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FERREIRA GULLAR
Papo brabo
Parece que se está formando um partido clandestino para dirigir a população carcerária
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- FALANDO FRANCAMENTE ,
parece que o que aconteceu recentemente em
São Paulo muda o panorama. Não
se pode mais falar de criminalidade
como se falava antes, não acha?
- Está se referindo à ação rápida
e coordenada dos bandidos?
- Sim, estou me referindo ao
PCC. Parece que se trata de um fenômeno novo no cenário social. É
verdade que ele existe desde 1993.
A polícia disse que o tinha desbaratado, mas os fatos mostram o contrário.
- Também estou espantado com
o que tenho lido nos jornais. Só
uma quadrilha bem organizada e
eficiente poderia provocar levantes
em 48 presídios, ataques a delegacias e residências de policiais, além
de metralhar bancos e queimar ônibus, e tudo isso ao mesmo tempo.
Houve, sem dúvida, uma ordem
que partiu de um comando central,
cuja decisão se obedece sem discutir.
- O PCC, se não me equivoco,
atua como uma organização paramilitar, composta de homicidas
cheios de ódio e revolta, decididos a
se vingar de seus opressores, ou seja, o aparelho repressor do Estado, e
assustar a sociedade. No estatuto, a
central de comando é intitulada de
Quartel-General.
- Segundo li na imprensa, deduzo que o PCC constitui a elite dos
criminosos que atuam disciplinadamente dentro e fora dos presídios. Não é qualquer um que pode
se tornar membro dele.
- Basta ler o seu estatuto. Lá está
escrito que os membros da organização que estejam em liberdade estão obrigados a ajudar os "irmãos"
que estão presos, do contrário "serão condenados à morte, sem perdão".
- Trata-se de uma entidade com
características muito especiais e estranhas. Ao mesmo tempo que o
comando garante seu poder pelo
terror, trata a todos como irmãos e
exige total solidariedade entre todos eles. Os criminosos referem-se
ao PCC como "partido", instituição
política, e não obstante se configura
também como uma seita religiosa.
-Sabe que, dentro das penitenciárias, os membros do PCC evitam
se envolver em brigas pessoais e estão proibidos de praticar violência
contra os companheiros de prisão,
como roubo, estupro, agressão? Devem dar exemplo aos demais presos
e, por isso, são respeitados e temidos.
- É, eles procuram demarcar o limite entre os bandidos e o resto da
sociedade, de modo a se definirem
como uma irmandade vítima da
violência carcerária e que, por isso,
deve responder a seus inimigos
com redobrada violência.
- Por isso mesmo são temidos,
não só pelos demais presos como
pelos agentes penitenciários. Um
desses agentes disse a um repórter
que, se algum deles tenta tomar um
celular de um desses bandidos, ouve a seguinte ameaça: "Vou mandar
matar tua família". Pelo sim, pelo
não, o agente penitenciário desiste.
- Mesmo porque ele sabe que a
organização atua também fora do
presídio.
- Essa dupla atuação, dentro e
fora do sistema carcerário -que ficou demonstrada nesses dias de
violência-, é uma das principais
forças do PCC.
- E a sua principal arma, talvez
mais até do que as armas de fogo, é
o telefone celular. Graças a ele, o comando dirige a organização de dentro das penitenciárias e a amplia incessantemente. Sem ele, a avalanche de violência que desabou sobre
São Paulo não teria ocorrido.
- O PCC alardeia que já está organizado em todo o Estado de São
Paulo e se organiza paulatinamente
em âmbito nacional.
- Isso ficou evidente quando a
sublevação se espalhou pelos presídios de São Paulo e de outros Estados.
- O telefone celular dispensa o
contato pessoal, viabiliza acordos e
compromissos entre cidades e Estados distantes, não importando se
os dirigentes das quadrilhas estão
livres ou presos.
- Desse modo, parece que está se
formando um partido clandestino
para dirigir toda a população carcerária do país.
- Um partido que defenderá o direito do bandido ser bandido.
- Se terá representação no Congresso, não sei. De qualquer modo,
representa um grave perigo para a
sociedade: o perigo de tornar a segurança do Estado brasileiro refém
de uma organização criminosa.
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