São Paulo, domingo, 29 de novembro de 2009

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Mônica Bergamo

bergamo@folhasp.com.br

Aos 50 anos e com shows marcados em SP, Zeca Pagodinho diz que já criou filhos dele e dos outros e que chegou a sua hora de farrear

Marlene Bergamo/Folha Imagem
Pagodinho cata coquinhos para a mulher nos jardins do SBT

- Dá uma Coca-Cola Light pro neném!

 

O neném em questão é Zeca Pagodinho. E o pedido, vindo do dono do hino "Deixa a Vida Me Levar", soaria estranho se não fosse aquela uma segunda-feira. Zeca bebeu o fim de semana inteiro no Rio e, na segunda, já em São Paulo, no camarim do SBT, antes de gravar o programa de Hebe, quis refrigerante. Já o cigarro, não dispensou -ignorando a lei antifumo. Zeca, você fuma cigarro light? "Ele não fuma", respondem as assessoras em coro. "Qualquer merda que me derem eu fumo", contesta Zeca.

 

O cantor está em SP para divulgar o DVD "Uma Prova de Amor - Ao Vivo", que apresenta, nos dias 12 e 13, no Credicard Hall. Exibindo no peito um colar com búzios e a tatuagem dos santos Cosme e Damião, protetores das crianças, ele discute que camisa usar.

 

"Não vou botar a vermelha, que não sou Papai Noel. Já usei essa em show, em TV. Vão pensar que eu só tenho ela. O povo vai falar: "Coitado do Zeca"."

 

Já de camisa branca, ele caminha pelos corredores da emissora e é abordado por funcionários. "Até o segurança veio pedir pra tirar foto. Tem que botar segurança pra tomar conta dos seguranças."

 

"Paixãaaaaaaao!" É Hebe quem se aproxima. "Áaaagua?" Zeca explica que não costuma beber às segundas. Além da ressaca do fim de semana, "é dia de ficar em casa, acender minhas velas, fazer minhas preces".

 

Já no palco, Hebe convoca o convidado a beber duas vezes. A cena não foi ao ar.

 

Hospedado em um hotel em Alphaville, Zeca conta que gosta de São Paulo e dos paulistanos. Não guarda mágoa do episódio em que, há um ano, sócios do clube Paulistano, reduto de endinheirados dos Jardins, quiseram impedir um show seu. "Descobri que era só uma meia dúzia. Soube que era ano de eleição lá, e uma turma que não conseguiu me levar ficou com raiva", conta. "Tanto que eu fui no [restaurante] Figueira [Rubaiyat] e encontrei uma senhora muito chique lá que falou: "Olha, eu fui comprar ingresso e não consegui"."

 

Puxa a repórter pelo braço e leva até o restaurante. Pede medalhão com presunto parma e espaguete de beterraba com Catupiry. E um vinho. Mas Zeca gosta de vinho? Ele faz cara feia. Por que não pede cerveja? "Se eu beber cerveja, não como. Enche muito. E eu pedi almoço, amor. Boca que não leva beijo, cachaça nela."

 

Como não entende nada de vinho, pede conselho ao garçom, que sugere um chileno. "É garrafão ou garrafinha?", questiona o cantor. Quando o garrafão chega, o rapaz lhe oferece uma pequena dose para degustar a bebida. "Pode botá. Comigo não tem essas porras."

 

Durante a conversa, o telefone de Zeca não para. A mulher liga pra resolver problema no ar-condicionado. Ele chama a mãe pra saber se está tudo bem. Um amigo fala de Miami. Outro liga pra pedir ajuda.

 

Apesar da fama de cachaceiro, Zeca não bebe cachaça. E, a despeito da fama de farrista, aos 50 anos completados em fevereiro, acha que precisa se divertir mais. "Trabalhei pra "carilha". Criei meus filhos, filho dos outros, meus parentes, vizinhos, agora vou me criar", diz e deita a cabeça na mesa. "Queria me preocupar menos, voltar pra minha rua, perder um bocado de responsabilidade."

 

Além da responsabilidade com a mulher, Mônica, com quem é casado há 23 anos, e com os quatro filhos, Zeca ajuda parentes, vizinhos, amigos, o caseiro alcoólatra. Mora na Barra da Tijuca, bairro de classe alta, mas mantém um sítio em Xerém, distrito de Duque de Caxias, onde promove festas e distribui cestas básicas. Lá, também criou uma escola de música para crianças, que interrompeu seus trabalhos neste ano depois de uma parceria com a prefeitura local. "Já teve verba que foi parar na prefeitura e desapareceu. Quando eu cuidava com o meu dinheiro, quando me custava de 15 a 20 [mil reais] por mês, ia tudo muito bem. Quando começaram a ajudar, virou essa zona."

 

Zeca conta que não tem falado com o presidente Lula. "Ele foi a Xerém em época de eleição. Depois, não foi mais. Mas eu também não tenho nada o que falar com ele, ué. Tenho que falar com a minha mulher, com meu pai, minha mãe", desconversa. Em 2004, Zeca foi a Brasília assistir com Lula ao seu "Acústico MTV". À época, disse que não entrou em papo de política. "Bebemos cerveja e conversamos sobre samba e cachaça", afirmou. Hoje, não tem vontade de ver "Lula, o Filho do Brasil". "Não gosto de filme, não. Só vejo desenho animado."

 

Na polêmica em que Caetano Veloso chamou o presidente de "analfabeto", Zeca prefere passar pela tangente. "Eu não tenho tanta intimidade com o Lula pra saber do grau de inteligência dele", diz. "Eu tenho medo de gente muito inteligente, de ele usar a inteligência só pra ele." E, logo, desconversa. "Mas Caetano gosta de fazer isso [polêmica], né?"

 

Zeca, que acha que o país "tá crescendo que nem rabo-de-cavalo: pra baixo", também desconversa quando o tema são polêmicas em que se envolveu, como a guerra das cervejas Brahma, sua favorita, e Nova Schin para tê-lo como garoto-propaganda. "Tô fora disso. Eles resolveram entre eles."

 

No dia seguinte, de volta ao SBT, mais gente se amontoa em volta de Zeca para tirar foto, mas Pagodinho está mais preocupado em catar coquinho. "É baba-de-boi. Tem essa árvore lá em casa." Liga para a mulher. "Mônica, tô levando um saco de coquinho pra você."

 

É terça-feira e, na hora de gravar o programa de Eliana, a cerveja de Zeca já está a postos ao lado do microfone. Ele, que sofre de gastrite e foi internado nos últimos anos com pneumonia e hérnia de disco, diz que pode até controlar a comida, mas a bebida, não. "Como macarrão uma vez por semana, mas tomo o que me der vontade. Não controlo nada, que não posso ficar sem a minha Brahma, não. Eu passo mal."

 

"Tô com saudade da minha filha, da minha mulher", choraminga para a assessora de imprensa, Jane. "Hoje, vou chegar em casa e ver "Casseta & Planeta", tomando minha Brahma, de frente pro mar." De repente, se lembra da festa de aniversário de Alcione, que aconteceria naquela noite. "Mas não posso ficar mal porque amanhã tenho que encontrar o Lula." Na quarta, Zeca receberia das mãos do presidente a Ordem do Mérito Cultural. O cantor volta para o Rio, prometendo comprar ele mesmo uma camisa nova para usar na cerimônia.

Reportagem ADRIANA KÜCHLER


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