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Sunset Zingg vivia na direção certa
MATINAS SUZUKI JR.
ESPECIAL PARA A FOLHA
David Drew Zingg foi um homem extraordinário. Basta lembrar alguns fatos (muitos de comprovação incerta, o que aumenta
o interesse) da sua vida para comprovar essa afirmação.
Ele foi um dos mais jovens e talentosos editores da revista
"Look" e foi assessor de imprensa
do mais intelectual dos candidatos à presidência dos EUA do pós-guerra, Adlai Stevenson. Ele teria
sido piloto na Segunda Guerra,
namorado da mulher que se tornaria Mrs. Chaplin, teria trabalhado em plantações de bananas na
República Dominicana e teria sido amigo de Jack Kennedy. Ele fez
ótimos retratos de gente como
Barbra Streisand, Giacometti,
Joan Miró, Marcel Duchamp, Lawrence Durrell, Duke Ellington e
Helena Rubinstein.
Ele foi decisivo na mudança da
fotografia nas revistas e na publicidade brasileiras nos anos 60.
Ajudou a criar, na imprensa local,
os conceitos de "ensaio fotográfico", cujo momento culminante
foi a revista "Realidade", e de
"portrait". Com o seu olhar estrangeiro, revelou a alma brasileira nos rostos dos principais cantores e compositores da MPB. Fez
as fotos dos primeiros discos de
Chico, Caetano e Gil, a de Leila Diniz grávida e nua, a da turma do
cinema novo em volta de uma
mesa de bar, fotografou Brasília
em construção, foi para o sertão,
para a Amazônia, para o Sul. Por
causa das fotos do pôr-do-sol no
Rio, ficou conhecido como Sunset
Zingg.
Ele ajudou a levar a bossa nova
para os EUA, colaborou com alguns filmes brasileiros, participou
do "Pasquim" e emprestou charme americano ao estilo de vida
chamado de "Ipanemia". Mudando-se do Rio para São Paulo, foi
participar de uma banda de música totalmente iconoclasta chamada Joelho de Porco e ser repórter
fotográfico do jornal "Notícias
Populares". Durante um período
dos 80, ele realizava encontros semanais com os fotógrafos da Folha. O objetivo era melhorar a
qualidade da fotografia no jornal,
mas ele conseguia mais do que isso: transformava a vida daqueles
jovens profissionais.
Quando uma operação para retirar um tumor do pescoço o impediu de continuar fotografando
profissionalmente, ele passou a
escrever colunas na Folha e revelou-se um notável escritor, com
uma veia irônica muito difícil de
encontrar nos textos em português dos nossos jornais (ele escrevia em inglês e era traduzido fielmente por Clara Allain). Com
mais de 70 anos, foi um dos primeiros homens de imprensa a
perceber a importância da Internet, à qual se dedicou desde o seu
início no Brasil. Era do conselho
editorial da revista "MacMania" e
colunista de Internet do iG.
Durante todo esse tempo, ele foi
dando também pequenas lições
em notas de rodapé. Como um típico homem educado em "midtown" (área de Nova York que
concentrava os teatros, os bares e
as sedes das revistas e dos jornais
da sua época), ele ajudou a implantar no Brasil o gosto pelo estilo de roupas das lojas Brooks Brothers, das calças cáquis e das camisas de algodão com botões no
colarinho, mas não teve o mesmo
sucesso por aqui com os chapéus,
uma de suas marcas, e a gravata-borboleta.
Também ajudou a difundir por
aqui o gosto pelo perfeito dry
martini e pelos cantores de cabarés como Bobby Short, seu amigo
pessoal. Ele também era conhecido pelos hambúrgueres que fazia
e pelo humor. Zingg divulgou entre os brasileiros alguns dos nomes mais importantes do jornalismo americano, como Murray
Kempton e E. B. White.
Ele abandonou a mulher e três
filhos em Nova York quando veio
para o Brasil nos anos 60. Para esse episódio nunca houve uma explicação e ele nunca explicou-o
para os amigos. Não deixa de ser
um toque coerente com toda a sua
vida de "maverick", de boi que
não consegue andar junto com a
boiada, que ele, apesar das dificuldades financeiras, tenha permanecido íntegro na conduta ética e
moral e totalmente desorganizado com o seu rico acervo de fotos.
Sobre ele pode-se dizer o que E.
B. White disse no obituário de seu
editor, Harold Ross, o dono da
"The New Yorker": "Alguns homens têm algo que é tão bom ou
melhor do que ter conhecimento;
eles têm um tipo de impulso natural para a direção certa".
Matinas Suzuki Jr. é jornalista e diretor
do iG
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