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HISTÓRIA/"SANGUE & UÍSQUE"
Jack Daniel precisou enfrentar os puritanos
Obra narra a trajetória do inventor do uísque do Tennessee
OSCAR PILAGALLO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Lynchburg, no Tennessee,
devia exigir de seus pioneiros
uma boa talagada para tornar a
existência suportável. Era um
tempo difícil, aquele do início do
século 19, quando a lei era pura
ficção nos Estados Unidos. O próprio nome da cidade entrega o
ambiente então reinante:
Lynchburg vem de "linchar", prática a que os cidadãos recorriam
na falta da justiça formal.
É nesse sul profundo de um país
ainda embrionário que vai se fixar
a família de Jack Daniel (1849-1911), o descendente de escoceses
e irlandeses que supriria a demanda etílica daqueles homens
rústicos ao produzir o uísque que
daria fama à região. Em "Sangue
& Uísque", Peter Krass traça um
perfil do destilador que emprestou seu nome à garrafa que até
hoje é sinônimo do uísque do
Tennessee.
Atenção para não confundir
com "bourbon", assim batizado
por ser original de Bourbon
County, em Kentucky. São bebidas aparentadas, ambas produzidas a partir do milho, mas cada
qual com suas características. Por
conta de diferenças no processo
de filtragem, entre outras, o
"bourbon" tem um suave buquê
de baunilha, enquanto o uísque
do Tennessee apresenta certo aroma defumado. As classificações
só seriam oficialmente reconhecidas em 1941.
Ainda adolescente, Jack Daniel
começou a fabricar uísque.
Aprendeu o ofício na destilaria de
um amigo da família, Dan Call,
que o acolheu como filho depois
que o pai viúvo morreu em 1864,
durante a Guerra Civil. O Tennessee era um dos Estados confederados contra a União, e seus habitantes pagaram um preço alto pela opção. Com a economia destruída pelo conflito, os Estados separatistas foram obrigados a pagar mais impostos para cobrir os
custos da guerra.
A crise veio junto com a oportunidade. Com muitos destiladores
arrasados, era o momento de entrar de vez no ramo. Foi o que
Dan Call fez. Luterano, entretanto, acabou se afastando do negócio por pressão da comunidade
conservadora. Foi aí que Jack, já
então seu sócio, pôde imprimir a
marca pessoal à destilaria.
No auge da vida, gostava de
contemplar o pôr-do-sol do alpendre de sua mansão saboreando uma dose de uísque, que ele tomava com pedras de gelo e um
pequeno torrão de açúcar no copo, além de uma pitada de tanaceto, uma erva aromática.
A tranqüilidade seria passageira. A Lei Seca, que proibiu a venda
de bebida alcoólica nos EUA por
mais de dez anos, não lhe dava
trégua muito antes de entrar em
vigor, em 1919. Certo dia, em 1906,
descontrolado em parte pela
amolação que lhe causava a militância puritana, Jack chutou o cofre da empresa que não queria
abrir. Feriu o pé esquerdo, o que
provocaria a amputação da perna
anos mais tarde. Solteiro e sem filhos, Jack legou a destilaria aos sobrinhos anos antes de morrer, em
1911.
É uma boa história, que no entanto Krass desperdiça por falta
de fluência.
Oscar Pilagallo é editor das revistas
"EntreLivros" e "História Viva" e autor de
"A História do Brasil no Século 20" (em
cinco volumes, pela Publifolha)
Sangue & Uísque - A Vida e a Época de Jack Daniel
Autor: Peter Krass
Tradução: Marcos Santarrita
Editora: Imago
Quanto: R$ 50 (284 págs.)
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