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RACISMO
Antropóloga Solange Martins de Lima diz que esse tratamento reflete a forma com que a sociedade os trata
Novelas reforçam preconceito à brasileira
CÉLIA DE GOUVÊA FRANCO
da Reportagem Local
O modo como as novelas brasileiras tratam os personagens negros reflete a forma com que a sociedade os trata, com um "preconceito à brasileira".
É um preconceito sutil, disfarçado, com vergonha de ser preconceito. E que se traduz, por exemplo, no desaparecimento de personagens negros no decorrer de
uma novela ou na criação de papéis interpretados por atores negros soltos na trama, sem base familiar, sem uma história.
Ao expressarem conceitos preconceituosos de modo tortuoso,
as novelas acabam reforçando o
preconceito da sociedade.
Nos últimos 20 anos, houve
muitas mudanças na forma como
são tratados os personagens negros. Agora, existem famílias negras de classe média nas novelas,
mas a maioria dos avanços foram
seguidos de um passo para trás.
Essas são as principais conclusões de uma pesquisa sobre os negros nas novelas que está sendo finalizada pela antropóloga Solange
Martins Couceiro de Lima, professora da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP (Universidade de São Paulo).
Ela e uma equipe de pesquisadores analisaram cerca de 25 novelas
da Rede Globo, que foram ao ar às
19h e às 20h, de 1975 até hoje.
Como o número de novelas
transmitidas por todos os canais
de TV nesse período foi muito
grande, acabou se escolhendo
apenas as da Globo, que foram habitualmente líderes de audiência.
Também foram excluídas as novelas que tratavam de temas ligados à escravatura, que obviamente
dão um tratamento muito específico aos personagens negros. Além
disso, Solange fez entrevistas com
alguns autores e atores de novelas.
Solange não acha que é papel da
novela mudar a sociedade -o
máximo que consegue é mudar e
criar modas. Mas, em sua opinião,
as telenovelas reforçam a imagem
desfavorável dos negros inclusive
entre os próprios negros.
Não seria de exclusiva responsabilidade dos autores essa situação,
segundo Solange -exatamente
por ser sutil, o preconceito às vezes se manifesta mesmo quando a
intenção é tentar mostrar que não
existe preconceito.
Autor de novelas como "Fera
Ferida" e de seriados como
"Tenda dos Milagres", com
grande participação dos negros e
ele mesmo mulato -ou negro,
como prefere se classificar-,
Aguinaldo Silva diz que o preconceito revelado nas novelas reproduz o preconceito dos brasileiros.
"Acho que o problema é mais
amplo do que colocar a culpa do
preconceito na TV ou nas novelas.
Quantos negros ocupam cargos de
direção nos jornais ou nas universidades, por exemplo? As novelas,
a literatura reflete o preconceito
que existe na sociedade", afirma.
Ele acha que muitas vezes o autor das novelas acaba criando um
personagem negro ocupando um
cargo importante na comunidade
retratada, mas se torna artificial
porque na realidade são poucos os
profissionais liberais negros.
O público, de qualquer forma,
reverencia esses personagens por
reconhecer o "código" das novelas: o autor quer mostrar que não
se deve ter preconceito.
Outra razão para a dificuldade
em se criar papéis importantes para negros seria a escassez de bons
atores negros, "realmente preparados", afirma Silva. Quando ele
encontra um ator que o encanta,
procura valorizá-lo.
Escrevendo a próxima novela
das oito, ainda sem título, ele
criou um papel de destaque, "eixo da história", para a atriz Isabel
Fillardis, cuja personagem na novela "A Indomada" acabou desaparecendo rapidamente da trama.
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