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29ª BIENAL DE ARTES
Ataques reacendem debate na Bienal
Pichador de "liberte os urubu" diz que é "indiferente rabiscar obra" e que ética da rua não é a mesma do pavilhão
Artistas defendem ideia dos curadores de convidar pichadores para a exposição, mas repudiam os ataques
SILAS MARTÍ
DE SÃO PAULO
Na rua, uma regra não escrita entre pichadores é que
um não pode passar por cima
do trabalho do outro, "atropelar", no jargão do asfalto.
Mas o comportamento
mudou dentro do pavilhão
da Bienal, onde um dos integrantes do grupo Pixação SP,
que integra a mostra, pichou
no último sábado a instalação do artista Nuno Ramos.
"Todo "pixo" é feito de forma ilegal, todo mundo se arrisca e por isso tem respeito",
disse Djan Ivson, autor da
ação. "Mas a gente não tem
nada a ver com esses artistas,
não tem relevância nenhuma
o trabalho deles. Para nós, é
indiferente rabiscar a obra."
Desde a abertura da exposição, ataques às peças de
Ramos e da dupla Kboco e
Roberto Loeb têm reacendido o debate em torno da pichação, levantando dúvidas
sobre a tentativa de inclusão
do estilo pelos curadores dessa 29ª edição da mostra.
Depois dos ataques à Bienal há dois anos, que resultaram na prisão de Caroline Pivetta, os curadores Moacir
dos Anjos e Agnaldo Farias
decidiram fazer um convite a
representantes do gênero.
"São códigos diferentes,
na rua eles estão entre eles e
o respeito é mútuo ali", diz
Dos Anjos. "Mas é essa diferença de regras que a gente
está testando nessa Bienal, a
gente assume o conflito."
Loeb, que teve seu trabalho pichado, vê no episódio
um reflexo da desigualdade.
"Manifestações extremas
desse tipo carregam a cor social do que está ocorrendo, a
gente não está num país certinho", afirma. "Quem se alça a outros espaços é visto como um cara que diverge da
comunidade, que saiu da turma, é uma briga de classes."
Sua análise parece valer
tanto para pichadores quanto para seu parceiro na Bienal, o artista Kboco, que também começou na arte de rua.
"Não faço arte para ganhar
dinheiro", diz Kboco. "Já
comprei briga com a elite."
Num gesto comedido, Nuno Ramos decidiu não prestar queixas contra Ivson, reforçando o que chama de
"espaço para o diálogo" que
deveria ser a Bienal. Ele também discorda da visão de luta de classes e de fricção entre os códigos de conduta.
"Não é possível fazer uma
generalização, nem acho que
isso tem a ver com a origem
dele", afirma Ramos. "A classe alta também pode atacar."
Cildo Meireles, outro artista da Bienal, defendeu a atitude dos curadores, mas criticou os ataques. "Não compreenderam o espírito da coisa", diz o artista. "Isso é uma
raiva mal resolvida, um ato
de desespero que não podemos confundir com arte."
Há oito anos, uma obra de
Lenora de Barros no Maria
Antonia também foi pichada.
Autores da ação mostraram
até um projeto da intervenção à artista. Mas no caso da
Bienal, ela diz não ver "nenhuma intenção artística".
"Eles vivem da transgressão", diz. "Mas ao mesmo
tempo a situação acaba gerando figuras isoladas, que
não respondem pelo grupo."
"Não acho que foi vacilo a
Bienal ter chamado pichadores", opina a artista Adriana
Varejão. "Mas a Bienal está
virando uma plataforma de
heróis da pichação, algo
meio marqueiteiro. Estão
querendo virar celebridade."
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