|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ANÁLISE
Condenação do site Mininova é ineficaz
MARCELO TRÄSEL
ESPECIAL PARA A FOLHA
Na última semana, um tribunal sueco ordenou ao serviço de
compartilhamento de arquivos
Mininova o bloqueio de todas
as trocas envolvendo músicas,
filmes, livros e jogos eletrônicos protegidos por direitos autorais, sob pena de pagamento
de multa de 5 milhões de euros.
É o segundo revés sofrido pela comunidade mundial de
compartilhadores de arquivos
no semestre, pois em abril os
administradores do Pirate Bay
foram condenados a pagar cerca de US$ 3,5 milhões em multas e a cumprir um ano de prisão. Embora os réus tenham
decidido apelar, dois meses depois acabaram vendendo o serviço à empresa Global Gaming
Factory, que promete usar a infraestrutura para distribuir arquivos legalmente.
À primeira vista, a indústria
de entretenimento parece estar atingindo o objetivo de impedir a distribuição ilegal de
conteúdo na internet.
Não custa lembrar, porém, o
caso do Napster, o primeiro
serviço de compartilhamento
de arquivos a se popularizar.
Criado pelo americano Shawn
Fanning em 1999, o Napster foi
condenado por facilitar a infração de direitos autorais em
ações movidas por gravadoras,
pela banda Metallica e pelo
rapper Dr. Dre. Incapaz de pagar uma multa de US$ 26 milhões, a empresa faliu em 2001.
Os usuários, por sua vez, migraram para outros serviços
criados a partir do mesmo conceito, como Audiogalaxy e
iMesh. Os herdeiros do Napster
tiveram o mesmo destino do
patriarca e uma nova geração
de serviços veio suprir a ausência dos condenados. André Pase, professor da PUC-RS, costuma apresentar a seguinte metáfora aos alunos: tentar conter o
compartilhamento -legal ou
ilegal- de informações e documentos na rede mundial de
computadores por meios jurídicos é como tentar evitar o vazamento em uma represa enfiando o dedo indicador no buraco. Outros logo surgem e a represa se rompe.
O motivo é simples: os responsáveis pelas trocas ilegais
de arquivos não são o Pirate
Bay ou o Mininova. Estes serviços apenas gerenciam o tráfego
de documentos que seus usuários decidem compartilhar. A
indústria do entretenimento,
portanto, não está lutando contra empresas que se aproveitam das possibilidades oferecidas pela internet para "roubar"
conteúdo protegido, mas contra toda uma cultura de compartilhamento de músicas, filmes, jogos etc., decantada ao
longo dos primeiros 15 anos de
popularização da rede.
De fato, pelas leis atuais, trocar arquivos sem a devida autorização é crime. As leis de proteção autoral são um privilégio,
criado pelo Estado para garantir o desenvolvimento e distribuição de bens culturais na sociedade industrial. Hoje, porém, a distribuição de conhecimento e obras de arte não depende mais de complexos processos administrativos e econômicos. Na era da informação,
artistas e intelectuais têm acesso direto à audiência. O compartilhamento de arquivos via
redes de computadores é uma
adaptação do público a esse novo contexto. Resta aos legisladores seguirem os cidadãos.
MARCELO TRÄSEL é jornalista e professor de
comunicação digital na Faculdade de Comunicação Social da PUC-RS
Texto Anterior: "Parece um ser humano", diz Federico Próximo Texto: Livro traz textos de ombudsman da "FT" Índice
|