São Paulo, sábado, 28 de julho de 2007

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Crítica/fotografia

Kossoy brilha em reflexões sobre a fotografia contemporânea

"Os Tempos da Fotografia - O Efêmero e o Perpétuo" reúne ensaios do professor

RUBENS FERNANDES JUNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA

O livro "Os Tempos da Fotografia - O Efêmero e o Perpétuo" reúne textos produzidos entre 1999 e 2004 veiculados em revistas acadêmicas e publicações especializadas de circulação restrita e encerra uma trilogia reflexiva-analítica do historiador e pesquisador Boris Kossoy sobre a questão do tempo e da representação na fotografia.
Mais uma vez, o autor nos brinda com um consistente conjunto de ensaios que não só discute o papel cultural da fotografia como propõe métodos de decifração do seu conteúdo e análise da percepção dos seus diferentes tempos.
A cada ensaio, ele revela seu profundo conhecimento sobre a evolução histórica da linguagem e da técnica, bem como deixa transparecer seu amplo repertório teórico, inclusive explicitando suas principais influências (Francastel, Marc Bloch, Jacques Le Goff, Pierce, Husserl, Panofsky, entre outros) e demonstrando sua paixão pela pesquisa e seu interesse pela compreensão da natureza da fotografia.
Boris Kossoy é pioneiro na historiografia da fotografia brasileira e latino-americana, percurso iniciado há mais de três décadas. Sua exigência metodológica e seu rigor científico diante das informações que disponibiliza tornaram-se referências para toda uma geração de pesquisadores.
Essa sua marca registrada está presente nos textos reunidos que apontam para uma metodologia de leitura sociocultural da fotografia. Além disso, a discussão entre o tempo de criação (primeira realidade) -o efêmero e exato instante do acontecimento flagrado pelo fotógrafo- e o tempo da representação (segunda realidade) -o perpétuo decorrente da existência do documento fotográfico- é sem dúvida uma precisa e preciosa reflexão sobre os diferentes tempos presentes na imagem técnica, particularmente a fotográfica.

Erudição e clareza
Os ensaios, escritos com erudição e clareza, vão se articulando de tal forma que é notável sua visão multidisciplinar da fotografia, linguagem hoje presente como informação e documento em quase todas as áreas de conhecimento científico, mas que precisa ser melhor compreendida e avaliada.
Apesar de ser potencialmente resultado de um processo de construção de realidades, o que significa construir um documento de ambigüidade intrínseca, é inadmissível não entender a fotografia como um componente essencial para a compreensão dos fenômenos contemporâneos, em suas dimensões culturais, estéticas e ideológicas. Ela é sempre o resultado de uma operação técnica, permeada pela ideologia do fotógrafo e por tudo aquilo que ele representa.
A fotografia, tanto no momento de sua elaboração quanto no momento de sua recepção, desencadeia os mais diversificados processos de cognição e tem a mágica possibilidade de nos transportar para diferentes tempos e diferentes espaços, além de nos conectar com outras realidades, criando fantásticas narrativas ficcionais e nos (re)ligando a eventos de extraordinária singularidade.

De Magritte a Buñuel
Kossoy habilmente explicita (e cita seus mestres ficcionais como Magritte, De Chirico, Escher, Poe, Borges, Buñuel e Kubrick, entre outros) os mais diversos processos de construção de realidades -inclusive a ficcional que se nutre da própria credibilidade da fotografia enquanto documento- e aponta a importância da natureza indiciária da fotografia, pistas que ajudam-nos a desconstruir a imagem e ensinam-nos a conviver com a eterna fragilidade da informação fotográfica.
"Os Tempos..." permite ao leitor construir uma trama consistente de dados e valores que se repetem e se fortalecem continuamente, criando um ferramental que permite uma visão crítica sobre a história da fotografia e sobre os métodos de decifração do seu conteúdo.
Kossoy, mesmo admitindo a fotomontagem e outras manifestações da linguagem que acrescentam componentes ficcionais e outras verdades, centra sua abordagem numa fotografia específica, a documental, resultado da ação entre o fotógrafo e o acontecimento, registro em nome de um compromisso ideológico com o momento histórico.
Sua metodologia de análise é centrada na desmontagem dos índices de informação para relevar a manipulação sempre presente no ato comunicacional, seja ele qual for, inclusive relevando a irresistível atração germinada pelo livre jogo da imaginação.


RUBENS FERNANDES JUNIOR é pesquisador e crítico de fotografia e diretor da Faculdade de Comunicação da Faap


OS TEMPOS DA FOTOGRAFIA - O EFÊMERO E O PERPÉTUO
Autor: Boris Kossoy
Editora: Ateliê
Quanto: R$ 37 (176 págs.)
Avaliação: ótimo



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