São Paulo, segunda-feira, 29 de novembro de 2010

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CRÍTICA JAZZ

Aos 80 anos, Ornette Coleman se mantém límpido e ligeiro

Sem sobressaltos, saxofonista americano, lenda do free jazz, subiu anteontem ao palco do Sesc Pinheiros

FABRICIO VIEIRA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O andar vagaroso até o centro do palco denota certa fragilidade física. Afinal, são 80 anos de idade e mais de cinco décadas assombrando o mundo do jazz.
Tanto os músicos quanto o público esperam respeitosamente que Ornette Coleman se acomode, pegue o sax e sinalize estar pronto para fazer um pouco mais de história.
Diferente dos ícones vivos do rock e do pop que têm visitado o país, o saxofonista não subiu ao palco do Sesc Pinheiros, na noite de sábado, com a obrigação de desfiar seus maiores hits.
O que se espera de uma figura como Coleman é que demonstre sua arte como improvisador, que surpreenda com o que pode fazer ali, ao vivo, e não remoendo canções antigas para satisfazer aos saudosistas.
É claro que houve espaço à revisitação de temas criados em diferentes períodos de sua carreira, como a funkeada "Theme from a Symphony" (de 1976), a vigorosa "Song X" (de 1985) e a bluesy "Turnaround", de safra mais recente.
Mas isso não centraliza as atenções e as expectativas: se ele tocasse apenas material nunca antes executado, a recepção entusiástica dos ouvintes provavelmente seria exatamente a mesma.

COMPORTADO
Como Coleman jamais foi um saxofonista vulcânico, no sentido que o são Pharoah Sanders e Peter Brötzmann, sua pegada não ficou nem um pouco comprometida com o avançar da idade.
O saxofonista segue o mesmo, com seu sopro límpido e ligeiro, movimentado por frases breves e melodias simples e circulares.
Todavia, para um show de free jazz, a apresentação de anteontem até que soou comportada e organizada demais. Faltou um pouco de sobressalto, do risco característico do gênero, de improvisações coletivas que arrastem os ouvintes a um campo desconhecido e assombroso. Mas tudo bem. O público pareceu não se incomodar.
Mais concentrado no sax alto, o músico praticamente deixou de lado seus outros instrumentos.
O trompete foi levado apenas ligeiramente aos lábios. O violino ganhou maior atenção somente quando Coleman decidiu acompanhar o baixista Tony Falanga em sua intrigante releitura do "Prelúdio da Suíte nº 1 para Violoncelo", de J. S. Bach.
Para o bis, foi reservada a delicada "Lonely Woman".
Com seu clima intimista, a canção escrita há cinco décadas espraiou um sabor de melancólica despedida, como se Coleman dissesse "obrigado, quem sabe nos vejamos de novo algum dia".

ORNETTE COLEMAN
AVALIAÇÃO bom


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