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POPLOAD
iPod, logo existo
LÚCIO RIBEIRO
COLUNISTA DA FOLHA
Dia destes um leitor escreveu
perguntando por que se falava tanto em iPod nesta coluna e
nunca em outro tocador de MP3.
Lembro que, em viagem, respondi rapidamente que a constante citação ao iPod, o aparelho
da Apple, não é pela marca em si,
mas sim por causa da história.
História mesmo. Foi inevitável
não lembrar do leitor quando, perambulando por Roma, vi um número razoável de pessoas com o
moderno fone à mostra indo visitar o Coliseu, do 80. Do ano 80, veja bem, não dos "anos 80".
Enquanto gente com a "little
white box" pendurada entrava e
saia do Pantheon romano, na Inglaterra era visto nas livrarias o livro "iPod, Therefore I Am", de
Dylan Jones, que traz no título
uma corruptela do "Penso, logo
existo", frase do filósofo francês
René Descartes. Não deixa de ser
cartesiano dizer que a jukebox
mudou o planeta e revolucionou
o modo de escutarmos a música
hoje.
A capa de "iPod, Therefore I
Am" é uma foto que busca inspiração nas famosas propagandas
da Apple e na famosíssima escultura "O Pensador", de Rodin: vê-se a silhueta escura de um sujeito
sentado, em posição de... pensador, e fones brancos saindo da
orelha.
Pelo o que eu li, Dylan Jones
conta a história do aparelhinho
branco "mágico", eleva o designer
inglês Jonathan Ive, da Apple, à
categoria de deus ("Armani da
Apple", "Beckham do design") e
mistura suas memórias pessoais e
uma visão divertida da "nova era
da apreciação musical".
Jones chega a sugerir uma comunhão entre sua existência e um
iPod. Ele era um cara que cresceu
ouvindo punk, curtia Nirvana e
Sinatra, hoje adora hip-hop. E no
livro fez uma lista das 175 melhores músicas dos Beatles e os cem
melhores discos de jazz de todos
os tempos. Tudo isso, que faz parte de sua memória, cabe na memória de um iPod.
O pop e o terror
Em 2001, na semana dos eventos terroristas que abalaram os
EUA e representaram o fim do
mundo como o conhecíamos,
uma dupla eletrônica era a aposta
da famosa maratona de shows do
CMJ Music Marathon e ia fazer
recomendadíssimo show no dia 8
de setembro. Seu nome: I Am the
World Trade Center.
Agora em 2005, de novo o pop
roça os acontecimentos macabros, desta vez na Inglaterra. Três
dias antes do pânico nas ruas de
Londres, foi entregue às lojas o
CD de estréia do simpaticíssimo e
festejado Hard-Fi, grupo britânico que fez a música mais alto astral do verão inglês, a deliciosa
"Hard to Beat".
O disco do Hard-Fi é batizado
de "Stars of CCTV". CCTV é o sistema de câmeras espalhadas por
toda Londres. No ano passado,
elas ajudaram a resolver o assassinato de uma moça ao reconstituir
todo o dia da garota: pegando
ônibus para trabalhar, andando
na rua, pegando ônibus para voltar para casa...
Uma das intenções do Hard-Fi
com a história da CCTV era mostrar o quanto as bandas novas
-que demoram para chegar à
MTV- viram estrelas das câmeras e da vigilância londrina por tocarem sem aviso no metrô, nas
portas dos pubs.
Acontece que nunca se falou
tanto nas câmeras da CCTV. Só
que não pela música. Não pelo
Hard-Fi. As verdadeiras "estrelas
da CCTV", hoje, são os terroristas
que explodiram Londres em julho
e que as tais câmeras conseguiram mostrar a cara.
@ - lucio@uol.com.br
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