São Paulo, sábado, 29 de junho de 2002

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LIVROS/LANÇAMENTOS

"A CABEÇA"

Sem lançar contos desde 1979, autor mineiro encerra lacuna com lançamento de volume na segunda, em SP

Luiz Vilela equilibra perverso e sarcástico

FRANCESCA ANGIOLILLO
DA REPORTAGEM LOCAL

Os conhecedores da obra de Luiz Vilela certamente sabem que o diálogo é uma marca constante da obra do escritor mineiro.
O que talvez não saibam é que o autor de "A Cabeça" -volume de contos que será lançado em São Paulo na próxima segunda- recebe "de nariz torcido" o que por vezes lhe é atribuído como elogio: a espontaneidade das falas.
"Espontâneo dá idéia de que eu simplesmente escuto e reproduzo aquilo", diz Vilela, 59. Comentando que essa é tarefa para gravador, Vilela grifa: muitas vezes, custa muito trabalho ao autor "parecer espontâneo".
Se o diálogo sempre esteve presente na obra de Vilela, centrada que ela é no registro do dia-a-dia, em "A Cabeça", pela primeira vez, ele é onipresente. Nenhum dos contos escapa à estrutura calcada na fala, e a chave da questão está no tema central de Vilela: o contato humano e seus confrontos.
O livro não é uma seleção; está nele a produção completa do autor no gênero, ao longo dos últimos anos. Alguns dos escritos figuraram antes em jornais e revistas; outros são inéditos.
Comum a eles é o fato de se equilibrarem sobre um fio entre o perverso e o sarcástico, para abordar o tema preferido de Luiz Vilela: o contato humano.
Mais do que o contato, trata-se aqui de confrontos do cotidiano, registrados em instantâneos: todos os contos são, também situações de um só fôlego, sem saltos no tempo, assinalando a tensão de momentos estanques.
Frequentemente, os personagens são só dois, travando embates de mesquinhezas. Porém, insiste o autor, a pequeneza é aparente: reside somente na superfície dessas situações.
"As pessoas tendem a ver muito o aspecto da realidade circundante, e isso é, naturalmente, um aspecto da minha obra. Mas é preciso ir mais fundo."
Vilela pertence ao rol de autores que crê que o extraordinário está no cotidiano -mas "o ouro", diz, citando o grego Heráclito, está nas profundezas; é preciso cavar para encontrá-lo".
"Se minha literatura tem algum ouro, também é preciso descer para entendê-la bem."
O tão falado tom do registro é que, na opinião do escritor, confunde o leitor. "O diálogo muitas vezes serve para esconder, e não para mostrar", indica.
O que esconde, então, a pré-adolescente febril de "Susy", caminhando entre a ingenuidade e a sedução do vizinho adulto? E o que revela a conversa inesperada das "Freiras em Férias"?
Ou o que supor a partir do nervosismo de um marido, diante da iminente visita de uma amiga da mulher, com suas "sete pragas" -crianças vindas de São Paulo para ver galinha ciscar no interior- em "Catástrofe"?
"Não sei. Essa é a resposta que não satisfaz ninguém, mas é isso aí. A pessoa tem de aprender a conviver com a ambiguidade, com a sombra", rebate Vilela. Por trás da simplicidade das superfícies, Vilela espera, se escondem enigmas renovados a cada leitura.


A CABEÇA - De: Luiz Vilela. Editora: Cosac & Naify (tel. 0/xx/11/3218-1444). 136 págs. R$ 18. Lançamento: segunda, dia 1º/7, às 20h. Onde: Bar Balcão (r. Dr. Melo Alves, 150; sp, tel. 0/ xx/ 11/3063-6091). Quanto: entrada franca.



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