São Paulo, sábado, 28 de maio de 2005

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ERUDITO

Um dos maiores músicos do mundo, o violinista israelense faz apresentação com o pianista singalês Rohan De Silva

Perlman traz seus "efeitos especiais" a SP

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

Boa notícia: o violinista israelense Itzhak Perlman, 59, apresenta-se no próximo dia 7 na Sala São Paulo. Má notícia: os ingressos já estão esgotados. Será o concerto beneficente organizado anualmente pela CIP (Congregação Israelita Paulista), com renda para projetos sociais.
Perlman se apresentará com o pianista singalês Rohan De Silva. No programa, sonatas de Mozart, Beethoven e Smetana. O violinista estará com seu Stradivarius Soil (pronuncia-se "chuá"), de 1714, instrumento que pertenceu a Yehúdi Menuhin.
Ele já se apresentou previamente no Brasil. É um músico excepcional porque, para ele, a técnica não é uma forma de exibicionismo ou algo que permite "efeitos especiais" de entretenimento. A técnica é um meio de expressão de outros conteúdos -psicológicos, espirituais- que só os grandes intérpretes sabem transmitir.
Nos últimos 20 anos o violino sofreu baixas dolorosas. Morreram Zino Francescatti, Arthur Grumiaux, Jascha Heifetz e Yehudi Menuhin, entre outros. Perlman, já de uma geração posterior, passou a integrar o grupo pouco numeroso dos mestres exemplares. Eis trechos de sua longa entrevista à Folha, feita por telefone, na semana passada, de Toronto.

Folha - O sr. é um músico amplamente conhecido. Alguma vez já tentou se apresentar sem que o público soubesse previamente que o sr. seria o intérprete, para assim testar a reação?
Itzhak Perlman -
Em verdade é algo em que eu penso com freqüência. Sei que sou conhecido do público e que ele tem confiança em mim, mas sei ao mesmo tempo que esse público é exigente. Ele sabe reconhecer se um músico tem realmente algo a dizer em termos de interpretação.

Folha - Sua carreira começou muito cedo, aos 8 ou 10 anos. Mesmo assim o sr. não considera ter sido uma criança prodígio. Por quê?
Perlman -
Eu me tornei um intérprete profissional com 18 ou 19 anos. Quando estava com 8 ou 10 eu era apenas uma criança talentosa. Naquela época eu tocava violino como uma criança dessa idade, e não como adulto. Não fui um intérprete prodigioso que, como criança, tem tudo de um músico bem mais maduro. Quando encontro crianças verdadeiramente prodigiosas eu me preocupo. Elas terão dificuldades para amadurecer, para se desenvolver.

Folha - Depois de tantos anos de estudos e récitas, o sr. ainda acredita ter algo a aprender?
Perlman -
Sempre! Há um processo de evolução na relação de um músico com as obras interpretadas. Passamos a ouvi-las sempre de um modo mais maduro e diferenciado. Em meu caso há também o fato de lecionar e de ser maestro. São atividades que implicam aprendizado. Devo procurar novas verbalizações para explicar aos meus alunos e músicos minha visão de determinada peça. Tenho regido grandes orquestras. Nelas os músicos são todos excelentes. Não precisam que eu diga o que é tocar bem. Mas preciso transmitir minha visão.

Folha - Hoje em dia o sr. se sente melhor regendo ou interpretando ao violino?
Perlman -
São atividades diferentes. Se sabemos aquilo que estamos fazendo nos sentimos sempre bem. O desconforto deve existir quando não se sabe aquilo que se faz. Sempre estudo e me esforço para saber aquilo que irei fazer.

Folha - Há 30 anos os violonistas promissores eram russos, israelenses ou judeus da Europa Oriental. Hoje eles são chineses ou japoneses. Por que essa mudança?
Perlman -
Não nos esqueçamos dos coreanos... Creio que há nesses países asiáticos uma cultura do desafio e do sucesso que passa também pela música. Os estudantes de conservatórios são estimulados pelo sucesso de seus compatriotas na Europa e EUA. As famílias os incentivam. Mas há nisso ciclos nítidos. Esse processo começou no Japão. Está hoje muito mais concentrado na Coréia. Dentro de dez anos é provável que o ciclo se concentre novamente em Israel e na Rússia. Não podemos prever. Depende da intensidade da "fome" pela música, da disciplina para o estudo.

Folha - Digamos que na intimidade de sua casa o sr. queira ouvir um concerto de Ernest Chausson. O sr. escolheria uma de suas próprias gravações ou ouviria Menuhin, Szeryng ou Stern?
Perlman -
De vez em quando eu ouço a mim mesmo para saber como eu interpretava no passado. Não que a interpretação fosse melhor ou pior. Mas ela hoje seria diferente. Com o amadurecimento, os pontos de vista mudam.

Folha - O Google indica que há 1.178 websites que o citam. Isso o incomoda ou o envaidece?
Perlman -
Céus! Tanto assim? Bem, eu não penso nisso. Jamais acharia que se trata de uma mensuração para qualquer critério. Não teria inveja de um colega que é citado por 2.340 sites do Google. Meu interesse é fazer a melhor música de que eu seja capaz.

Folha - Uma pergunta política: o sr. está otimista com o reinício de entendimentos entre israelenses e palestinos?
Perlman -
Sempre fui otimista. Sei que as coisas são difíceis e que nos últimos meses andam melhor. Tudo o que precisamos é de um longo período em que ninguém seja morto, o que desarmaria os espíritos para que os dois lados alcancem uma solução satisfatória. Se o terrorismo cessar poderemos andar juntos.

Folha - Se Daniel Barenboim o convidasse para interpretar ao lado dele em Ramallah [território palestino], o sr. aceitaria o convite ou acharia que é muito cedo?
Perlman -
Neste momento estou preocupado com o que ocorre em meu país. Quero ver de que maneira as coisas evoluem. Eu esperaria ainda um pouco para que o processo ganhe consistência na estrada da paz. A cooperação entre palestinos e israelenses sempre existiu. Mas devemos saber que objetivo alcançar primeiro.


Itzhak Perlman (violino) e Rohan de Silva (piano) Quando: dia 7, às 21h
Onde: Sala São Paulo (pça. Júlio Prestes, s/nš, SP, tel. 0/ xx/11/3337-5414)
Quanto: de R$ 50 a R$ 450 (esgotados)


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