São Paulo, sábado, 29 de agosto de 2009

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ANÁLISE

Condenação do site Mininova é ineficaz

MARCELO TRÄSEL
ESPECIAL PARA A FOLHA

Na última semana, um tribunal sueco ordenou ao serviço de compartilhamento de arquivos Mininova o bloqueio de todas as trocas envolvendo músicas, filmes, livros e jogos eletrônicos protegidos por direitos autorais, sob pena de pagamento de multa de 5 milhões de euros.
É o segundo revés sofrido pela comunidade mundial de compartilhadores de arquivos no semestre, pois em abril os administradores do Pirate Bay foram condenados a pagar cerca de US$ 3,5 milhões em multas e a cumprir um ano de prisão. Embora os réus tenham decidido apelar, dois meses depois acabaram vendendo o serviço à empresa Global Gaming Factory, que promete usar a infraestrutura para distribuir arquivos legalmente.
À primeira vista, a indústria de entretenimento parece estar atingindo o objetivo de impedir a distribuição ilegal de conteúdo na internet.
Não custa lembrar, porém, o caso do Napster, o primeiro serviço de compartilhamento de arquivos a se popularizar.
Criado pelo americano Shawn Fanning em 1999, o Napster foi condenado por facilitar a infração de direitos autorais em ações movidas por gravadoras, pela banda Metallica e pelo rapper Dr. Dre. Incapaz de pagar uma multa de US$ 26 milhões, a empresa faliu em 2001.
Os usuários, por sua vez, migraram para outros serviços criados a partir do mesmo conceito, como Audiogalaxy e iMesh. Os herdeiros do Napster tiveram o mesmo destino do patriarca e uma nova geração de serviços veio suprir a ausência dos condenados. André Pase, professor da PUC-RS, costuma apresentar a seguinte metáfora aos alunos: tentar conter o compartilhamento -legal ou ilegal- de informações e documentos na rede mundial de computadores por meios jurídicos é como tentar evitar o vazamento em uma represa enfiando o dedo indicador no buraco. Outros logo surgem e a represa se rompe.
O motivo é simples: os responsáveis pelas trocas ilegais de arquivos não são o Pirate Bay ou o Mininova. Estes serviços apenas gerenciam o tráfego de documentos que seus usuários decidem compartilhar. A indústria do entretenimento, portanto, não está lutando contra empresas que se aproveitam das possibilidades oferecidas pela internet para "roubar" conteúdo protegido, mas contra toda uma cultura de compartilhamento de músicas, filmes, jogos etc., decantada ao longo dos primeiros 15 anos de popularização da rede.
De fato, pelas leis atuais, trocar arquivos sem a devida autorização é crime. As leis de proteção autoral são um privilégio, criado pelo Estado para garantir o desenvolvimento e distribuição de bens culturais na sociedade industrial. Hoje, porém, a distribuição de conhecimento e obras de arte não depende mais de complexos processos administrativos e econômicos. Na era da informação, artistas e intelectuais têm acesso direto à audiência. O compartilhamento de arquivos via redes de computadores é uma adaptação do público a esse novo contexto. Resta aos legisladores seguirem os cidadãos.


MARCELO TRÄSEL é jornalista e professor de comunicação digital na Faculdade de Comunicação Social da PUC-RS


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