São Paulo, quinta-feira, 28 de setembro de 2006

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NINA HORTA

A comilança de outrora

Dizem que foi o tutano que nos tirou da posição de animais irracionais. De tanto chupar ossos, o cérebro ficou esperto

CONTINUO a falar sobre os novos puritanos americanos, aqueles que não querem comida industrializada e tentam reverter a comilança para dias de antanho, quando o gado comia capim e a galinha ciscava. Não estão sozinhos, não pensam que tudo vai mudar de um dia para o outro, mas fazem lobby e se arriscam contra grandes empresas alimentícias. Comparam os grandes conglomerados de alimentação a nações, pois as receitas da Nestlé, da Altria, são iguais ao Produto Interno Bruto (PIB) dos Emirados Unidos Árabes e Nigéria.
Como já comentamos, segundo eles, temos que comer a carne dos bois, beber o leite das vacas... que pastam! Chegamos a imaginar, numa humilde contribuição, os parques dos condomínios transformados em pomares, galinha soltas, goiabeiras. As crianças adoram subir em goiabeiras, feitas de propósito para elas, galhos espaçados, limpos, abertos, a goiaba temporã, tacheada de pretinho, fazendo a boca franzir na sua acidez. E as ameixeiras? Repararam como as ameixeiras nascidas por acaso na cidade estão todas carregadas de frutas e que as pitangas chegaram?
E o galo cantando vitorioso? E a procura dos ninhos, dos ovos, os pintinhos? Tudo muito mais interessante e pedagógico que o chão de ladrilhos e cimento e os brinquedos incrivelmente sem graça.
Continuando com as gorduras, dizem eles que foi o tutano que nos tirou da posição de animais irracionais. De tanto chupar os ossinhos, nosso cérebro foi ficando esperto. Distanciamos-nos dos que comiam só folhas. Vamos a uma receita rápida de tutano: 12 pedaços de osso de vitela com tutano (8 cm). Para uma saladinha: um maço grande de salsa bem fresca, finamente picada, duas cebolas pequenas, em finas rodelas, um punhado de alcaparras de ótima qualidade, suco de limão e sal marinho, azeite extravirgem. Ponha os ossos numa fôrma e deixe por cerca de 20 minutos no forno. Sirva imediatamente os ossos, retire o tutano, vá passando em torradas e comendo com a salada de salsa temperada na hora. Bom!
E peixes? O que dizem dos peixes?
O Homo habilis tinha instrumentos para pescar, como arpões e redes, e era onívoro. Sortudo aquele que vivia perto do mar com um estoque de gordura ômega 3 ao seu dispor, essencial para as funções hormonais, visuais, mentais, metabólicas. É essa gordura que previne as doenças modernas, como obesidade, diabetes e doenças do coração, regula os níveis de açúcar no sangue e a queima de gorduras. E adivinhem qual é a comida-remédio para os deprimidos? Adivinhem. Sardinha e óleo de fígado de bacalhau.
Mas a má notícia é que os peixes criados em cativeiro são vítimas de parasitas, pesticidas, antibióticos, excesso de excrementos, danos ambientais e, além de tudo, são menos gostosos e menos nutritivos. E esses peixes criados por nós precisam comer. E comem o quê? Os peixes chamados de segunda, como as sardinhas e o arenque, básicos para os países em desenvolvimento.
(Os peixes que podemos criar são os herbívoros. Por exemplo: a tilápia, a carpa, moluscos e ostras. Moluscos e ostras são peixes? Hum, não, frutos do mar.)
Então, devemos comer peixe, e pode ser gordo, de duas a três vezes por semana. E podemos fritá-los em azeite de oliva extravirgem. As gorduras saturadas aumentam o estoque corporal de ômega 3. Por isso, o conselho é: coma lagosta e linguado com bastante molho de manteiga. E a boa notícia (se os salmões não comerem todas as nossas sardinhas) é que elas têm 500% mais de boas gorduras do que o atum, por exemplo. É um peixinho extremamente interessante para nós. Frito...
E peixe cru? Claro, os japoneses comem sashimi, os espanhóis, ceviche, os escandinavos, gravlax.
E esta não foi a última, virá outra logo depois...


ninahorta@uol.com.br

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