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FERREIRA GULLAR
Hora de optar
O demagogo engana o eleitor para obter-lhe o voto, vence a eleição e fica de mãos atadas
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CERTAMENTE, NÃO estarei dizendo nada de novo ao observar que as campanhas eleitorais, por serem uma disputa, terminam por descolar-se da realidade do
país e tornar-se a simples busca, a
qualquer custo, do voto do eleitor.
E, dependendo do maior ou menor escrúpulo do candidato, essa
busca pode envolver acusações, calúnias e até falsos dossiês. Entra-se
francamente no terreno do vale-tudo que conduz a alianças espúrias,
promessas mentirosas e ao abandono de toda e qualquer ética.
Os que aderem a este ou àquele
candidato também se entregam ao
mesmo desvario, à mesma paixão, e
passam a tudo justificar, ainda que
com isso contrariem os valores que
sempre defenderam. Comportam-se como torcedores fanáticos durante uma partida de futebol, que tudo
admitem, desde que contribua para
a vitória de seu time. Claro que esse
não é o comportamento da maioria
do eleitoral, mas de uma pequena
parte dele, aquela que efetivamente
participa e se engaja na campanha
eleitoral. Não obstante, de uma maneira ou de outra, influi na decisão
dos eleitores e, conseqüentemente,
no resultado das urnas.
Para não ficarmos em generalidades, cito o exemplo do uso que Lula
fez da afirmação de Alckmin, de que,
para o país crescer, seria necessário
reduzir despesas. O presidente-candidato afirmou que a intenção do
seu adversário, ao afirmar isso, era
fazer demissões e cortar no vencimento dos funcionários públicos,
uma vez que, garantiu ele, "o país
pode crescer sem reduzir gastos".
Todo mundo sabe que isso não é
possível e que o objetivo de Lula foi
jogar o funcionalismo contra Alckmin. Os entendidos em economia
afirmam que o Estado brasileiro
gasta mal e que as despesas têm
crescido de ano para ano. Agora
mesmo, depois do novo aumento de
vencimentos com que o Judiciário
se presenteou, já se noticia que o
mesmo farão os senadores, o que resultará certamente em novos acréscimos salariais para deputados e
funcionários do Legislativo. Por
efeito dominó, esses aumentos terão reflexo sobre os vencimentos do
funcionalismo, dos deputados estaduais e vereadores do país inteiro.
A máquina pública brasileira já é
das mais caras do mundo. Nada mais
sensato e verdadeiro, portanto, do
que afirmar que se deve deter essa
sangria de recursos que, somada a
tantos desperdícios, inviabiliza o
crescimento do país e agrava crises,
como a da saúde pública, enquanto,
ao mesmo tempo, anula a ação governamental diante dos demais problemas sociais.
Lula sabe disso e, se afirma o contrário, é por oportunismo eleitoral,
como aliás afirma qualquer coisa
desde que lhe pareça conveniente.
Haverá quem diga que "eleição é assim mesmo", mas isso não impedirá
que, depois, à frente do governo, o
presidente eleito tenha dificuldades
de tomar as medidas necessárias ao
equilíbrio das despesas públicas e ao
crescimento econômico do país.
Noutras palavras, o demagogo engana o eleitor para obter-lhe o voto,
vence a eleição e, depois, fica de
mãos atadas, sem saber o que fazer
diante dos problemas efetivos, que
exigem solução. A saída que encontra é aumentar os impostos. Trata-se, portanto, de um exercício de burla e insensatez, que usa abusivamente do nome de democracia.
O atual governo Lula é um bom
exemplo desse tipo de contradição.
Se é verdade que, para vencer as eleições de 2002, teve que renegar suas
bandeiras consagradas e adotar a
política econômica que havia condenado como neoliberal, ao chegar ao
poder, investiu pesadamente nos
programas sociais, visando assegurar-se um segundo mandato.
Para compensar esse aumento excessivo de gastos, que contraria a política de superávit primário, não hesitou em descapitalizar o Banco do
Brasil e a Caixa Econômica Federal.
Dentro desse mesmo círculo de contradições, um mês após ordenar um
corte no orçamento da União deste
ano, autorizou, descaradamente,
durante o primeiro turno, despesas
novas em igual valor para conquistar votos. Isso sem falar numa série
de benesses dadas ao eleitor, com o
mesmo fim, e que pesarão sobre a
economia do país nos anos subseqüentes. Qualquer dos candidatos
que vença o pleito terá que optar entre a demagogia irresponsável e o
risco da impopularidade.
Mas não resta dúvida de que chegou o momento em que esse impasse terá que ser assumido por todos e
particularmente pelos governantes.
Hoje, eleitor, quando você escolhe
quem governará o país, deve escolher também se prefere a verdade ou
a mentira, essa mentira que nos tem
custado caro e mais caro custará
quanto mais tempo se perca.
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