Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ERUDITO
Um dos maiores músicos do mundo, o violinista israelense faz apresentação com o pianista singalês Rohan De Silva
Perlman traz seus "efeitos especiais" a SP
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
Boa notícia: o violinista israelense Itzhak Perlman, 59, apresenta-se no próximo dia 7 na Sala
São Paulo. Má notícia: os ingressos já estão esgotados. Será o concerto beneficente organizado
anualmente pela CIP (Congregação Israelita Paulista), com renda
para projetos sociais.
Perlman se apresentará com o
pianista singalês Rohan De Silva.
No programa, sonatas de Mozart,
Beethoven e Smetana. O violinista
estará com seu Stradivarius Soil
(pronuncia-se "chuá"), de 1714,
instrumento que pertenceu a Yehúdi Menuhin.
Ele já se apresentou previamente no Brasil. É um músico excepcional porque, para ele, a técnica
não é uma forma de exibicionismo ou algo que permite "efeitos
especiais" de entretenimento. A
técnica é um meio de expressão
de outros conteúdos -psicológicos, espirituais- que só os grandes intérpretes sabem transmitir.
Nos últimos 20 anos o violino
sofreu baixas dolorosas. Morreram Zino Francescatti, Arthur
Grumiaux, Jascha Heifetz e Yehudi Menuhin, entre outros. Perlman, já de uma geração posterior,
passou a integrar o grupo pouco
numeroso dos mestres exemplares. Eis trechos de sua longa entrevista à Folha, feita por telefone, na
semana passada, de Toronto.
Folha - O sr. é um músico amplamente conhecido. Alguma vez já
tentou se apresentar sem que o público soubesse previamente que o
sr. seria o intérprete, para assim
testar a reação?
Itzhak Perlman - Em verdade é
algo em que eu penso com freqüência. Sei que sou conhecido
do público e que ele tem confiança em mim, mas sei ao mesmo
tempo que esse público é exigente. Ele sabe reconhecer se um músico tem realmente algo a dizer
em termos de interpretação.
Folha - Sua carreira começou
muito cedo, aos 8 ou 10 anos. Mesmo assim o sr. não considera ter sido uma criança prodígio. Por quê?
Perlman - Eu me tornei um intérprete profissional com 18 ou 19
anos. Quando estava com 8 ou 10
eu era apenas uma criança talentosa. Naquela época eu tocava
violino como uma criança dessa
idade, e não como adulto. Não fui
um intérprete prodigioso que, como criança, tem tudo de um músico bem mais maduro. Quando
encontro crianças verdadeiramente prodigiosas eu me preocupo. Elas terão dificuldades para
amadurecer, para se desenvolver.
Folha - Depois de tantos anos de
estudos e récitas, o sr. ainda acredita ter algo a aprender?
Perlman - Sempre! Há um processo de evolução na relação de
um músico com as obras interpretadas. Passamos a ouvi-las
sempre de um modo mais maduro e diferenciado. Em meu caso
há também o fato de lecionar e de
ser maestro. São atividades que
implicam aprendizado. Devo
procurar novas verbalizações para explicar aos meus alunos e músicos minha visão de determinada
peça. Tenho regido grandes orquestras. Nelas os músicos são todos excelentes. Não precisam que
eu diga o que é tocar bem. Mas
preciso transmitir minha visão.
Folha - Hoje em dia o sr. se sente
melhor regendo ou interpretando
ao violino?
Perlman - São atividades diferentes. Se sabemos aquilo que estamos fazendo nos sentimos sempre bem. O desconforto deve existir quando não se sabe aquilo que
se faz. Sempre estudo e me esforço para saber aquilo que irei fazer.
Folha - Há 30 anos os violonistas
promissores eram russos, israelenses ou judeus da Europa Oriental.
Hoje eles são chineses ou japoneses. Por que essa mudança?
Perlman - Não nos esqueçamos
dos coreanos... Creio que há nesses países asiáticos uma cultura
do desafio e do sucesso que passa
também pela música. Os estudantes de conservatórios são estimulados pelo sucesso de seus compatriotas na Europa e EUA. As famílias os incentivam. Mas há nisso
ciclos nítidos. Esse processo começou no Japão. Está hoje muito
mais concentrado na Coréia.
Dentro de dez anos é provável que
o ciclo se concentre novamente
em Israel e na Rússia. Não podemos prever. Depende da intensidade da "fome" pela música, da
disciplina para o estudo.
Folha - Digamos que na intimidade de sua casa o sr. queira ouvir um
concerto de Ernest Chausson. O sr.
escolheria uma de suas próprias
gravações ou ouviria Menuhin,
Szeryng ou Stern?
Perlman - De vez em quando eu
ouço a mim mesmo para saber
como eu interpretava no passado.
Não que a interpretação fosse melhor ou pior. Mas ela hoje seria diferente. Com o amadurecimento,
os pontos de vista mudam.
Folha - O Google indica que há
1.178 websites que o citam. Isso o
incomoda ou o envaidece?
Perlman - Céus! Tanto assim?
Bem, eu não penso nisso. Jamais
acharia que se trata de uma mensuração para qualquer critério.
Não teria inveja de um colega que
é citado por 2.340 sites do Google.
Meu interesse é fazer a melhor
música de que eu seja capaz.
Folha - Uma pergunta política: o
sr. está otimista com o reinício de
entendimentos entre israelenses e
palestinos?
Perlman - Sempre fui otimista.
Sei que as coisas são difíceis e que
nos últimos meses andam melhor. Tudo o que precisamos é de
um longo período em que ninguém seja morto, o que desarmaria os espíritos para que os dois lados alcancem uma solução satisfatória. Se o terrorismo cessar poderemos andar juntos.
Folha - Se Daniel Barenboim o
convidasse para interpretar ao lado dele em Ramallah [território palestino], o sr. aceitaria o convite ou
acharia que é muito cedo?
Perlman - Neste momento estou
preocupado com o que ocorre em
meu país. Quero ver de que maneira as coisas evoluem. Eu esperaria ainda um pouco para que o
processo ganhe consistência na
estrada da paz. A cooperação entre palestinos e israelenses sempre
existiu. Mas devemos saber que
objetivo alcançar primeiro.
Itzhak Perlman (violino) e Rohan de Silva (piano)
Quando: dia 7, às 21h
Onde: Sala São Paulo (pça. Júlio Prestes, s/nš, SP, tel. 0/ xx/11/3337-5414)
Quanto: de R$ 50 a R$ 450 (esgotados)
Texto Anterior: Mil e uma noites Próximo Texto: Teatro: Autor esboça academia de dramaturgia Índice
|