São Paulo, sexta-feira, 30 de janeiro de 2004

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Brasa adormecida

Eduardo Knapp/Folha Imagem
Os músicos Karl Hummel, Marcelo Nova e Gustavo Mullen, do Camisa de Vênus, que volta a fazer shows depois de sete anos


Cansada de confrontos, banda Camisa de Vênus, de Marcelo Nova, retorna à ativa após sete anos

SHIN OLIVA SUZUKI
DA REDAÇÃO

"É a revolução musical que está de volta a Salvador", diz o repórter de um diário baiano, relatando ao cantor do Camisa de Vênus, Marcelo Nova, o clima de expectativa quanto ao show de amanhã no Festival de Verão Salvador, o primeiro em sete anos do grupo. Nova, impassível, responde: "Meu querido, você vai dizer isso pra mim? Sou apenas um senhor, cuja ocupação fundamental hoje é assistir ao meu filho crescer".
O líder do grupo, que na década de 80 perturbou a censura federal da época -irritada pelo ataque verbal e, provavelmente, sonoro de faixas como "Beth Morreu" e "Silvia" no álbum "Viva" (1986)-, já não se encontra tão afeito à confrontação. "Eu já não tenho mais paciência para essa história de alguém sempre ter que sacar primeiro. Não tenho mais saco para ficar duelando", afirma Nova, 53, à Folha.
Não que o cantor se abstenha de opinar sobre o que não concorda. Mas agora, nas suas palavras, "é hora de os velhinhos farrearem". A frase é parte do espírito da reunião do Camisa de Vênus para a apresentação no evento baiano, que dará origem a um CD e DVD, ainda sem título nem data de lançamento confirmados.
A outra parte, segundo Marcelo Nova, "está ligada à celebração do fato de, mesmo estando em um país em que a arte em geral é tratada de uma forma tão rasa, sobrevivemos não só às intempéries da existência como também às próprias tempestades que nós mesmos fizemos desabar sobre nossas cabeças."
Tempestades que surgiram na forma de disputas com gravadoras -a Som Livre ordenou, em 1983, a mudança do nome Camisa de Vênus, mas a banda recusou a imposição e migrou para outra companhia- e de um certo antagonismo em relação aos colegas do rock Brasil 80. "É aquela velha frase de Groucho [Marx]: "Como é que vou aceitar ser sócio de um clube que me aceita?'", diz o vocalista da banda.
Mas é justamente o gosto pela incompatibilidade que parece ter sido o motor do grupo e que ainda guarda seus resquícios. Tanto que Marcelo Nova chega a apreciar a idéia de tocar no festival de Salvador na mesma noite de artistas como Harmonia do Samba, Cidade Negra, Margareth Menezes e Zeca Pagodinho.
"Sempre considerei interessante do ponto de vista artístico um certo antagonismo que é criado em relação às coisas. Não é gosto pela hostilidade, é gosto pelo atrito. O atrito pode gerar um fogo brando, pode gerar o fogo que aquece ou o que ilumina. Agora, a depender das circunstâncias, como foi em 1983, pode gerar um incêndio enorme na floresta." Brasa adormecida, mas que pode ter seu instante de reavivamento.


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