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MODA
Gisele é modelo de estilo de vida
ERIKA PALOMINO
COLUNISTA DA FOLHA
Dois acontecimentos recentes trouxeram ao noticiário global questões relacionadas à
beleza e ao universo feminino. De
um lado, o babado das peles, protagonizado pela übermodel brasileira Gisele Bündchen em Nova
York, durante um desfile interno
da marca de lingeries Victoria's
Secret, e os assassinatos e o transtorno detonados na Nigéria pelo
concurso de Miss Mundo.
Gisele esteve no epicentro das
manifestações da importante associação ecológica Peta (People
for the Ethic Treatment for Animals), numa movimentação que
ainda não terminou. Como sabe
qualquer pessoa que tenha visto
TV, jornais e revistas na Terra, ela
sofreu um ataque dos ativistas durante o trabalho por ser a nova
modelo da marca de peles Blackglama. Ela não é a primeira a modelar para uma grife do gênero,
mas, por sua visibilidade, causou
desconforto no meio da moda por
descompromissadamente pular
toda a questão politicamente correta que vem envolvendo esse
mercado desde os anos 90.
Antecessoras de Gisele, top models como Linda, Christy, Stephanie protagonizaram uma campanha que celebrava: "Prefiro andar
nua do que vestir pele". Como as
modelos efetivamente estavam
nuas na propaganda, todo mundo viu e a luta (da própria Peta)
decolou e ganhou quórum.
Estilistas e grifes baniram as peles de seus desfiles. E quem usava
as peles animais verdadeiras ganhava muxoxos. Aos poucos, entretanto, focos de resistência foram pipocando aqui e ali, com o
aval da poderosa editora Anna
Wintour, da "Vogue America",
ela mesma uma fã de peles. Wintour usa peles animais há tempos,
já foi alvo de manifestações e segue seu caminho. Os tempos mudaram. O que antes era chocante
agora é aceitável. A ira foi-se diluindo, e a campanha esmaecendo. Uma das modelos daquele famoso anúncio das top models,
Naomi Campbell, chegou a desfilar usando peles, ganhando um
pito da mídia. Mas foi só.
Os ativistas costumam entrar
clandestinamente nos desfiles e,
num momento de distração dos
seguranças, invadem a passarela,
gritando e muitas vezes manchando as roupas. Nunca um ataque foi feito diretamente contra
uma pessoa. No caso, Gisele. Ainda mais num desfile de lingeries
-e não de peles.
A brasileira responde com a
afirmação que ama bichos, que
cria cachorros e cavalos, que nem
usa peles. Que estava só fazendo
seu trabalho. A questão é: hoje em
dia, em plena era das celebridades, uma pessoa como Gisele é de
fato uma modelo -de comportamento, modo de vida, beleza. E
não só das roupas que veste. Caso
contrário, seriam então as modelos meros cabides? Nesse sentido,
talvez sua agência internacional
não tenha sido capaz de prever o
tamanho do estrago e do aborrecimento para a modelo -que só
estava, realmente, fazendo seu
trabalho, e que fora das passarelas
não usa mesmo peles.
Mas é possível diferenciar, aos
olhos do mundo, a vida nas passarelas e fora delas, no momento em
que a mídia valoriza modelos
"reais", pinçadas entre personalidades, atrizes e gente de música
ou esporte? No universo sempre
irreal dos concursos de beleza, as
candidatas à Miss Mundo se vêem
agora obrigadas a lidar com questões como a morte de centenas de
pessoas, a ira dos extremistas islâmicos, depois que um jornal
mencionou que o profeta Muhammad poderia até se casar com
uma delas, de tão bonitas... Quem
é a mais bonita é agora assunto
que se tornou mais fútil do que
nunca, principalmente no país
em que mulheres são apedrejadas
até a morte. São as misses modelos de quê? Para que serve a beleza
aqui, afinal?
Gisele é a modelo mais visada
do mundo. Poderá agora ajudar
na campanha contra o uso das peles. As misses, essas desfilarão dia
7 em Londres.
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