São Paulo, sexta-feira, 29 de junho de 2007

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Cinema/estréias - Crítica/"Fora do Jogo"

Filme expõe repressão à mulher no Irã

Jafar Panahi usa a paixão pelo futebol para mostrar incômodos de uma sociedade que proíbe a presença feminina em estádios

SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA

As dificuldades impostas pela censura para "O Círculo" (2000) e "Ouro Carmim" (2003), que exploram aspectos incômodos da sociedade iraniana, não parecem ter intimidado o cineasta Jafar Panahi, vítima de restrições para sair do país.
"Fora do Jogo" (2006), seu quinto longa, volta a cutucar a onça governamental com vara curta, ainda que seu tema de fundo, a paixão pelo futebol, sugira algo menos politizado. O problema é que, no Irã, mulheres são proibidas de ir aos estádios. Até os anos 80, não podiam nem ver os jogos pela TV.
Estamos de volta, portanto, ao eixo de "O Círculo" - a opressão contra as mulheres, cidadãs de segunda categoria no Irã, encarada ao mesmo tempo como um problema de ordem religiosa e como prática de um Estado autoritário. Panahi faz algo mais efetivo que discursar contra isso: mantém o espectador o tempo todo ao lado das mulheres nos filmes.
Ao estabelecer ali o ponto de vista narrativo, ele reitera a idéia de mobilidade restrita vivida por elas e da paisagem masculina (confundida, muitas vezes, com paisagem policial) como algo amedrontador, ao menos para quem não se contenta com a definição de papéis atribuída aos gêneros em uma república islâmica tutelada por um "conselho de guardiães".
Aqui, a jornada começa, em registro semidocumental, num ônibus que leva torcedores para a partida decisiva na campanha da seleção iraniana durante as eliminatórias asiáticas para a Copa do Mundo de 2006, contra Bahrein, no estádio Azadi, em Teerã, com capacidade para mais de 100 mil pessoas (ou, no caso, 100 mil homens).
Um pai, sabendo que a filha adolescente tentará ir ao jogo, a procura desesperadamente. Naquele ambiente típico de qualquer país onde o futebol seja popular, revela-se um rosto feminino disfarçado. Mal disfarçado, diga-se: como os périplos dessa e de outras torcedoras vão demonstrar, sua presença nos estádios é conhecida (os cambistas, por exemplo, as exploram com preços superiores aos praticados com homens), mas ainda cerceada.
O título internacional, "Offside" (impedimento ou fora de jogo), se refere a uma situação, na partida, de ataque irregular.
No gramado do Azadi, enquanto as moças tentam chegar à arquibancada, um impedimento ameaça interferir no placar. E, como um jogador que o árbitro considere impedido, elas são pegas em flagrante onde, pelas regras, não poderiam estar.
A repressão não se iguala à de "O Círculo": é um tanto esculhambada (coisa do futebol?) e também atinge homens. Econômico nas elipses de tempo, o filme tem a duração de uma partida, o que reforça a sensação de frustração dos excluídos, mas talvez desperte em alguns o desejo de ver um compacto só com os melhores momentos.


FORA DO JOGO
Produção:
Irã, 2006
Direção: Jafar Panahi
Com: Sima Mobaraki-Sahi, Ayda Sadeqi e Mahnaz Zabihi
Quando: a partir de hoje no Cine Bombril e na Reserva Cultural
Avaliação: regular


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