São Paulo, segunda, 28 de dezembro de 1998

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NY passa réveillon com arte

Mostra do judeu Ben Shahn é atração na cidade, que convidou ainda Pollock, Bacon, Man Ray e outros para o fim de ano
Reprodução
"Primavera", trabalho de Ben Shahn exposto no The Jewish Museum, que faz parte da temporada de artes de NY


CELSO FIORAVANTE
em Nova York

Quem decidir passar esta última semana do ano em NY pode preparar os olhos e as pernas para uma série de boas mostras que a cidade oferece .
Um dos destaques é a retrospectiva de Ben Shahn, um lituano que nadou contra as tendências abstratas que vigoravam nos EUA na metade do século e produziu uma obra estética, ética e moral.
Ben Shahn (1898-1969) era um artista judeu, pintava telas com motivos da tradição judaica e agora ganha importante retrospectiva no The Jewish Museum.
Tanta especificidade, porém, não reduz o interesse por sua obra, que, vez ou outra, reaparece, como agora na comemoração de seu centenário de nascimento.
Ben Shahn utilizou uma experiência pessoal e circunscrita -a sua herança cultural judaica- para discutir questões universais, como violência, injustiça e desigualdades sociais.
Também não se ateve apenas a questões de ordem ética, e produziu, em quatro décadas (a partir dos anos 30), uma obra com características estéticas particulares, com um peculiar interesse pelos campos cromáticos e por paisagens e formas insólitas.
Ben Shahn viveu um constante dilema entre a fé em Deus e a razão dos homens. Isso se evidencia em trabalhos como "Helix e Crystal" (foto nesta página), que apresenta um homem em posição de oração e debruçado sobre uma pilha de cristais (uma representação para a ciência). De seus olhos cerrados, sai ainda uma constelação de átomos (apesar de amante da física e de físicos, como Einstein, Shahn se preocupava muito com os efeitos de uma guerra nuclear).
Absolutamente figurativo, o artista foi na contracorrente daquilo que predominava na época, o expressionismo abstrato (movimento capitaneado Jackson Pollock, Mark Rothko e Willem de Kooning).
Judeu lituano radicado nos EUA a partir de 1906, Shahn manifestou-se contra injustiças políticas, como o julgamento e condenação à morte dos anarquistas italianos Sacco e Vanzetti ("A Paixão de Sacco e Vanzetti", série de trabalhos de 1931 e 1932), e sociais da época, como as condições miseráveis em que os trabalhadores viviam durante a Depressão norte-americana (crise econômica posterior ao crash da bolsa de Nova York em 1929).
A influência exercida pelos movimentos trabalhistas e lutas por reformas sociais nos anos 20 e 30 originou um movimento pictórico conhecido como realismo social, do qual Shahn foi adepto.
Também indignou-se com os horrores do Holocausto e da Segunda Guerra e retratou a destruição em telas metafísicas, como "Paisagem Italiana" (1943/1944) e "Liberação" (1945).
Mas não foram apenas os movimentos sociais que o influenciaram. Nos anos 20, viajou com a mulher para a Europa, onde entrou em contato com algumas de suas maiores influências, como o impressionismo francês, o figurativismo de Balthus (em que várias cenas se desenvolvem no mesmo espaço, mas sem relação entre elas), os flertes surrealistas de Paul Klee (como na obra "Composição com Clarinetes e Corneta", foto nesta página) e a pintura metafísica de De Chirico e Magritte.
²

Mostra: Common Man Mythic Vision - The Paintings of Ben Shahn Onde: The Jewish Museum (1.109, 5ª avenida, tel. 00 1 212 423-3200, Nova York) Quando: até 7 de março


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