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Ligações perigosas
Inspirado em Nelson Rodrigues, Silvio de Abreu cria um emaranhado de relações familiares em "Passione"
LAURA MATTOS
DE SÃO PAULO
Bete amava Olavo, que é
pai de Jéssica, que ama Berilo, que ama Agostina, que é
filha de Totó. Totó é pai de
Agnello, que amava Lorena,
que é filha de Stela, que ama
Agnello e é viúva do irmão de
Totó, Saulo. Saulo foi morto e
não ama mais ninguém.
É preciso ler o parágrafo
acima com muita calma para
tentar entender um pouco as
relações cada vez mais emaranhadas de "Passione".
Em capítulos recentes, namorados se descobriram primos e foram parar em um especialista, que os alertou para os riscos de terem um filho
com doenças genéticas.
Antes, a moça, Fátima
(Bianca Bin), havia feito um
aborto de Danilo (Cauã Reymond), irmão do atual namorado e seu primo também.
Duas mulheres (Agostina/Leandra Leal e Jéssica/
Gabriela Duarte), casadas
com o mesmo homem (Berilo/Bruno Gagliasso), descobriram ser tia e sobrinha.
Logo, os filhos das duas
são, além de meio-irmãos,
primos de segundo grau. E é
melhor parar por aqui ou essa página vai ser pouco para
listar os complexos parentescos.
Silvio de Abreu leva o antigo clichê folhetinesco de revelar um parentesco inesperado às penúltimas consequências -as últimas consequências seriam o incesto,
grande tabu nas novelas.
"Romances e relacionamentos complicados fazem
parte do meu estilo", diz o
autor. "Ter os personagens
muito próximos uns dos outros cria um clima de intimidade melhor para a história,
além de ter um lado proibido,
transgressor, que é fascinante tanto para quem escreve
como para quem assiste."
Abreu tempera a salada familiar com crimes (em "Passione", dois já morreram e
outros estão no alvo), inspirado em Agatha Christie.
Para esta novela, conta
também ter sido influenciado por Tennessee Williams,
Eugene O'Neal, Anton Tchekhov e Nelson Rodrigues.
"Esses são os que melhor
escrevem sobre relações familiares", opina Abreu.
Autor de "Anjo Pornográfico", biografia de Nelson Rodrigues, Ruy Castro lembra
que uma de suas peças, "Álbum de Família" (1945), "que
era um festival de incesto, ficou 22 anos proibida".
As famílias de "Passione"
são, como em Nelson Rodrigues, para lá de complicadas, com traição entre pais e
filhos e avó cafetina de neta.
O novelista diz não querer
retratar a realidade, nem ter
em sua própria família alguma inspiração. "Prefiro a ficção, onde tudo é possível."
Ele conta que na sinopse
da novela todos os parentescos estavam definidos.
"Improviso muito pouco
ao longo da trama no que se
refere às ligações entre os
personagens. Sei exatamente quem é quem e suas relações de parentesco e, curiosamente, não tenho nada escrito ou pregado na parede
para me orientar", afirma.
Diferentemente do público, ele jura que, "graças a
Deus", nunca se confunde
com as relações. Nos últimos
capítulos, tem colocado diálogos explicativos de parentescos, como o de Gerson
(Marcello Antony) com Sinval (Kayky Brito): "Sou seu
tio e futuro sogro" -Gerson,
aliás, deve revelar no capítulo de amanhã o que de tão secreto faz no computador.
FALTA DE ATOR?
Abreu nega que todo mundo seja parente em "Passione" porque a Globo hoje teria
menos atores, com a concorrência da teledramaturgia da
Record. "A minha novela tem
menos personagens porque
gosto de trabalhar assim."
"Passione" tem 49 personagens. Já sua antecessora,
"Viver a Vida", da Manoel
Carlos, que prefere elencos
maiores, contava com 74.
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