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CINEMA
Após exibir "2046" incompleto em Cannes, diretor estréia versão expandida
Wong põe fim à história de amor
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA
No Festival de Cannes, em maio
passado, um filme chinês conseguiu fazer os freqüentadores esperarem por "2046", de Wong
Kar-wai, com a mesma ansiedade
das fãs que esperavam Brad Pitt.
Tanto "frisson" tinha sua razão.
Wong havia causado impressão
em 97, com "Felizes Juntos" (melhor direção) e, em 2000, com
"Amor à Flor da Pele" (melhor
ator para Tony Leung). "2046" era
certo em Cannes 2003. Mas nada.
Em 2004, surgiu na lista da competição e foi imediatamente
apontado como um dos favoritos.
O "frisson" positivo começou a
azedar quando a organização do
evento anunciou que a cópia não
chegaria a tempo de sua primeira
projeção. Foi preciso mexer na
grade de horários. Houve muita
reclamação. Chegaram a espalhar
boatos de que tudo não passava
de golpe para chamar a atenção.
"2046", enfim, foi exibido no dia
seguinte diante de uma platéia gélida. Deixou a condição de favorito e passou à de grande decepção.
Na noite da premiação, a Palma
de Ouro foi para "Fahrenheit 11 de
Setembro", de Michael Moore.
Não sobrou prêmio para "2046",
que traz mais cinema em cada um
de seus fotogramas do que todos
os filmes de Moore juntos.
Mas havia, de fato, algo esquisito no filme. "Felizes Juntos" e
"Amor à Flor da Pele" haviam sido exibidos no mesmo festival
com alertas de que a mixagem
não estava pronta e a lista de créditos estava incompleta, mas faziam sentido. "2046", apesar das
imagens belíssimas, deixou a sensação de que não estava pronto.
Wong tem um processo de trabalho não convencional. Ele começa sem ter idéia de onde vai parar. A atriz Maggie Cheung abandonou as filmagens por não suportar o jeito do diretor.
"Amor à Flor da Pele", por sinal,
deveria ter sido "2046", mas no
meio do caminho tomou outro
rumo -como o cineasta explicou. Sabe-se também que os produtores inscrevem seus filmes nos
festivais como forma de pressioná-lo a acabar a montagem, que
costuma ser interminável.
Em outubro, a versão definitiva
de "2046" estreou em Paris, com
cinco minutos a mais do que a cópia exibida em Cannes. Cinco minutos que fazem toda a diferença.
As novas imagens foram acrescentadas no começo do filme, somadas a uma narração em "off"
do personagem principal, que
ajudam a iluminar a projeção.
"2046" insiste no tema do amor
frustrado ao narrar a história de
um escritor (de novo Leung, agora de bigode) que se recusa a viver
uma relação amorosa duradoura
por causa do fantasma de uma
mulher perfeita de um relacionamento passado. Tudo se mescla
numa palheta visual que mistura
o passado (anos 50) e o futuro
(2046, que é também um número
de quarto de hotel).
Se Wong se repete, ele se repete
como os grandes artistas que pintam sempre o mesmo quadro,
quase sempre se superando na
beleza. "2046" ainda não tem previsão de estréia no Brasil.
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