São Paulo, quinta-feira, 28 de dezembro de 2006

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Ele achou a batida perfeita

Um dos maiores sucessos de James Brown, "Funky Drummer", de 1969, é uma das músicas mais sampleadas do mundo

THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL

Desde a última segunda, James Brown não está mais aqui para sapatear, rodopiar e pedir "one more time", mas ele deixou para trás, entre inúmeros clássicos, uma das duas canções mais influentes do pop.
"Tomorrow Never Knows", dos Beatles, que encerra "Revolver" (1966), e "Funky Drummer", gravada por Brown em 1969, são as faixas que mais deixaram rastros na música jovem contemporânea -motivaram novas idéias, abriram caminhos e estão incrustadas no que vem sendo produzido até hoje.
"É a música que está no subconsciente do pop", diz DJ Hum sobre "Funky Drummer". Não é exagero. Não há como apontar com precisão, mas, se não for a primeira, "Funky Drummer" está entre as três canções mais sampleadas da história. Praticamente todo rapper já utilizou pedaços de sua batidas; até artistas díspares como Prince, New Order, Sinnead O'Connor, Depeche Mode e 808 State têm músicas que incorporam elementos da criação de James Brown (veja quadro nesta página).
"Se não fosse "Funk Drummer", não existiria drum'n'bass e breakbeat. Essa é que é a verdade", afirma o DJ Marky.
(Dá para dizer que "Funky Drummer" é a mãe do d'n'b -o pai é "Amen, Brother", música gravada pelos Winstons.)
Apesar de sua importância, a canção nunca foi colocada em disco -Brown preferiu lançá-la em formato single em 1970. Em 1986, ela apareceu na coletânea "In the Jungle".
Mas o que "Funky Drummer" tem de tão especial?
"Ela tem um "break" no meio, a quebrada, em que abre-se espaço para a bateria. Essa quebrada foi sampleada milhões de vezes. É a principal batida dos anos 90", explica Hum.
"Além disso, há o timbre e o desenho da música, sua estrutura. Antes dessa canção, não investia-se em batidas quebradas, as músicas eram mantidas numa melodia linear. Com "Funky Drummer", o ritmo tornou-se o mais importante."
É o que todo mundo conhece por groove.
"A bateria é incrível", diz Marky. "Ninguém fazia aquele break. Nunca vi um baterista tocar daquele jeito, nem computador consegue fazer. É o maior clássico dele, pena que muitas pessoas não saibam."

Semi-instrumental
"Funky Drummer" é semi-instrumental -semi porque não há letra, mas intervenções vocais de James Brown.
No meio da música, Brown ordena que todos os instrumentos parem, fica apenas a bateria tocada por Clyde Stubblefield. Não é um solo de bateria -Brown instrui o baterista a seguir a linha das batidas.
Hoje, soa simples. Na virada dos 60 para os 70, era como a descoberta da roda.
"Ele era um cantor de blues que teve a idéia de colocar beat por trás", afirma Ed Motta. "As melodias são todas de blues, com aqueles gritos que depois influenciaram até os vocalistas de heavy metal. Ninguém dava gritos daquela maneira."
A importância de James Brown para o pop é enorme por causa de "Funky Drummer", mas não fica apenas nisso.
"Ele criou a história de tocar no primeiro tempo. Ninguém fazia aquilo, colocar o baixo na frente, a bateria em primeiro plano. Hoje isso é normal", aponta Hum. "Muitas vezes, a guitarra do Brown está em loop, com o mesmo acorde em repetição. Era um sample antes do sample existir."
Para Motta, Brown teve um retorno nos 80. ""Sledgehammer", do Peter Gabriel, por exemplo, utiliza os fundamentos do James Brown. E até mesmo a atitude "sex symbol" dele."


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