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CINEMA - "ATÉ QUE A VIDA NOS SEPARE"
Zaragoza filma sua própria classe média
ERIKA SALLUM
da Reportagem Local
"Até que a Vida nos Separe", filme de estréia do publicitário e pintor José Zaragoza que estréia hoje,
começa com tomadas de São Paulo
feitas de um helicóptero. Coincidentemente ou não, é do alto, de
cima, que se passará toda a ação,
centrada na vida de cinco amigos
de classe média alta às voltas com
problemas pessoais.
Em 110 minutos, desfilam na tela
belos apartamentos, restaurantes
requintados, roupas sofisticadas,
envergadas por um elenco estelar:
Julia Lemmertz, Alexandre Borges
(ambos de "Um Copo de Cólera",
de Aluizio Abranches), Marco Ricca, Murilo Benício, Betty Gofman.
O longa-metragem é o primeiro
de uma trilogia que o espanhol Zaragoza -o Z da agência de publicidade DPZ- pretende filmar.
Essa sua estréia, afirma ele, aborda a amizade do brasileiro, retratando a carência de um povo que
ainda não sabe lidar direito com a
solidão. Para isso, escolheu a classe
média "um pouquinho alta".
"Falo do brasileiro mesmo, que é
bom profissional, tem emprego,
mora bem, tem seu próprio carro,
mas não administra a solidão. Isso
é o que importa no filme."
"Paulistano" há 40 anos, o catalão Zaragoza conta que sempre foi
um cronista, um observador.
Quando chegou ao Brasil, se surpreendeu com a forma com que as
pessoas se tratavam.
"Se você não telefona, ligam cobrando, dizem que estão morrendo de saudades, mandam um "beijão". Solidão não é privilégio do
Brasil, mas aqui se fica mais insuportável que o resto do mundo
quando se está sozinho", ri.
O roteiro se concentra na relação
de cinco amigos. Bonitos, bem-sucedidos, escondem na intimidade
taras, homossexualismo, perversões, solidão. Pedro (Norton Nascimento), por exemplo, é um promissor funcionário de um editora.
Negro, só se realiza transando com
prostitutas loiras (entre as quais, a
global Danielle Winitz).
A cidade surge como um personagem a mais. É a São Paulo do
MAM (Museu de Arte Moderna),
do parque Ibirapuera, do elegante
bairro Jardins.
Organizado, para explicar qualquer coisa, Zaragoza desenha numa folha sulfite, assim como desenhou mais de 1.500 cenas para seu
storyboard, que será exibido em
uma exposição (leia texto ao lado).
Rabisca a lápis uma pirâmide social, sobre a qual escreve A, B, C.
Seu próximo filme, "A Pedrada",
acontecerá na classe A e falará sobre abuso sexual. Fechando a trilogia, "O Mutirão" abordará os menos favorecidos, da classe C, mostrando como se constrói uma cidade de um simples terreno baldio.
"Eu entendo isso aqui (aponta a
letra C) porque já fui pobre, não tinha nada. Para rodar "O Mutirão",
terei de morar num bairro desses
por um mês pelo menos, conhecer
o comportamento dessas pessoas."
Mas não é possível unir mais de
um segmento social num mesmo
longa-metragem? "É minha primeira experiência no cinema,
cheia de medos. Tinha de lidar
com coisas que eu pudesse realmente dominar..."
Enquanto isso, Zaragoza acompanha as pré-estréias de "Até que a
Vida nos Separe", orçado em R$ 4
milhões. Empolgado, afirma que
todos até agora adoraram o filme.
Mas o diretor está preparado para
receber críticas negativas?
"Totalmente. Estou botando a
cara para bater. Podem falar que
meu filme parece um comercial,
que sou publicitário, tudo bem. Fiz
o que acho que eu sabia."
Além de diretor, Zaragoza estréia
também como ator, num pequena
ponta em seu próprio filme. "Foi
idéia da equipe. Disseram que dá
sorte a quem está começando."
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