imobiliário
texano que convenceu os filhos
Jerry e David a cabularem aula para o café da manhã no Windows
on the World, restaurante no 107º
andar da torre norte do World
Trade Center.
Nos ensaios em tons de memorabilia, Beigbeder divaga, primeiro almoçando no Ciel de Paris, no
56º andar da torre de Montparnasse, depois indo ao nº 56 da
"rue" Jacob, endereço do palacete
de York onde Adams e Franklin
puseram fim à guerra de independência com os ingleses em 1783.
Sua conclusão é a de que, em termos históricos, a França está sempre dez anos atrasada em relação
aos EUA. Restam, portanto, dez
anos para a torre parisiense também ser atingida por um Boeing.
Porém a mecânica a mover a lógica trágica de Beigbeder não se
anima apenas a partir do niilismo
desmedido típico de certa prosa
francesa recente (é só ver o caso
de seus companheiros geracionais Pierre Mérot e Houellebecq).
Minuto a minuto (os capítulos do
livro iniciam-se às 8h30, seguindo
até 10h29 -o tempo médio de
uma produção hollywoodiana),
os argumentos de Beigbeder -o
escritor, sim, mas também Frédéric Beigbeder, dândi narcisista,
yuppie típico da "geração 68" (como ele denomina a geração que
viu a queda do Muro de Berlim
aos 20 anos de idade) e sujeito
transportador de um hedonismo
fracassado- liqüidificam os nacos de cultura de que é feito, atribuindo a responsabilidade pelo
estado de coisas iniciado com o
alvejamento do WTC por terroristas à sua geração.
E "mea culpa" também é a expiação praticada por Carthew
Yorston no topo da torre norte,
em meio ao aço retorcido, às labaredas, às pessoas calcinadas, tragando o cheiro de petróleo que escurece tudo, numa descrição à altura do inferno ocorrido nas torres gêmeas. O texano se culpa por
não ter convivido mais com os filhos, por ter trocado a mulher por
uma pin-up de anúncio de lingerie mas também por ter usado camisinha e trabalhado demais, se
divertido de menos e todas essas
lamúrias que passam pela cabeça
dos que estão prestes a morrer.
Novidade nenhuma num romance que começa com a frase: "Vocês conhecem o final: morre todo
mundo". O inusitado é que Beigbeder fez um livro informativo
sem deixar a literatura de lado e,
pasmem, muito engraçado.
Joca Reiners Terron é escritor, autor de
"Hotel Hell" (Livros do Mal) e "Curva de
Rio Sujo" (Planeta), entre outros
Windows on the World
Autor: Frédéric Beigbeder
Tradução: André Telles
Editora: Record
Quanto: R$ 39,90 (352 págs.)
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