São Paulo, sábado, 29 de janeiro de 2011

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Retorno à francesa

Deixados de lado nas últimas décadas, contemporâneos franceses voltam a ser publicados no Brasil

ANA PAULA SOUSA
DE SÃO PAULO

De acordo com a Câmara Brasileira do Livro (CBL), foram editados, em 2007, 391 títulos de origem francesa no Brasil. No ano seguinte, esse número quase dobrou: 748.
Apesar de ínfimo quando comparado aos títulos de língua inglesa -3,7 mil em 2009-, esse número sinaliza uma mudança de prumo.
Ao contrário do que aconteceu nas décadas de 1980 e 1990, nove entre os dez laureados com os últimos Goncourt, o prêmio mais importante da França, têm pelo menos um livro editado aqui.
Mudaram os franceses ou mudou o mercado brasileiro?
"Os franceses começaram a se desvencilhar da mania intimista das décadas de 80 e 90. Parece que o período do umbigo passou", reponde a crítica Leyla Perrone-Moisés.
Para o editor Marcelo Ferroni, da Alfaguara, que tem franceses de peso no catálogo, como Jonathan Littel, Emmanuel Carrère, Jean Echenoz e Claudie Galley, o movimento se deve, também, à concorrência entre as editoras, que tiveram de explorar terras menos tomadas que as de língua inglesa.

A QUEDA
Para que se compreenda o retorno é importante que se saiba, também, que houve um movimento de partida.
Se até o início do século 20 a influência no mercado do livro no Brasil era, sobretudo, francesa, após a Segunda Guerra o mundo ganhou novos contornos e também o enredo literário mudou.
Década após década, a força da língua inglesa foi crescendo. Avançou ao ponto de, atualmente, representar pelo menos 70% dos traduções.
Enquanto crescia a língua inglesa, caminho oposto fazia a francesa que, não fosse a "virada" de 2008, ficaria de uma vez por todas para trás do espanhol.
Se não há brasileiro minimamente interessado em literatura contemporânea que não tenha ouvido falar de Ian McEwan, Paul Auster, Philip Roth ou J.M. Coetzee, o mesmo não se pode dizer de franceses tão premiados e bem aceitos pelos leitores quanto eles, como Jonathan Littell, Michel Houellebcq, Marie NDiaye ou Martin Page.
"Houve uma grande queda de interesse pela literatura francesa a partir de meados do século 20", diz Perrone. "Muita gente se perguntou por que, depois de tantos grandes nomes, a literatura francesa teria decaído. O que aconteceu aqui reflete um fenômeno mais amplo."

A REAÇÃO
O primeiro pontapé para que os franceses voltassem foi dado no Ano do Brasil na França, em 2005, quando vários editores foram convidados a visitar o país.
Mas há, claro, as razões específicas. No caso da Alfaguara, a onda francesa remonta ao momento em que o grupo Santillana comprou parte da Objetiva. O grupo, que até então só tinha um scout (profissionais que agenciam autores) de língua inglesa, passou a contar também com um para o francês.
"Houve isso, mas houve também uma mudança nos próprios autores, que começaram a abandonar aquele estilo mais verborrágico e frio", diz Ferroni, indo ao encontro da crítica Perrone.
Avaliação semelhante faz Cassiano Elek Machado, diretor editorial da Cosac Naify, que publica o Nobel Le Clézio e autores como Gregoire Bouillier e Olivier Rolin.
"Acho que eles têm feito um movimento claro de ser menos franceses, e passaram a interessar mais aos estrangeiros", diz Machado.
Trata-se, ainda assim, de uma volta discreta. "É difícil até mesmo fazer com que as livrarias se interessem", pondera Angel Bojadsen, da Estação Liberdade, pródiga nos conterrâneos de Proust.


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