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ARTES VISUAIS
Centro de Arte Contemporânea de Inhotim, em Brumadinho, é inaugurado com recepção de 700 convidados
Com exotismo e críticas, Caci abre as portas em MG
FABIO CYPRIANO
ENVIADO ESPECIAL A BRUMADINHO
Choque e deslumbramento.
Após viajar 60 km de Belo Horizonte, passa-se por Brumadinho.
Chega-se, então, a Inhotim, bairro ainda mais popular, com barracos numa situação quase favela.
É quando há um corte na paisagem; de repente, a mata fica organizada, palmeiras imperiais dão
ar majestático. É o Caci (Centro
de Arte Contemporânea de Inhotim), inaugurado anteontem pelo
colecionador Bernardo Paz.
Na recepção, os convidados,
mais de 700, galeristas, artistas,
colecionadores e curadores, a
maioria vinda de avião com passagens pagas pelo anfitrião, recebiam uma taça do espumante
Prosecco, um chapéu panamá e
claro, as boas-vindas de Paz.
Para visitar as sete galerias do
Caci, era preciso percorrer os 300
mil m2 de jardins, parte projetados por Burle Marx, sob o sol escaldante da última segunda, daí o
chapéu. "Estou fascinada, é incrível como os brasileiros têm o dom
de surpreender", comentava a colecionadora italiana Paola Golinelli, já com uma caipirinha em
mãos, após caminhar pelo espaço
e um pouco antes do almoço ser
servido, numa cenografia exótica,
com tantas flores em cada mesa
que os comensais não conseguiam ver quem estava sentado à
sua frente. "Estou procurando o
anão Tatoo, porque isso parece
mais a Ilha da Fantasia", era um
comentário entre os convidados.
Golinelli faz parte do grupo de
cerca de cem colecionadores e curadores estrangeiros que vieram
ao Brasil tendo a Bienal de São
Paulo como principal motivo. São
turistas da arte, todos amigos,
vestidos em Pucci e Prada.
Entretanto, a festa não agradou
a todos. Foi o caso do crítico mexicano Cuauhtemoc Medina, que
também é curador da Tate, de
Londres. "Não falo em nome da
Tate, mas me preocupa que está
sendo criado um circuito público
que cada vez mais se ajusta a um
circuito globalizado", disse.
O mexicano aponta ainda "uma
estrutura de distância e privilégio" como um dos problemas do
novo espaço de arte contemporânea: "Creio que o nascimento do
Caci faz parte do mesmo fenômeno da crise do Masp, isto é, a privatização do espaço público".
Mais cáusticos foram os comentários da curadora francesa Catherine David, responsável pela
Documenta de Kassel, na Alemanha, em 1997. "Vejo tudo aqui como uma fantasia perversa. Não
haveria problema se fosse apenas
a reunião de um acervo, mas há
uma pretensão social e cultural
por trás. A questão é que não se
está apontando para nada, não há
questionamento", disse David.
E a coleção, que inclui grandes
estrelas internacionais, como Janet Cardiff, Paul McCaarthy e
Olafur Eliasson? "A seleção dos
brasileiros não tem nada de novo,
é banal. Já o grupo de estrangeiros
é o que se vê por toda a parte, não
tem visão, não tem aposta", disse
David. A curadora apontou como
exceção os espaços dedicados a
Cildo Meireles e Tunga: "Ao menos, há trabalhos deles com sentido histórico".
No final do dia, o programa dividia as opiniões. Enquanto o curador brasileiro Ricardo Ribenboim elogiava "a generosidade de
Bernardo Paz", outro brasileiro,
Agnaldo Farias, dizia-se "triste ao
saber da situação de penúria do
Museu da Pampulha, em Belo
Horizonte, e da ostentação do Caci". Antes de sair, alguns visitantes jogavam o chapéu panamá no
lixo. Acabou o passeio. O público
mesmo só terá acesso ao Caci a
partir do próximo ano. Até lá, os
organizadores irão abrir o local
apenas para moradores da região.
O jornalista Fabio Cypriano e o fotógrafo Fernando Donasci viajaram a convite do Caci
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