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ANÁLISE
Premiação importa onda roqueira retrô
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL
Marcelo D2 consagrou o
samba-rap no VMB, mas
não foi o grande vencedor da noite. Quem triunfou na versão 2003
da premiação da MTV foi o rock
cru e pesado, vitorioso em seis das
15 categorias. Dá o que pensar.
Significa a importação de tendência parecida do pop norte-americano atual, hoje dominado
por bandas como Strokes, Electric
Six, White Stripes, Yeah Yeah
Yeahs, Kings of Leon, Hives etc.
Lá a ascensão de bandas regressivas que miram o rock dos anos
70 faz todo sentido -é a versão
musical do agressivo conservadorismo da era Bush. No Brasil dito
progressista de Lula, o sentido é o
primeiro a ruir.
Daí o contraponto estabelecido
pelos artistas de periferia que subiram ao palco -os rappers de
gueto do RZO e o papa internacional do drum'n'bass Patife. Seus
discursos desconexos, de uma carência quase desesperada, clamavam nas entrelinhas: esqueçam a
América, olhem para nós.
Era a tensão social subindo ao
púlpito do VMB -e se espalhando pela festa esnobe de depois da
arrastada cerimônia. Ali, os felizardos portadores de convite se
dividiam entre os mais, que ficavam emparedados na sala VIP, e
os menos, que se aglomeravam
no portal numa versão "chique"
de acampamento de sem-terra.
A metáfora era a incomunicabilidade amedrontada em que se
meteram em 2003 as elites do pop
e da MTV. Caetano Veloso, apresentando show com barba postiça
tipo Los Hermanos, podia ser o
Lula daquele tenso ambiente.
O constrangimento de comunicação se materializou de vez na
entrega do prêmio de melhor clipe de MPB. Marina Lima, Daniela
Mercury e Paula Toller bateram
cabeça no texto mal decorado e fizeram propaganda dos discos que
lançaram pela MTV.
Então anunciaram o prêmio de
MPB para um Gilberto Gil que
cantava em inglês um reggae jamaicano. O ministro apareceu no
telão, anunciando que sua filha
Preta Gil ia receber a estatueta por
ele. Bem quando Preta está se lançando como cantora.
Enquanto ali cada um falava
uma língua e ninguém ouvia ninguém, uma bandeira do Brasil foi
parar no palco do Charlie Brown
Jr., que era o favorito disparado
da audiência, tocava rock pauleira
acústico e protagonizava anúncio
de Coca-Cola nos intervalos.
Sede não era nada, imagem era
tudo. E o Brasil, no VMB, se confinava aos discursos desamparados
dos rappers e à fala represada (em
inglês) de Daniela Mercury.
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