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Comida
Muito além de cereal
Iogurte escapa do café da manhã e aparece no jantar paulistano, da Augusta ao Itaim Bibi, em pratos como o indiano roghan gosht e o ayran de hortelã
MAURÍCIO HORTA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Às margens do deserto de
Thar, na Índia, ele é lassi açucarado e espesso, decorado com
estigmas de açafrão. Já nas lanchonetes de Teerã e de Istambul, é ayran ralo e salgado, que
acompanha o sanduíche de carneiro -o mesmo kebab com
molho de iogurte vendido em
biroscas de rivais gregos e turcos em São Petersburgo,
Frankfurt ou Londres.
Em sua travessia pela Eurásia e pelo Atlântico, o iogurte
conviveu com o carneiro, as saladas e as frutas vermelhas até,
no Brasil, transformar-se em
promessa de intestino regulado
-"Se não funcionar, a Danone
devolve seu dinheiro". Agora,
ganha o espaço merecido nas
mesas de São Paulo.
Não que falte mérito no discurso de saúde. Segundo a nutricionista do Hospital do Coração Isabela Pimentel, o iogurte é melhor que o leite para
quem tem intolerância à lactose, pois já vem em parte digerido por bactérias. Também diminui as calorias ao substituir o
creme de leite ou a maionese.
Mas foi o olhar paulistano para
o Oriente que levou o iogurte
da geladeira para a panela.
Para todos
Desde o fim de janeiro, as paredes de vidro -e os jovens garçons com camisetas estampadas "Just Do E.A.T"- convidam os modernos do Itaim Bibi
à cozinha leve e eclética do e.a.t.
Casual Food. No cardápio, o iogurte aparece no multicultural
cuscuz marroquino de frango
ao garam masala, do chef Fernando Corsi.
Mas, desde o ano passado no
Kebab Salonu, Rodrigo Libbos
já conduzia os modernos da
Augusta pelos mundos gastronômicos árabe, hebraico, balcânico, turco, persa e indiano, por
meio de seus denominadores
comuns -kebab e iogurte. Seu
döner reaproximou inimigos
ao transformar o tradicional
sanduíche turco num wrap de
carneiro grelhado, salada e coalhada seca enrolados no lavosh,
pão-folha armênio. Para acompanhar, trouxe o ayran de hortelã, em que iogurte batido com
cinco folhinhas de hortelã e
uma pitada de sal é diluído na
água com gás.
Não demoraria para o Turquistão paulistano chegar à esfera do shopping center. O Kosebasi, rede mundial de restaurantes turcos, oferece como entrada o kösheganush -patê de
berinjela temperada com coalhada seca e tahini- e o cacik,
originalmente uma sopa gelada
de iogurte com óleo de oliva,
alho, pepino, dill, hortelã e vinagre, porém mais consistente
no Kosebasi, ao substituir o iogurte por coalhada seca.
Neste domingo, o chef indiano Dinesh Rajput reassume o
Govinda, primeira casa onde
trabalhara ao chegar em São
Paulo, em 2007. Da Caxemira,
o restaurante-bazar traz o
roghan gosht,
um curry de cordeiro que leva
iogurte no molho. Já no murgh
mumtaz do Delhi Palace, o iogurte é usado para marinar cubos de frango, depois levemente assados e cobertos com creme de leite e molho de tomate.
Coalho
"Uma coisa é iogurte, outra
coisa é coalhada", diz Beto
Isaac, dono do restaurante Arabesco, que, junto aos pratos sírio-libaneses mais populares,
serve o shih barak, massa assada com recheio de carne e mergulhada na coalhada fresca.
Segundo Walkiria Viotto, da
faculdade de engenharia de alimentos da Unicamp, a diferença são as bactérias utilizadas
para a fermentação, que, no caso do iogurte, produzem o acetaldeído, componente que define seu sabor.
"A coalhada é um dos mais
polivalentes elementos da culinária árabe", diz Isaac. "O árabe
começa a manhã com uma coalhada fresca. No almoço, come
a mijadra [arroz com lentilha]
com coalhada ou o homus e
quibe -com coalhada seca. No
lanche da tarde, toma coalhada
com alguma calda. À noite, pode achar o quibe cru indigesto.
Então, come mais coalhada."
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