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Crítica/fotografia
Kossoy brilha em reflexões sobre a fotografia contemporânea
"Os Tempos da Fotografia - O Efêmero e o Perpétuo" reúne ensaios do professor
RUBENS FERNANDES JUNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA
O livro "Os Tempos da
Fotografia - O Efêmero e o Perpétuo" reúne
textos produzidos entre 1999 e
2004 veiculados em revistas
acadêmicas e publicações especializadas de circulação restrita
e encerra uma trilogia reflexiva-analítica do historiador e
pesquisador Boris Kossoy sobre a questão do tempo e da representação na fotografia.
Mais uma vez, o autor nos
brinda com um consistente
conjunto de ensaios que não só
discute o papel cultural da fotografia como propõe métodos de
decifração do seu conteúdo e
análise da percepção dos seus
diferentes tempos.
A cada ensaio, ele revela seu
profundo conhecimento sobre
a evolução histórica da linguagem e da técnica, bem como
deixa transparecer seu amplo
repertório teórico, inclusive
explicitando suas principais influências (Francastel, Marc
Bloch, Jacques Le Goff, Pierce,
Husserl, Panofsky, entre outros) e demonstrando sua paixão pela pesquisa e seu interesse pela compreensão da natureza da fotografia.
Boris Kossoy é pioneiro na
historiografia da fotografia brasileira e latino-americana, percurso iniciado há mais de três
décadas. Sua exigência metodológica e seu rigor científico
diante das informações que
disponibiliza tornaram-se referências para toda uma geração
de pesquisadores.
Essa sua marca registrada está presente nos textos reunidos
que apontam para uma metodologia de leitura sociocultural
da fotografia. Além disso, a discussão entre o tempo de criação (primeira realidade) -o
efêmero e exato instante do
acontecimento flagrado pelo
fotógrafo- e o tempo da representação (segunda realidade)
-o perpétuo decorrente da
existência do documento fotográfico- é sem dúvida uma
precisa e preciosa reflexão sobre os diferentes tempos presentes na imagem técnica, particularmente a fotográfica.
Erudição e clareza
Os ensaios, escritos com erudição e clareza, vão se articulando de tal forma que é notável
sua visão multidisciplinar da
fotografia, linguagem hoje presente como informação e documento em quase todas as áreas
de conhecimento científico,
mas que precisa ser melhor
compreendida e avaliada.
Apesar de ser potencialmente resultado de um processo de
construção de realidades, o que
significa construir um documento de ambigüidade intrínseca, é inadmissível não entender a fotografia como um componente essencial para a compreensão dos fenômenos contemporâneos, em suas dimensões culturais, estéticas e ideológicas. Ela é sempre o resultado de uma operação técnica,
permeada pela ideologia do fotógrafo e por tudo aquilo que
ele representa.
A fotografia, tanto no momento de sua elaboração quanto no momento de sua recepção, desencadeia os mais diversificados processos de cognição
e tem a mágica possibilidade de
nos transportar para diferentes
tempos e diferentes espaços,
além de nos conectar com outras realidades, criando fantásticas narrativas ficcionais e nos
(re)ligando a eventos de extraordinária singularidade.
De Magritte a Buñuel
Kossoy habilmente explicita
(e cita seus mestres ficcionais
como Magritte, De Chirico, Escher, Poe, Borges, Buñuel e Kubrick, entre outros) os mais diversos processos de construção
de realidades -inclusive a ficcional que se nutre da própria
credibilidade da fotografia enquanto documento- e aponta a
importância da natureza indiciária da fotografia, pistas que
ajudam-nos a desconstruir a
imagem e ensinam-nos a conviver com a eterna fragilidade da
informação fotográfica.
"Os Tempos..." permite ao
leitor construir uma trama
consistente de dados e valores
que se repetem e se fortalecem
continuamente, criando um
ferramental que permite uma
visão crítica sobre a história da
fotografia e sobre os métodos
de decifração do seu conteúdo.
Kossoy, mesmo admitindo a
fotomontagem e outras manifestações da linguagem que
acrescentam componentes ficcionais e outras verdades, centra sua abordagem numa fotografia específica, a documental,
resultado da ação entre o fotógrafo e o acontecimento, registro em nome de um compromisso ideológico com o momento histórico.
Sua metodologia de análise é
centrada na desmontagem dos
índices de informação para relevar a manipulação sempre
presente no ato comunicacional, seja ele qual for, inclusive
relevando a irresistível atração
germinada pelo livre jogo da
imaginação.
RUBENS FERNANDES JUNIOR é pesquisador e
crítico de fotografia e diretor da Faculdade de
Comunicação da Faap
OS TEMPOS DA FOTOGRAFIA -
O EFÊMERO E O PERPÉTUO
Autor: Boris Kossoy
Editora: Ateliê
Quanto: R$ 37 (176 págs.)
Avaliação: ótimo
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